domingo, 5 de maio de 2013

“Montana era um dos maiores guerreiros da Boca do Lixo”

O inventor da moda country, mestre dos filmes sertanejos, Crocodilo Dundee da rua do Triunfo. São diversas as maneiras de definir um personagem controverso e único como o cineasta Rodrigo Montana (1940-2012). O roteirista Diógenes Gonçalves conheceu de perto o homem. Apesar de bem jovem, Dio fez o roteiro para Castelo de Amor, longa-metragem nunca concluído por Rodrigo. O roteirista ia diariamente ao escritório do realizador trabalhar no projeto. Diógenes relembrou alguns dos momentos de sua parceria com Montana ao VSP.



Violão, Sardinha e Pão- Como foi escrever o roteiro do longa-metragem Castelo de Amor? Quanto tempo você conviveu com o Montana?


Diógenes Gonçalves- Foi legal porque foi o primeiro longa-metragem que escrevi e tive a oportunidade de trabalhar com cinema, embora o filme não tenha sido rodado. Além de ser co-roteirista eu seria também seu assistente na direção do trabalho. Quanto á história não era bem o que eu mesmo faria, mas ali tive uma oportunidade de abrir outros caminhos e vi que poderia trabalhar escrevendo roteiros. Pra falar a verdade não me lembro de tempo...Foram meses mas nunca os contei.



VSP- Quais foram as maiores dificuldades em realizar este trabalho?


DG- As dificuldades foram a falta de grana e o gênio teimoso do Montana. Eu tinha que argumentar muito algumas coisas pra escrever no roteiro e ele muitas vezes queria que fosse exatamente do jeito dele. E a remuneração que não tive. Ele mau tinha dinheiro pra minha condução ou pra comer. Não recebi nada pelo roteiro.



VSP- O escritório do Rodrigo era parada obrigatória de muitos personagens inusitados. Quais deles você se lembra?


DG- Me recordo do Pio Zamuner, do Luiz Gonzaga dos Santos e pude conhecer o Fauzi Mansur também. Ás vezes quando ia lá no escritório eu encontrava o Pio e o Montana numa lanchonete de uma esquina próxima. Aí a gente ficava trocando ideia e bebendo umas cervejas. Era legal ouvir as estórias da época do Mazzaropi. O Luiz sempre ia por lá pra ver que o Montana estava planejando. E depois por indicação do Montana, o Fauzi entrou em contato comigo pra ver a possibilidade de fazer uma parceria também pra escrever roteiros.



VSP- Existe algum episódio que você vivenciou ao lado do Rodrigo e acha legal contar?


DG- Quem conhece o Montana sabe que ele tinha muitas estórias da vida dele e as contava numa velocidade muito lenta. Eram bem interessantes, mas da forma que ele contava dava até sono (risos). Contava da experiência espiritual que teve de quando entrou em coma após um derrame, das mancadas do Sady Baby e muitas outras.


VSP- Apesar de ser uma pessoa amável, Montana era um senhor de personalidade forte. Existiu algum momento em que ele foi desagradável com você?


DG- Em meio as dificuldades que eu disse antes, houve momentos em que ele ficava muito irritado por pouca coisa e em alguns deles tive vontade de deletar tudo que eu havia escrito e ir embora. Mas preferi segurar a onda da minha indignação e raiva e seguir em frente, pois eu não sabia quando iria ter uma outra oportunidade com cinema.



VSP- Você acompanhou de perto o esforço dele em tentar realizar Castelo de Amor. Qual era a importância desse filme para ele?


DG- Tanto ele como eu não víamos a hora de surgir os recursos pro filme. E ele nunca se deixava abalar e perdia as esperanças. Ele tinha certeza de que uma hora isso surgiria de alguma maneira, isso me dava ânimo também pois eu sabia que seria muito difícil. Ele era na minha opinião, um dos maiores guerreiros da velha escola da Boca do Lixo, passando muita dificuldade mas estava ali lutando querendo produzir filmes Mas infelizmente a hora dele chegou e esse sonho dele não se concretizou.


VSP- Na sua opinião, qual é o legado de Montana para o cinema brasileiro?


DG- Acho que muita gente do audiovisual (quem já trabalha ou estuda) se o conhecesse (mesmo não gostando do seu estilo, tipo e forma de trabalho), tomaria como exemplo a sua perseverança, não importando a idade ou condições favoráveis. Afinal acho que deixou muitos trabalhos com a marca e toque dele, infelizmente só não concluiu o Castelo de Amor.

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