O polêmico presidente da Lusa esmurra a mesa virada da CBF e bem a seu estilo garante o clube na Copa Brasil
Por Nelson Urt
Os efeitos colaterais de singelas gotas de descongestionante pingadas nas narinas do jogador Carlos Alberto, do Sergipe, mudaram os destinos do futebol brasileiro. Carlos Alberto pode até ter respirado melhor com o remédio, mas deixou no maior sufoco o presidente da CBF, Otávio Pinto Guimarães. Afinal, quem cairia fora da Copa do Brasil: Vasco ou Joinville? “A Portuguesa”, bombardeou Otávio. Aí, a coisa entupiu de vez.
Puxar o tapete do time de Oswaldo Teixeira Duarte, o mais polêmico dirigente do futebol paulista, era encomendar confusão, muita confusão. Desde 1970, quando se elegeu pela primeira vez presidente da Portuguesa de Desportos, doutor Osvaldinho - como é tratado no Canindé - defende a honra rubro-verde como a própria vida e confere cada centavo da contabilidade do clube como se fosse 1 milhão. “Quando se trata de nossas finanças, sou um ditador”, reconhece. “Ninguém me passa a perna com facilidade”.
De fato, na quinta-feira da semana passada, dia 16, debruçado sobre um despacho da CBF - que atendia a uma determinação do Conselho Nacional de Desportos (CND) e reintegrava a Portuguesa à Copa Brasil -, Teixeira Duarte celebrava mais uma vitória em sua conturbada carreira. “Não fosse ele, seríamos faz tempo um clube pequeno”, acredita o pianista João Carlos Martins, um dos maiores intérpretes mundiais de Bach e fanático pelo futebol da Lusa.
Como Martins, outros torcedores da Portuguesa também crêem que a história do clube pode ser dividida entre antes e depois do doutor Oswaldinho. Quando assumiu a presidência, a Associação Portuguesa de Desportos contava com 3 000 sócios e um campo. Com uma vitoriosa “campanha dos tijolos”, ele ergueu o vistoso estádio para 35 000 pessoas e elevou para 100 000 o número de associados. Hoje, orgulha-se de nada dever a ninguém e ainda mantém uma conta na caderneta de poupança que ajuda a pagar as obras de um novo restaurante ao lado do estádio. “Aqui, tudo passa por minhas mãos e, se possível, economizo 1 000 cruzados por dia”, garante. “Comigo, o pagamento sai religiosamente em dia, ao contrário de muitos clubes que se dizem grandes por aí”, orgulha-se.
HOMEM LETRADO- No ano passado, rompeu com as televisões e os jogos da Portuguesa não puderam nem ser gravados, porque queriam pagar cota de clube pequeno. “Temos mais sócios que todos os grandes juntos”, dispara Teixeira Duarte. Na atual Copa Brasil, recorreu à Justiça Comum para questionar o recolhimento de 5% de renda líquida dos jogos para pagamento da arbitragem e, com o apoio do CND, ganhou a luta. “Quem se contenta com pouco, perde o direito de ter muito”, recita o cantor português Roberto Leal, outro admirador do presidente. “Como se diz na nossa terra, o doutor Oswaldo é um home letrado”, exulta Leal.
“Podem chamá-lo de tudo, menos de desonesto”, defende a filha Maria Cristina, jornalista e sua assessora na Portuguesa. “É um dirigente centralizador, conservador e que se perde por ser muito passional”, prefere Adílson Monteiro Alves, ex-presidente de futebol do Corinthians, e não se esquece de que Teixeira Duarte foi o maior contestador da democracia corintiana. Na imprensa, o presidente da Portuguesa também ganhou muitos inimigos. Seu nome é citado pelas iniciais OTD no Jornal da Tarde e bem isso é feito pelo O Estado de São Paulo, que o identifica em todos os textos apenas como “o presidente da Portuguesa”.
TRANSLADO DE CABRAL- Doutor Oswaldinho ou OTD, seja como for, segue em frente. Formado em Direito no tradicional Largo São Francisco, Teixeira Duarte sobressaiu também na política. Já foi subprefeito de Santo Amaro, elegeu-se vereador pela extinta Arena em 1972, perdeu a reeleição “por culpa da decadente legenda” e agora é candidato a deputado estadual pelo PDT. “A criança, o negro, a mulher e a ecologia são nossas metas”, discursa. Planeja ainda transladar os restos mortais de Pedro Álvares Cabral para o Brasil. “Em Portugal, o homem está enterrado em cova rasa”, lamenta. “Precisamos trazê-lo para o Monumento do Ipiranga”.
Ninguém pode prever se Cabral voltará à generosa terra onde, se plantando, tudo dá. Ou melhor, quase tudo: o doutor Oswaldinho, num contra-ataque, já conseguiu, um dia, esmurrar a mesa virada pela CBF.
Publicado originalmente na revista Placar, edição 857, em 2 de outubro de 1986. O diretor de redação da publicação era o grande Carlos Maranhão.
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