Muda o tema, fica o
autor
O paraíso proibido, Brasil 1981; direção e roteiro de
Carlos Reichenbach; fotografia de Reichenbach; música de Osvaldinho, Tadeu,
Almir Sater, Papete e outros. Elenco: Jonas Bloch, Vanessa, Luiz Carlos Braga.
Por Bruno de André
No panorama
cinematográfico paulistano, o cineasta Carlos Reichenbach é um caso único de
conciliação do filme de autor com exigências dos produtores comerciais. Quando
diretor e roteirista – além de ser um fotógrafo muito requisitado -, Reichenbach
não abala ou transgride seu estilo ao realizar um filme que rapidamente poderia
receber a pecha de “pornochanchada”: antes de tudo, ele supera o modismo de
ingredientes fáceis ao adaptar o gênero à sua linguagem, e não vice-versa.
Exemplo dessa criação é Império do desejo,
de 1980, no qual o diretor desenvolve uma trama de corrosiva auto-ironia que se
projeta acima das cenas de sexo, fazendo destas o testemunho de um limite.
Ambiguidades-
Agora, enquanto aguarda uma decisão do Conselho Superior de Cinema sobre os
drásticos cortes exigidos pela Censura a seu filme Amor, palavra prostituta (um sombrio e vigoroso estudo inspirado
pela leitura de Soren Kierkegaards, o pai do existencialismo), Reichenbach
lança O paraíso proibido. Na
história, um radialista, Celso – que trocara o sucesso da grande cidade pelo
posto de locutor na pequena emissora de um balneário – recebe a visita de seu
“professor” de rádio. O velho amigo começa a enredá-lo num plano para a compra
da moderna emissora da cidade vizinha. Contrário a essa proposta, Celso passa a
envolver-se e indispor-se com seus amigos e colegas, temeroso de perder seu
paraíso individual.
O título do filme só
existe em função da personalidade do radialista Celso – muito bem interpretado
por Jonas Bloch. Para Celso, paraíso é onde ele possa exercer plenamente seu
egocentrismo, impulsivamente fazendo o que quiser para dominar tudo à sua
volta, sem precisar preocupar-se com a direção a que os fatos ou a vontade das
outras pessoas o pretendem levar.
O diretor Reichenbach,
porém, não construiu seu personagem sobre esse esquema maniqueísta e auto
explicativo: o radialista, como todos os heróis – se pode chamá-los assim –
criados pelo diretor, carrega em si uma tal carga de ambiguidade, uma
necessidade simultânea de fuga e decisão, ideais ora dilúveis, que mesma seu
objetivo de paraíso tem proibido como adjetivo inseparável. É ele próprio, em
última análise, quem provoca seus obstáculos: os outros personagens parecem ser
apenas emanações da busca de Celso pela satisfação da ambiguidade. Isso o
transforma em um personagem autodestrutivo, eternamente se debatendo sobre seu
desejado Paraíso proibido.
Publicado originalmente
na revista Visão, edição 39, em 28 de setembro de 1982
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