quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Três anos de Zingu: histórias nunca reveladas


Me afastei da direção Zingu por motivos pessoais. Nesses três anos de colaboração, muita coisa aconteceu. Sempre me interessei pelas pessoas populares e principalmente pelos técnicos. Entrevistei muitos profissionais que moram na periferia de São Paulo e mesmo em lugares distantes. Sempre foi ótimo. Colecionei algumas histórias que torno públicas agora. São histórias verdadeiras que aconteceram comigo mas que sempre ficaram nos bastidores.


- Fui entrevistar um cara que foi dossiê numa cidade próxima a São Paulo. Sai cedo de casa e não tinha almoçado. Fiz a entrevista e estava esperando o ônibus pra voltar pra São Paulo. Mas não tinha lugar nenhum pra comer perto da rodoviária. Terminei almoçando salgadinho Torcida. E nem era o de pimenta que é ótimo. Outro detalhe da rodoviária: o banheiro era imundo.

- Esse negócio de dormir em ônibus é muito perigoso. Uma vez quase cheguei atrasado pra uma entrevista por conta disso. Agora, entrevistado chegar atrasado é normal. Mas entrevistador pega muito mal.

- Uma vez fui entrevistar um cara da Boca que morava numa rua chamada Roland Garros. Desci do ônibus e não achava a droga da rua. Perguntava em todo lugar, mas não achava. Em padaria, banca, ninguém identificava o lugar. Cheguei num posto e falei pro cara, e ele também não conhecia. Comecei a ficar desesperado. Mas o cara ficou desconfiado: conhecia um nome de rua parecido com aquele. Escrevi o nome num papel. Ele me falou: “Poxa moço, porque você não me falou antes que queria ir na Rolandegarros” (eu tinha soletrado o nome separado). O cara foi atencioso e eu encontrei a rua.

-Nunca acreditei nessas coisas de Eugênio Bucci que o jornalista não pode ter amizade ou proximidade com fonte. Eu já tomei cerveja com cineasta, já tomei cachaça. Já virei noite em bar. Também já paguei almoço e bebida várias vezes. Ajudei um inclusive a pagar a dentadura.

- Fui uma vez entrevistar um técnico muito importante da Boca no litoral de São Paulo. Sem conhecer a cidade bem, acabei indo andando da rodoviária até o prédio do cara. Cheguei suado. Quando o achei, falei: “Puxa senhor, é uma honra estar com você. Você trabalhou com fulano e ciclano”. Ele me respondeu: “Eu nunca fui porra nenhuma. Por favor, e deixe fulano e ciclano fora disso. Eles já morreram porra”.

- Creio que o técnico percebeu que eu não tinha almoçado. Ele também não. Ele me convidou para almoçarmos juntos. Fingi que não queria, mas foi muito legal. A esposa dele era muito simpática. Detalhe: ele só comia de colher (quem foi da Boca, sabe de quem eu estou falando). Depois, o cara continuou com dó de mim e me indicou o lugar onde eu podia pegar um ônibus até a rodoviária. Falou ainda: “Mas eu não dou nunca mais esse negócio de entrevista. A gente não ganha um puto com isso”.

- Outra vez fui entrevistar um técnico em Guarulhos. Foi um sábado de manhã (véspera de um Palmeiras e Internacional, que eu queria comprar o ingresso). Fui fazer a entrevista e o cara não tinha celular. E eu não conhecia o cara. Só tinha visto fotos antigas dele. Ele demorou uma hora e meia mais ou menos. Eu achei que ele não ia aparecer. Mas ele apareceu, deu mais de três horas de material. Figura maravilhosa. Eu queria ter comprado ingresso pro jogo no mesmo dia. Mas isso não aconteceu. Só consegui comprar de cambista no dia seguinte e gastei uma grana boa.

- Teve um entrevistado que se tornou dossiê que não apareceu no lugar combinado. Fiquei muito nervoso. Mas depois, marcamos outro dia e ele apareceu. É um cara legal.

- Fui entrevistar um técnico da Triunfo no Frans Café, na avenida Paulista. O técnico era uma pessoa bastante simples, tinha sido cobrador de ônibus antes de ingressar no cinema. Ele pediu um café. O café vinha com um chocolate. Ficamos conversando e o chocolate acabou derretendo. Depois, ele chamou a garçonete do café: “Moça, o meu chocolate gozou!”. Muito gente fina ele, um cara acima da média.

- Uma vez fui entrevistar um profissional da Boca num apartamento no centro de São Paulo. Sai tarde de casa e peguei um taxi. O taxista achou estranho o local escolhido. Expliquei pra ele que eu era jornalista e que ia entrevistar uma pessoa de idade que morava no local. O prédio em que o profissional mora é bem simples. Quando chegamos, ele me perguntou: “Senhor jornalista, isso aí não é um puteirinho?”.

O resto fica pras mesas de bar e pro meu livro de memórias. Feliz 2010 a todos.


3 comentários:

Sergio Andrade disse...

Ótimas histórias, meu amigo.

Feliz 2010 pra você e todos os seus!

Abração!

Alexandre Pereira disse...

Quando estiver para sair o livro não deixe de me avisar.

1 abraço.

Renata D'Elia disse...

Ronald Garros? Fica no Edu Chaves, aqui perto. O segredo é nunca pronunciar em francês (rolánd-garrô) e sempre em jaçanense: ROLANDGÁÁÁRROS!

bjs