Ele parecia o Dom Quixote.
Baixo, tagarela, cabelos brancos ao vento. Quando fazia frio colocava uma
boina. Tinha o vocabulário enxuto e gostava de posar de intelectual. Sempre foi
de esquerda e polêmico. Se o Gaúcho gostasse do amarelo ele gostava do
vermelho. Mas sempre discutiam. Eram velhos amigos e tudo era muito engraçado. Quando
ele aparecia no escritório do Montana era genial. Gonzaga dizia que Montana era
“rústico”. Montana dizia que Gonzaga era “doido”. Luiz Gonzaga dos Santos era
um daqueles intelectuais de periferia. Dizia que seu “bunker” era em Artur
Alvim, zona leste de São Paulo. Quando conheci o Gonzaga foi uma espécie de
amor a primeira vista. Ficamos muito próximos, nos adotamos. Ele foi meu avô e
eu seu neto. Quando andávamos juntos, era muito engraçado: “Ele é seu avô?”. “Não”.
“Ele é seu pai?”. “Não”. “Ele é o que seu?”. “Amigo”. Eu sempre ia na casa
dele. Ou inventava alguma pauta ou assunto para ir. Todo mês dava uma passada.
Gonzaga tinha um daqueles celulares vagabundos mas ele não chamava aquilo de
celular. Ele chamava de “livre”. “Você ligou no meu livre e não atendi”. Ele me
chamava de jovem Matheus, meu jovem.
Gonzaga dirigiu dois
filmes. O primeiro era baseado num conto do Marcos Rey chamado “Mustang Cor de
Sangue”. Os produtores preferiram outro título: “Patty, a Mulher Proibida”.
Tudo para chamar público. Gonzaga odiava os produtores. Trinta anos depois Gonzaga
continuava chamando o filme de “Mustang”. Já “Anúncio de Jornal” era um filme
mais pessoal e produzido por ele mesmo. Mas foi um fracasso porque foi lançado
na época do explícito. Gonzaga odiava o explícito, achava que isso não era
cinema, que ofendia as crianças, umas coisas dele. Depois trabalhou com vendas
de uns produtos estranhos ou sei lá o quê. Mas sempre tentando voltar ao
cinema. Lógico que nunca conseguiu. Projetos não faltavam. Tinha vários e fazia
uns discursos que nunca acabavam. Parecia o Fidel Castro discursando.
Gonzaga vinha tendo uns
problemas de memória até ser internado num asilo de velhos. Estou tomando
coragem para visita-lo ou nunca irei. Lembro que uma vez ele foi num
supermercado fazer uma espécie de cartão fidelidade. Perguntaram a profissão.
Ele disse: “Cineasta”. Deram risada da cara dele. Saudade Luiz.
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