Uma atriz que não
esqueceu sua trajetória na Hollywood paulistana. Essa é Débora Muniz. Após
atuar em dezenas longas-metragens, a intérprete prosseguiu a sua carreira nos
palcos e na sétima arte. Em 2012, Débora estrelou o curta-metragem A Mulher Barata de Mário Vaz Filho. No
lançamento deste filme, VSP conversou rapidamente sobre este trabalho e
relembramos parte da trajetória da musa. Sempre educada e gentil, Débora é
dessas pessoas que falam sobre a Boca do Lixo com emoção e
sentimento.
Violão,
Sardinha e Pão- Quantas vezes você trabalhou com o Marinho?
Débora Muniz- Com o
Marinho eu trabalhei...que eu me lembro pelo menos seis vezes.
VSP-
Seis vezes?
DM- Tem bastante coisa
que eu fiz com o Marinho. Tem uma história bem longa.
VSP-
Como é trabalhar com ele?
DM- O Marinho é aquela
coisa que eu falei com pessoal...eu estou tendo o privilégio de estar de volta
no solo sagrado do cinema nacional que é a rua do Triunfo. E Marinho foi um
grande personagem de toda essa história, eu digo que ele era o mais despojado e
continua sendo o mais despojado. É o único que conversa com você assim: “Vamos
fazer essa porra logo. Vamos rodar essa porra logo”. É uma delícia trabalhar
com o Marinho porque ele não é uma pessoa com uma única formação. Marinho é
tudo ao mesmo tempo: ator, diretor, roteirista, faz tudo em comportamento. Então, você encontra o Marinho
como se fosse o seu parceiro na cena. E é divino porque você não tem ele numa
única função É uma delícia trabalhar com o Marinho porque é um grande amigo em
primeiro plano. E um porra louca da rua do Triunfo (risos). Principalmente
isso.
VSP-
Como foi ser protagonista nesse curta?
DM- Ele é um puto. Ele
é um puto porque ele sabe que quando ele escreveu a única louca que faria esse
papel seria eu. Então, ele já tinha certeza disso. Porque o Marinho além do
diretor é em primeiro lugar o amigo. Então, mesmo depois que a Boca parou, toda
essa história...nossa eu adoro o Marinho de paixão. É um grande amigo, um irmão
querido. Coincidentemente a gente se encontrou numa mostra dos filmes do Chico
(Cavalcanti). Nisso, ele coçando a cabeça veio me falar: “Porra Débora não sei
como te falar um negócio aí”. Eu respondi: “Fala logo Marinho. Desempucha
porra, você não é de rodeios”. “É um filme aí que tem pelada...”, aí eu
perguntei quem iria dirigir. Ele: “Eu...”. “Então vamos embora e não enche o
saco”. “Mas você não viu o texto?”, “Mas isso me interessa? Quando a gente for
rodar eu vejo.”
VSP-
Você nem viu o texto?
DM- Eu não vi o
roteiro. “Que dia começa?”, “Tem que ver produção, orçamento”. As dificuldades
de sempre né? Eu falei: “Quando tiver pronto você me liga dois dias antes e
vamos embora”. Foi assim...existem pessoas que mesmo da boa época da Boca
quando começaram a fazer o explícito, essa coisa toda. Eu mesma resisti um
tempo: “Não vou, não vou, não vou”. Aí quando eu vi que eu faria ou pararia de
fazer cinema a única coisa que me interessava era saber quem iria me dirigir, o
autor do roteiro e a equipe técnica. Com o Marinho agora foi a mesma coisa.
Vira e mexe o pessoal me liga: “Débora, vamos fazer um filme?”. Algumas vezes
eu estou com compromissos: “Não tenho tempo. Eu estou fazendo teatro”. Agora
depende de quem vem a proposta. Essa veio de uma pessoa que eu amo de paixão e
confio. Então, mais uma vez eu fiz uma porralouquice.
VSP-
No bom sentido...
DM- No bom sentido e eu
amo. Eu acho que isso é Boca, é cinema nacional. Tanto que algumas pessoas
falam: “Mas isso é trash”, a
realidade é que o Brasil é trash.
Entende? Eu amo o meu país, amo a Boca e amo o cinema nacional.
VSP-
Hoje você trabalha mais com teatro...
DM- Aí você vê a
maluquice. É tão maluco que eu no
momento estou em cartaz com Darwin, o
Canto dos Canários Cegos, um espectáculo divino. Estou voltando com Os Ossos do Barão do Jorge Andrade, um
clássico e também faço espetáculo espírita. Amo fazer espetáculo espírita.
VSP-
Quais peças você está fazendo pra esse segmento?
DM- Estou com O Amor Venceu da Zíbia Gasparetto e
estou com O Advogado de Deus também
da Zíbia.
VSP-
Poxa, mas como você decora tanta coisa ao mesmo tempo?
DM- Olha é tanta
confusão. Na próxima semana, eu vou fazer Os
Ossos do Barão a tarde, a noite Darwin
e depois vou fazer O Advogado de Deus.
Mas é incrível que eu digo que cada personagem tem a sua essência. Então, eu
sempre vivo seguinte maneira: o ator, a atriz não tem que interpretar. Eu sou a
personagem. Então, no momento certo eu sou Emma Darwin. Depois, eu sou Verônica
de Jorge Andrade. Então, naquele momento não tem como confundir porque as
personalidades são completamente diferentes. Naquele momento específico eu sou
aquela mulher e aquela personagem não conhece a outra. Então, não tem como
misturar. É algo divino.
VSP-
Você deve gostar muito de teatro. Mas o cinema continua sendo a sua grande
paixão?
DM- Cinema é a minha
grande paixão. Só que hoje é muito difícil fazer a cinema né? Então, eu me
realizo com teatro. E me realizo quando os amigos resolvem fazer loucuras e
acabam decidindo fazer um filme dessa maneira. Nisso, eu acaba embarcando
nesses projetos.
VSP-
Filmar com a barata foi dificil?
DM- Tadinha da
barata...ela tava quase morrendo. Eu fiquei com dó da barata, foi ao contrário
(rindo). Aí é aquela coisa de cinema que a gente fala: achei maravilhosa a
fotografia. Eu achei divina a foram como eles conduziram que parece que a
barata foi. Mas a verdade não foi. Mas a barata estava convadescendo sabe?
Então foi uma gracinha. Ela era pequeninha. Não era meiga?
VSP-
Era bem pequeninha. Não dava muito medo da barata.
DM- Mas mesmo que fosse
um baratão, o que é uma barata perto de tudo que a gente passa nesse país?
Nada. Podia ser um rato também. Não mudava o sentido da coisa.
VSP-
Débora, me desculpa perguntar isso...mas você tem quantos anos?
DM- Eu estou maravilhosamente bem com os meus 52 anos. E amo ter 52 anos.
VSP-
Como é pra você ser uma das musas da Boca e uma das únicas que continua fazendo
cinema. Você é muito guerreira? Porque muitas desistiram.
DM- Eu acho que
guerreira...guerreira eu sou com certeza. Mas eu acho que eu sou mais
apaixonada pela arte e pelo cinema. Eu digo sempre que o diferencial foi que
cada uma chegou na Boca em um momento pra ser a estrela, pra grandes
personagens. Eu tive a minha adolescência na Boca. Então é incrível porque eu
tive pais de verdade na Boca. Então, eu tive desde o começo da minha
adolescência com o Mojica. Eu era mais uma filha junto com o Crounel e a
Mariliz. Depois, teve o Augusto de Cervantes...isso é algo que me entristece de
vir na Boca. Porque eu olho a antiga janelinha (do escritório da Masp Filmes) e
é sério...pra mim o Augusto ainda está lá (emocionada). Pra mim Ody...você vai
chegar ali e encontrar o Ody. Pra mim, abrindo a portinha daquele boteco eu vou
encontrar com o Tony Vieira. Então, isso é muito forte e eu admiro esse pessoal
com esse cineclube aqui porque é aquilo que eu digo: aqui é o grande tapete e
vai continuar sendo daqui a 100 anos. Eu acho que quem está nascendo agora vai
conhecer a história da Boca e vai passar e dizer: “Era aqui que diziam que era
o grande castelo”.
VSP-
Hollywood de São Paulo?
DM- Hollywood de São
Paulo, nosso solo sagrado. Então, a Boca, a rua do Triunfo será sempre o solo
sagrado do cinema nacional.
VSP-
Você ainda participar de cinema com nu isso não tem problema pra você esse tipo
de trabalho?
DM- Eu dizia sempre e
inclusive eu brincava muito com o Alfredinho (o cineasta Alfredo Sternheim), outro que eu amo de paixão: se eu
tivesse continuado fazendo um filme em seguida do outro eu teria morrido em
frente a uma câmera. Porque ás vezes o pessoal pergunta: “Débora, o que você
fez em cinema?”. Eu respondo: “Mais fácil você perguntar o que eu não fiz em
cinema”. Porque em cinema eu acho que eu fiz tudo e continuo aberta pra fazer
mais. Então, eu acho que cinema é essa coisa maluca, é o diferente, o além. Eu
quero me surpreender e ainda continuo esperando o personagem que vai me surpreender.
Aí me perguntam: “Você já fez o seu melhor personagem?”. Não, ainda estou
esperando ele. Esperando e tenho certeza que vai chegar.
VSP-
Débora, você acha que o Mojica vai ficar enciumado de você ser protagonista em
um curta de terror?
DM- Mais isso não foi a
primeira vez. Você sabe que quando eu fiz Amor
Só de Mãe que foi de terror também e nós ganhamos vários prêmios foi uma
coisa maluca. Isso porque veio o diretor de uma revista americana especializada
em terror e veio fazer uma reportagem sobre o filme. O americano entrevistou o
Mojica, entrevistou o Dennilson (Ramalho, diretor do curta Amor Só de Mãe) e a gente brincou muito. Nos perguntávamos: “Quem
vai fazer a capa da revista?”, eu falei com o Mojica: “Não adianta. Você é o
mestre”. Mas foi a discípula que acabou saindo na capa. Então, eu acho que não
existe ciúmes. O Mojica sabe que ele vai continuar sendo um paizão, um mestre.
Mas a discípula quer ir muito além.
3 comentários:
Maravilhosa entrevista, excelente texto, magnífico blog!
Concordo plenamente com o destaque do depoimento no título!
Pesquiso justamente a Boca do Lixo em minha dissertação de Mestrado sobre os filmes lançados por lá entre 1981-1985 e apaixono-me cada vez mais por essas pessoas...
E amei o teu 'blog', insisto, mais do que prazer (literalmente, inclusive) em te descobrir!
WPC>
muito legal. Parabéns meu caro. Continua fazendo um trabalho imprescindível.
2015...ela ainda atua? Gostaria de conhecê-la.Pena que as peças teatrais onde ela atua é sempre em SAMPA,afinal não custa viajar para ver o trabalho dela...sou do Paraná
Abraços
Ulisses
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