sexta-feira, 8 de maio de 2020

Semana “Placar Mais” no VSP: "Gata de Vida Mansa" (Placar, 27 de abril de 1990)


GATA DE VIDA MANSA

“É la press de Brasil! É la press de Brasil!”.


Um misto de português, espanhol e inglês saía da voz fanhosa e desafinada do assessor de imprensa da CBF, Robério Vieira, 40 anos, depois da derrota de 1 X 0 para a Inglaterra, no legendário Estádio de Wembley, no dia 28 de março. Bem a seu estilo, aos berros e empurrões, ele acabava de conseguir aquilo que muitos repórteres brasileiros já achavam impossível: liberar a entrada da imprensa no vestiário da Seleção Brasileira, prática incomum na Europa.

Avesso a etiquetas, Robério, um cearense arretado de Mombaça, 1,77 m e 108 kg, voz alta e gestos espalhafatosos, tem o paradoxal apelido de “Gata Mansa”, graças uma leva semelhança com a cantora Maysa, que fez sucesso nos anos 60. Há nove anos no cargo, o que comprova suas sete vidas, Gata Mansa é hoje uma figura folclórica no prédio da CBF, onde conviveu com cartolas de todos os tipos, como o ex-vice-presidente Nabi Abi Chedid. Apaixonado por uma “cachacinha”, como ele mesmo diz, é visto com restrições por alguns dirigentes. Principalmente em viagens. É que, nos aviões, passa o tempo todo com generosas doses de uísque. “Bebo e com muito prazer, porque é de graça”, assume ele, que nessa vida mansa conheceu mais de quarenta países.


No exercício de sua função, porém, mistura eficiência com atitudes de tresloucado. Como aquela em que botou para correr um repórter chileno de um treino no Brasil durante as eliminatórias só porque, na semana anterior, o Brasil empatara em 1 X 1 num jogo tumultuado no Chile.


GAFES DE TROGLODITA

O assessor Gata Mansa foi um dos principais personagens do cronista Sandro Moreyra. Descontado algum exagero, as gafes e anedotas sempre tinham um fundo de verade.

- Do alto de uma sacada, o prefeito de Coimbra mostrava, orgulhoso, a cidade aos dirigentes a CBF, exaltando suas tradições, seus monumentos e seus castelos:
“Esta cidade é uma das mais velhas de todo o Portugal”, dizia.
Foi então que Gata Mansa deu o aparte:
“É muito velha mesmo, senhor prefeito. E porque não a reforma?”.

- Afastado do cargo por um breve período na administração Giulite Coutinho, o Gata Mansa tratou de aprender novos idiomas que facilitassem o seu trabalho. Mas, sincero, confessou a sua fraqueza:
“Falar muitas línguas não é comigo não. Já vi que não dou mesmo para ser troglodita”.

- Na excursão da Seleção pela Europa, em 1983, a delegação voava sobre a Suíça e, de repente, Gata Mansa constatou admirado:
“Puxa, como são grandes ao Andes suíços...”
“Muito grandes, de fato. Basta dizer que eles vêm desde lá do Peru”, ironizou o empresário diretor Medrado Dias.

Publicado originalmente na revista Placar, número 1035, 27 de abril de 1990

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