O trio de aventureiros era composto por Tony Vieira, Claudete Joubert e
Heitor Gaiotti. O personagem que ele fazia era o Cara de Gato. O
comendador Francisco Assis Soares trazia os cavalos e os empregados
assavam o garrote. As noites em Sabaúna eram animadas com música,
cantoria, futebol, boêmia. Tony Vieira sempre media a febre. Mantinha
uma mala entupida de remédios já que era hipocondríaco por natureza.
Cara de Gato não. Magricelo, boa praça e bom de copo. Dava chances para
os iniciantes. Foi ele quem chamou o então perdido Castor Guerra para
ser ator num faroeste. O pagamento: um sanduíche e um refrigerante
Crush. Foi a primeira oportunidade do alto e desengonçado Castor num
longa-metragem. Ele ficou devendo essa para Gaiotti, o Cara de Gato, o
mais engraçado ator da rua do Triunfo. Uma vez, Gaiotti e Tony brigaram.
O ator, produtor e diretor chamou então Ronnie Cócegas (Galeão Cumbica
da “Escolinha do Professor Raimundo” do Chico Anysio) para o papel
cômico. O resultado não foi ruim. Mas a parceria voltou, afinal, os dois
eram irmãos. De cinema, de boêmia, da rua do Triunfo. É errado achar
que Gaiotti deixou sua marca somente nas produções do amigo. Esteve
presente em dezenas de produções paulistas como “O Inseto do Amor” de
Fauzi Mansur. Também foi o marido que tenta trair a esposa e recebe
bicadas em “A Mulher Que Põe a Pomba no Ar” de José Mojica Marins e o
policial que anda de Veraneio e salva o perdido Lírio (Nuno Leal Maia)
no clássico “O Bem Dotado- O Homem de Itu” de José Miziara. Lembro dele
fazendo o caseiro Firmino numa comédia do Antônio Meliande no qual ele é
o melhor ator da produção (“Vadias Pelo Prazer”). Também está
engraçadíssimo em “O Filho da Prostituta”, o segundo e último
longa-metragem de Francisco Cavalcanti rodado em Avaré em que faz cenas
muito divertidas com a rechonchuda Yolanda Silva, sogra de Chico e avó
do Fabrício.
Pouca gente sabe. Mas Gaiotti abandonou a carreira
militar, o exército para ser palhaço, humorista, ator cômico. Os
companheiros de quartel davam tantas gargalhadas com suas apresentações
que ele resolveu seguir a carreira artística. Gaiotti era de uma
fidelidade canina ao amigo Tony e aos companheiros da produtora MQ
(Marca e Qualidade como diziam nas entrevistas ou Mauri de Queirós, o
nome verdadeiro de Tony Vieira) . Um dos grandes humoristas do Brasil,
talentosíssimo. Morreu esquecido. Não vai ser capa de nenhum caderno
cultural nem nome de centro acadêmico ou cineclube. Mas as filmagens vão
começar. Tony gravou a ideia (o “argumento”) numa fita K7:
“Meu
irmão: quero um filme bangue-bangue mais pesado que os italianos.
Giuliano Gemma vai ficar com inveja da gente. Quero um papel de destaque
pra Claudete. Muitas moças. Um papel bom de vilão pro Comendador. Mas
papel grande com fala. Coloca uns ciganos, tráfico de escravas brancas e
muito tiro. Vai ter uma explosão num celeiro. Fronteira Brasil-México
será atravessada”.
Outro faroeste realizado em Sabaúna, Mogi das
Cruzes. Luiz Castellini ouve a fita e faz o roteiro com empenho.
Comendador providenciou cavalos árabes e persas. Disponibilizou todos os
ambientes da sua propriedade. O esforçado Nabor Rodrigues organiza a
produção. O versátil Henrique Borges ficou encarregado da direção de
fotografia. Esse foi um técnico que trabalhou em praticamente todos os
gêneros do cinema brasileiro e continua esquecido. Carregou todos os
equipamentos de trem para Sabaúna. Minami Keizi veio fotografar e
registrar tudo para a revista “Cinema Em Close-Up”. O material bruto
depois será montado. O início das filmagens será comemorado no Soberano.
Serafim já xingou todo mundo. Fizeram uma balbúrdia no seu
estabelecimento. Rua do Triunfo em festa.
3 comentários:
Excelente seu artigo. Sou fã de "Calibre 12". Já assistiu? Fantástico, filmado em Lages (SC). Abraço e parabéns pelo trabalho. Teria algum contato de Tony Vieira, João Amorim ou algum destes outros atores históricos? Grato, Vinicios Ortiz, São Miguel do Oeste (SC)
Puxa, como é triste todo o final de vida dessas pessoas, fizeram tanto sucesso, a alegria do cinemeiros...eu por exemplo sou dessa época, assistia nos cinemas da minha cidade... só resta a saudade, boas lembranças e o meu lamento em saber de todo o final triste do Tony Vieira, abandonado pelo seu maior amor, a Claudet e o Heitor, esquecido. infelismente!
já mais perdi um filme do tony viera e cara de gato na década de 1980 assisti todos no cinema nos dias de hoje assisto no YouTube e relembro minha adolescência para mim eles foram os melhores atores do cinema brasileiro
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