segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Gigantes do Jornalismo Esportivo: Fábio Sormani

A primeira vez escutei o nome de Fábio Rocco Sormani foi ouvindo a Rádio Bandeirantes. Ele era o segundo comentarista da emissora, sempre demonstrando um profundo conhecimento sobre futebol e outros esportes. Durante esse período, Sormani atuava muito ao lado do extrovertido e divertido locutor Dirceu Maravilha. Um dos maiores admiradores de Michael Jordan,  o comentarista é um dos brasileiros que mais conhecem os bastidores da NBA.

Sormani passou por importantes veículos de comunicação como Folha de São Paulo, Placar, SporTV e BandSports. Em 2008, estava na Rádio Record, comentando futebol nas transmissões e mesmo em programas populares. Muitos nomes sagrados se negam em trabalhar em veículos para o público mais humilde. Mas Sormani não teve qualquer constrangimento. O cara participava do programa do locutor João Ferreira e muita vezes falava sobre outros assuntos além de esportes. Muitas vezes dividiu os microfones com o fofoqueiro Leão Lobo. Santista fanático, Sormani atualmente faz o plantão esportivo na Rádio Jovem Pan AM. Nascido em 1957, o jornalista viveu grande parte de sua vida no interior de São Paulo principalmente em Araraquara, Lençóis Paulista e Bauru. Por isso, ele possui uma grande admiração e paixão pelo Esporte Clube Noroeste.

Segue abaixo uma ótima e rara matéria que este grande jornalista realizou para a revista Status na primeira metade dos anos 80. 




UM TIME DE U$ 42 MILHÕES

Está formada a Seleção mais cara do mundo: Shilton, Gentile, Stielike, Passarela e Júnior; Falcão, Maradona e Zico; Bruno Conti, Paolo Rossi e Rummenigge. Eles são, cada um na sua posição, os jogadores mais valorizados da atualidade. Reunidos aqui pela primeira vez, numa convocação de Status, eles valem, juntos, 42 milhões de dólares.

Por Fábio Rocco Somani

Se a Federação Italiana de Futebol, através de seu presidente Sederico Sordilo, estabeleceu que cada clube italiano não pode ter mais do que dois estrangeiros em suas equipes – como determina também a maioria das federações de cada país europeu -, Status nem tomou conhecimento dessa lei reacionária que priva os torcedores de verem em campo os maiores astros do futebol mundial, desrespeitando-a e contratou para seus leitores o time mais caro do mundo.

Respirem fundo, tomem fôlego e imagem essa constelação de estrelas vestindo a mesma camisa: Shilton, Gentile, Stielke, Passarela e Júnior; Falcão, Maradona e Zico; Bruno Conti, Paolo Rossi e Rummenigge. Que timaço! Certamente não haveria adversário que resistisse ao futebol milionário desses astros.

Entretanto, o leitor, que viver matutando fórmulas para combater a inflação que ameaça beirar os 160% até o final do ano e que, como um verdadeiro Pelé, vem tentando driblar as agruras das desintoxicações e expurgos, certamente há de perguntar: quanto não custaria essa máquina de jogar futebol?

Calculadora em punho, botões acionados, essa esquadra maravilhosa não sairia por menos de 42 milhões de dólares! Ou seja: com esse dinheiro, compra-se, atualmente mil carros Mercedes-Benz modelo 300 SEL 6.3 Sedan, o sonho de todo homem de bom gosto.

Mas quem são esses jogadores tão valiosos, verdadeiros malabarismos com a bola nos pés, artistas desse esporte criado pelos ingleses em 1863?

Peter Shilton, inglês, 34 anos: um goleiro de US$ 1,5 milhão.

O goleiro é um inglês de 1,92 m de altura e 88 kg que atende pelo nome de Peter Shilton. Aos 34 anos (18/9/1949) é o mais cobiçado da posição no futebol mundial. Joga no Manchester United há apenas três temporadas. Começou sua carreira no Nottingham Forest, onde conseguiu seus títulos como jogador: campeão inglês em 1976, bicampeão da Copa dos Campeões Europeus em 1979 e 80 e da Super Copa em 1979. Se algum clube do futebol mundial estiver interessado em seu passe, que não chegue com menos de 1,5 milhão de dólares porque o Manchester não venderá, principalmente depois de Shilton ter sido considerado um dos melhores goleiros da última Copa do Mundo.

A zaga, mescla o futebol força, vigoroso, com arte e beleza. Se não, como negar as primeiras qualidades a Gentile e Passarela e as duas outras virtudes a Stielike e Júnior?

Gentile, o lateral italiano que parou Zico, Maradona, etc...

O lateral-direito Gentile traz em sua bagagem muitos títulos: foi campeão italiano em seis ocasiões, ganhou uma vez a Copa da Itália e na temporada 1976/77 faturou a Copa da UEFA – todos os títulos jogando pela Juventus, de Turim. Mas o título mais importante que Cláudio Gentile, 29 anos (17/9/1953), italiano naturalizado, pois nasceu em Tripoli, na Líbia, traz consigo é o de ter sido campeão mundial pela Itália na Copa da Espanha, no ano passado. Foi com seu vigor físico (1,78 m de altura e 71 kg) que anulou nada menos que Maradona, Zico e Rummenigge nos jogos contra Argentina, Brasil e Alemanha e ajudou seu time a vencer essas partidas. Por dois milhões de dólares a Juventus negocia o seu passe.

Stielike, o líbero alemão, ganhando campeonatos na Espanha.

Ulrich Stielike era um meia-armador de origem quando jogava pelo Borusssia Möenchengladbach, na Alemanha Oriental. Mas como aconteceu com os uruguaios Dario Pereyra, que joga no São Paulo, e Daniel González, no Corinthians, Stielike, 28 anos (15/11/1954) só foi encontrar seu verdadeiro futebol quando passou a atuar como zagueiro, de líbero para ser mais exato. Ele começava a extrapolar as fronteiras alemãs quando o futebol espanhol, através do Real Madrid, foi buscá-lo em 1977. Um ano antes, conquistou o campeonato alemão pela primeira e única vez. Na temporada de 1974/75 ergueu a Taça da EUFA no alto de seu 1,77 m de altura e 74 kg. Já pelo Real Madrid, foi tricampeão espanhol em 1978, 79 e 80. Seu passe custou dois milhões de dólares e hoje o time madrilenho só se desfaz se seu futebol por 2,5 milhões de dólares.

Passarela, o grande capitão argentino: raçudo, valente, líder.

Daniel Alberto Passarela é daqueles zagueiros que todo time pretende ser campeão deseja - por isso não poderia faltar à nossa seleção. Raçudo, valente e, ás vezes, desleal, não gosta de perder jamais. Transmite esse sentimento ao resto da equipe que muitas vezes vence uma partida praticamente perdida. É o jogador de maior impulsão no mundo e, por isso, apesar de seu 1,78 m de altura e 74 kg, dificilmente perde uma disputa de bola pelo alto. Foi o capitão da Seleção da Argentina quando, em 1978 ela ganhou, em casa, a Copa do Mundo. Além desse cobiçado título, Passarela foi campeão nacional argentino em 1975, 79 e 81 e metropolitano nos anos de 1977, 79 e 80. Apesar de seus 30 anos (25/5/1953), mantém uma regularidade impressionante e, por isso, a Fiorentina, da Itália, que comprou seu passe ao River Plate no ano passado por 2,5 milhões de dólares, só o vende por esta mesma quantia.

Amado ou odiado, eis Júnior, um colecionador de títulos.

Para completar essa defesa forte na marcação, nada melhor que um lateral-esquerdo atrevido, criativo, ofensivo, um craque. E Júnior, lógico, tem todos esses atributos. Leovegildo Lins Gama Júnior começou nas escolinhas do Flamengo, onde joga até hoje. Aos 29 anos (19/07/1954) é praticamente um jogador realizado – apesar de não ter conquistado o mundial da Espanha com a Seleção brasileira. Mas até um título de campeão do mundo Júnior tem, pois em 1978 ganhou o mundial interclubes. Além desse, foi cinco vezes campeão carioca, tricampeão brasileiro e campeão da Taça Libertadores da América, também em 1981. Recentemente o Lazio, da Itália, tentou contratá-lo. Clube médio, porém, não teve os três milhões de dólares que o time da Gávea pediu pelo seu passe – e o que ele realmente vale.

Somado o preço de cada jogador, esta zaga extraordinária custa 11,5 milhões de dólares, onde cada jogador custa, em média, 2,3 milhões de dólares. Pouco, se comparada com o meio-de-campo, onde apenas três jogadores custam, juntos, 18,5 milhões de dólares – o que dá uma média de 6,1 milhões de dólares por jogador. E ninguém menos que Falcão, Maradona e Zico para custarem isso.

Falcão, o Rei de Roma, um gênio que vale no mínimo US$ 6,5 milhões

Paulo Roberto Falcão dispensa maiores apresentações. Depois de ter sido tricampeão brasileiro e sete vezes campeão gaúcho pelo Internacional, o Roma, que não ganhava uma campeonato italiano desde 1942, não mediu esforços e em 1980 levou esse catarinense de 29 anos (16/10/1953), 1,85 m de altura e 75 kg, por 2,2 milhões de dólares. E, hoje, o clube mais popular da Itália não o vende por menos de 6,5 milhões de dólares! E por que Falcão valorizou-se tanto assim? Simples: porque ele é um gênio; sem dúvida alguma, depois de Pelé, o maior jogador que o Brasil já fez – e já figura, tranqüilamente, na lista dos maiores jogadores do mundo, ao lado do próprio Pelé, Puskas, Di Stefano, Cruyff entre outros. Além disso, foi com Falcão, na temporada passada, que o Roma conseguiu o tão esperado título italiano. E foi com ele também que levantou duas Copas da Itália. Para se ter uma ideia do poderia futebolístico de Falcão, o Roma esteve perto de perdê-lo no começo desta temporada porque estava difícil a renovação de seu contrato e o técnico da equipe, o sueco Niels Liedholm, desesperado, entrou na sala do presidente do clube, Dino Viola, e avisou: “Sem Paulo Roberto não passamos de uma equipe igual às outras”. E o sueco estava com toda razão. Alertado, o presidente Viola renovou rapidamente o contrato de Falcão que passou a ser o jogador mais bem pago do futebol italiano.

Maradona, o outro gênio dessa Seleção: 1,69 m de altura, U$ 8 milhões

Certamente, Maradona figura entre os maiores jogadores que o mundo já criou. Menino prodígio, explodiu com apenas 18 anos e só não participou do Mundial da Argenina, na época, porque o então técnico da Seleção, César Menotti, ficou com receio de convocá-lo por achar que ele tinha pouca idade. Um ano depois, em 1979, ainda como júnior, ganhou o mundial da categoria, no Japão, vestindo a camisa azul e branca da Seleção Argentina. Começou sua carreira no Argentino Juniors, um clube modesto de Buenos Aires, e foi conquistar seu primeiro título como profissional em 1981, ano que se transferiu para o Boca Juniors. Um ano depois, o Barcelona da Espanha comprou seu passe por 8 milhões de dólares, na maior transação do futebol mundial de todos os tempos. Diego Armando Maradona chegou na terra de Picasso carregado em glórias, mas não conseguiu dar ao Barcelona o título espanhol desta temporada. Ganhou, sim, a Copa do Rei. Aos 22 anos (30/10/1960), e embora não tenha tido  uma atuação de destaque na Copa da Espanha no ano passado, o futebol de Maradona continua sendo maravilhoso nos seus 71 kg e 1,69 m de altura. E à medida que o tempo passa, ele aperfeiçoa seu poder de marcação – sua única falha – vai polindo sua capacidade para criar jogadas de gol como ninguém. O Barcelona não o vende por menos de 8 milhões de dólares.

Zico, mais de 600 gols, artilheiro no Brasil, artilheiro na Itália

E quem poderia estar ao lado de Maradona, tabelando, complentando as jogadas, fazendo gols e transmitindo experiência? Zico, claro. Um dos gênios que o futebol brasileiro já produziu. Já ultrapassou a barreira dos 600 gols e ser artilheiro é, talvez, sua maior qualidade. Em campeonatos cariocas, liderou seis dos onze que disputou. Nos brasileiros, em 1980 e 82, foi seu artilheiro. Títulos? Ganhou todos os que tinha direito, menos um: campeão do mundo pela Seleção Brasileira. Foi campeão carioca seis vezes, tricampeão brasileiro, campeão da Taça Libertadores da América e Mundial, pelo Flamengo, em 1981. Arthur Antunes Coimbra, o Zico, transferiu-se para a Itália na metade deste ano, quando mal tinha chegado aos 30 anos (3/3/1953). 1,7 m de altura e 69 kg, certamente, ele irá compensar os italianos da Udinese que pagaram 4 milhões de dólares ao Flamengo (o que ele ainda vale atualmente) para ter seu futebol cheio de gols, solidariedade e rapidez dentro de campo.

Na frente, esse trio de ouro conta com dois italianos e um alemão. Jogadores habilidosos, criativos, versáteis e os ideais para transformar em gols as jogadas que certamente esse meio-de-campo inigualável criaria. Juntos, valem 12 milhões de dólares, o que dá uma média de 4 milhões por cada um.

Bruno Conti, o ponta-direita baixinho: uma das estrelas do time do Roma

O ponta-direita é o italiano Bruno Conti, de 27 anos de idade (13/3/1955), um emérito driblador que executa suas qualidades tanto na direita quanto na esquerda. Começou sua carreira no Roma, em 1973, e em 75 estava no Gênova. No ano seguinte, voltou para o Roma e na temporada de 1978/79 estava novamente no Gênova. Quando o Roma resolveu montar um esquadrão, começou trazendo Bruno Conti de volta e vindo ao Brasil buscar Falcão. Conquistou, também, duas Copa Itália.

É o jogador mais baixo desta Seleção que Status contratou: 1,68 m de altura e pesa 65 quilos. Seu futebol custa 3 milhões de dólares.

Paolo Rossi, o pesadelo dos brasileiros, o melhor jogador da Copa 82

Eleito o melhor jogador da Copa da Espanha, Paolo Rossi foi também seu artilheiro com seis gols. Aterrorizou as defesas argentina, brasileira, polonesa e alemã e, assim, praticamente deu o título mundial à Itália. Envolvido no escândalo da Loteria Esportiva italiana, em 1981, Paolo Rossi (1,74 m de altura e 66 quilos) foi suspenso por um ano pelo rigoroso e incontestável Tribunal de Justiça Desportiva da Itália. Rossi jogava pelo pequeno Lanerossi de Vicenza e, ainda suspenso, a Juventus pagou 2,5 milhões de dólares pelo seu passe, impressionada que estava com seu poder de finalização – foi o artilheiro do campeonato italiano na temporada de 1977/78 mesmo jogando pelo Lanerossi. Na Juventus, foi campeão italiano na temporada passada. Aos 26 anos (23/9/1956), seus gols estão valendo hoje 5,5 milhões de dólares.

Rummennigge, o ponta-esquerda que chuta com a direita. E faz muitos gols
Ninguém melhor do que o alemão Karl-Heinz Rummenigge para fechar essa plêiade de futebolistas. 26 anos (25/9/1955), 1,82 m de altura e 74 quilos, Rummenigge é também um colecionador de títulos: ganhou o campeonato alemão quatro temporadas, foi campeão do mundo em 1974 e em três ocasiões vence a Copa dos Clubes Campeões Europeus – um dos títulos mais cobiçados na Europa. Sempre jogou no Bayern de Munique e apesar de ser ponta-esquerda é destro. Por isso, parte sempre em diagonal em direção ao gol inimigo ou desloca-se com freqüência para o lado direito de seu ataque. Na frente, é quase que perfeito, pois é também um homem de fazer muitos gols. Se algum clube quiser comprá-lo, que não chegue com menos do que 3,5 milhões de dólares que o negócio não sairá.

Depois de se deliciar com esta milionária seleção, o leitor, porém, percebeu que as grandes transações geralmente, são feitas pelo futebol italiano e espanhol. E como é que eles conseguem comprar esses jogadores que, à primeira vista, parecem inegociáveis? É que nesses países, os clubes funcionam como verdadeiras empresas e obtêm seus recursos através do dinheiro arrecadado com a Loteria Esportiva, nos patrocínios, nas camisas, excursionando e participando de torneios altamente rentáveis e, basicamente, nas arrecadações de seus jogos. Como lá existe um calendário bem organizado, eles vendem um pacote de ingressos que dá direito a assistir a todos os jogos do time. Essa medida tem sido tão eficaz que o Barcelona, que é tido como o clube mais rico do futebol mundial, lucrou mais de cinco milhões de dólares na temporada passada mesmo não tendo sido campeão. Na Itália, o Roma chegou aos quatro milhões e a Juventus passou dos cinco.

Mas como no Brasil o que impera é a desorganização, a única maneira de se ter esses craques jogando num Morumbi, Maracanã, Mineirão ou Beira-Rio é somente através de uma ficção. Como essa que acabamos de criar.
                                                                         
Publicado originalmente na revista Status 112, em novembro de 1983

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

O texto é ótimo,mas,tem sempre um ''mas'',eu não consigo entender como as pessoas gostam de futebol,principalmente os intelectuais.
Parece que no início do esporte-bretão só o povão gostava.