sábado, 27 de outubro de 2012

Imagem pessoal



Muda o tema, fica o autor

O paraíso proibido, Brasil 1981; direção e roteiro de Carlos Reichenbach; fotografia de Reichenbach; música de Osvaldinho, Tadeu, Almir Sater, Papete e outros. Elenco: Jonas Bloch, Vanessa, Luiz Carlos Braga.

Por Bruno de André



No panorama cinematográfico paulistano, o cineasta Carlos Reichenbach é um caso único de conciliação do filme de autor com exigências dos produtores comerciais. Quando diretor e roteirista – além de ser um fotógrafo muito requisitado -, Reichenbach não abala ou transgride seu estilo ao realizar um filme que rapidamente poderia receber a pecha de “pornochanchada”: antes de tudo, ele supera o modismo de ingredientes fáceis ao adaptar o gênero à sua linguagem, e não vice-versa. Exemplo dessa criação é Império do desejo, de 1980, no qual o diretor desenvolve uma trama de corrosiva auto-ironia que se projeta acima das cenas de sexo, fazendo destas o testemunho de um limite.

Ambiguidades- Agora, enquanto aguarda uma decisão do Conselho Superior de Cinema sobre os drásticos cortes exigidos pela Censura a seu filme Amor, palavra prostituta (um sombrio e vigoroso estudo inspirado pela leitura de Soren Kierkegaards, o pai do existencialismo), Reichenbach lança O paraíso proibido. Na história, um radialista, Celso – que trocara o sucesso da grande cidade pelo posto de locutor na pequena emissora de um balneário – recebe a visita de seu “professor” de rádio. O velho amigo começa a enredá-lo num plano para a compra da moderna emissora da cidade vizinha. Contrário a essa proposta, Celso passa a envolver-se e indispor-se com seus amigos e colegas, temeroso de perder seu paraíso individual.

O título do filme só existe em função da personalidade do radialista Celso – muito bem interpretado por Jonas Bloch. Para Celso, paraíso é onde ele possa exercer plenamente seu egocentrismo, impulsivamente fazendo o que quiser para dominar tudo à sua volta, sem precisar preocupar-se com a direção a que os fatos ou a vontade das outras pessoas o pretendem levar.

O diretor Reichenbach, porém, não construiu seu personagem sobre esse esquema maniqueísta e auto explicativo: o radialista, como todos os heróis – se pode chamá-los assim – criados pelo diretor, carrega em si uma tal carga de ambiguidade, uma necessidade simultânea de fuga e decisão, ideais ora dilúveis, que mesma seu objetivo de paraíso tem proibido como adjetivo inseparável. É ele próprio, em última análise, quem provoca seus obstáculos: os outros personagens parecem ser apenas emanações da busca de Celso pela satisfação da ambiguidade. Isso o transforma em um personagem autodestrutivo, eternamente se debatendo sobre seu desejado Paraíso proibido.

Publicado originalmente na revista Visão, edição 39, em 28 de setembro de 1982

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