Playboy entrevista Supla (fevereiro de 2002)
O Rei da Mídia conta do tiro
que levou, lembra de José Serra tomando sopa, de um pesadelo na Casa dos
Artistas e fala sobre o papai e a mamãe
Na saída da casa noturna de
São José do Rio Preto (SP), onde o show terminou há alguns minutos, uma entre
as dezenas de garotas que se empolgaram no portão e na janela do banheiro
localizado entre o camarim e a van da equipe chama a atenção. De minissaia
jeans e blusa vermelha colada no corpo ela berra “Suuplaa”, faz o V da vitória
com os dedos, os coloca sobre os lábios e treme a língua entre eles. O gesto
provoca gargalhadas e espanto dentro do carro: a fã de Supla não deve ter mais
que 8 anos de idade.
No caminho para o hotel, um
jovem motoqueiro segue a equipe até emparelhar no sinal. “Pô, você deve ser o
maior comedor, né, meu?”, dirige-se a Supla que sorri. “Sua irmã não falou isso
ontem”, brinca o roqueiro. E despede-se, não sem antes recomendar ao garoto
cuidado para não cair da moto. Supla é um cara família.
Protagonista de um dos maiores
fenômenos de audiência da TV nas últimas décadas, o reality show Casa dos
Artistas, do SBT, o perfomer já superou a marcar de 600 000 cópias
vendidas do disco O Charada Brasileiro. As primeiras 100 000,
distribuídas em bancas de jornal, esgotaram-se durante os primeiros dias do
programa, onde ele aparecia frequentemente vestido com a camisa da promoção e
tocando suas músicas no violão. O restante, após um contrato de distribuição com
a Abril Music.
Para o rebelde que viveu no
underground de Nova York por 6 anos, de punks em shows no Brasil – como na
abertura da turnê dos Ramones em 1996 – e era tratado com absoluta frieza pela
mídia, poder cobrar os atuais 20 000 reais de cachê por apresentação é uma
conquista. Mesmo que, vestido com suas jaquetas recheadas de espetos de metal e
calças rasgadas, ele seja seguido, hoje, por um público semelhante ao que o
Mamonas Assassinas reunia na metade dos anos 90. Antes da música, Supla atraia
pelo exotismo, tanto no visual quanto na árvore genealógica. “É uma contradição
ser filho de quem sou”, confessa com um sorriso discreto, referindo-se ao
papai, o senador Eduardo Matarazzo Suplicy, 60 anos, e à mamãe, a prefeita de
São Paulo, Marta Suplicy, 56 anos.
“Meu público é amplo. Trato
bem as pessoas que gostam de mim”, diz o comportado Supla, o Rei da Mídia, o
Papito, o Charada Brasileiro, ou, para os íntimos, Eduardo Smith de
Vasconcellos Suplicy, 35 anos. Desde que voltou para o Brasil para “dar uma
força” na campanha vitoriosa da mãe, o roqueiro começou a aparecer na mídia com
frequência de um popstar. Primeiro na MTV, ressuscitado pelo VJ Marcos Mion no
programa Os Piores Clipes do Mundo. O clipe de Green Hair, música
de amor na qual estrelam várias das paqueras de Supla em Nova York, se tornou cult
de tão tosco. Depois veio a participação na novela global Um Anjo Caiu do
Céu – nada mal para quem já tinha feito par romântico com Angélica no filme
Uma Escola Atrapalhada. Em seguida, “o golpe de mestre Charada”, como
ele mesmo diz, a participação estelar na Casa dos Artistas.
Na lista dos responsáveis pela
volta de Supla aos holofotes, só fica faltando a língua solta do roqueiro.
Sincero e ingênuo, o primeiro-filho de São Paulo passou a receber atenção maior
depois do processo de separação dos pais. Com discrição dos irmãos, o músico
João Suplicy, 27 anos, e o advogado André Suplicy, 33 anos, Supla passou a ser
uma das principais fontes para se saber o que de fato ocorreu entre as quatro
paredes da mansão da família, no Jardim Europa.
Para entrevistar o Charada
Brasileiro, PLAYBOY destacou o repórter Leandro Simões. Foram 6 horas de
gravação, incontáveis (e mútuos) telefonemas e 450 km de viagem no ônibus, ao
lado do super-herói.
“Foram três encontros, e o
primeiro deles aconteceu exatos dois dias antes de Supla se trancar na Casa
dos Artistas. ‘Olha, na semana que vem não vai dar pra gente se encontrar
para continuar a entrevista. Vou para Nova York e não sei quando volto’, me
disse. Eu descobrira posteriormente que pelo contrato assinado com o SBT ele
não podia abrir o jogo – e então armou a charada, numa atitude própria de seu
personagem. Nesta sessão de entrevista, feita antes do reality show do SBT, um
Supla mais introvertido e disposto a falar sobre a família. Nas duas outras,
uma delas realizada na viagem a São José do Rio Preto, interior de São Paulo, o
Supla pós-exposição maciça, mais preocupado com seus shows e o sucesso
galopante.
Lembro-me de que no meio do
show em Rio Preto, dia 13 de janeiro, Supla, diz entre uma música e outra:
‘Essa é dedicada aos jornalistas, com todo amor e carinho’. E olha ironicamente
para o backstage, onde eu assistia ao show. Tratava-se de um cover de Dancing
with Myself, sucesso de Billy Idol, roqueiro inglês eternamente lembrado
como quem teria inspirado o visual de Supla. E que, diga-se, inspirou mesmo, o
que ele odeia admitir. Daí a alfinetada dirigida aos ‘jornalistas’ no meio de
um show, mostrando quem ele é. Um sujeito que sabe rir de si mesmo, embora leva
algumas coisas a sério demais – a sua música – e outras de menos, como
acompanhar o que a mãe anda fazendo na prefeitura da maior cidade do país.
Da primeira vez que o
entrevistei para as duas últimas sessões, naturalmente, coisas mudaram. Menos
uma: ele se mantém paciente e atencioso – às vezes até demais. Continua, como
no ano passado, telefonando para avisar que vai incluir a tal música no próximo
show e perguntando se eu não quero ir para ver como vai ficar. Ele, que para
dormir de madrugada na estrada, dentro do ônibus que voltava para São Paulo,
colocou uma fita de Drácula (sem legendas) e do horripilante Marilyn
Manson no videocassete; ele, que no palco soca o ar e faz um balé típico de um
ágil lutador de boxe (que realmente foi), é fora dos palcos um eterno
adolescente: ávido por auto-afirmação, carente e companheiro. E muito educado”.
PLAYBOY – Na letra do sucesso O
Charada Brasileiro, você diz: “Não me vendo por dinheiro”. Como assim?
SUPLA – É uma
charada. Eu sou independente, sou geração business. Eu tô tirando sarro de tudo
isso. Tô me aproveitando da mídia e, ao mesmo tempo, não.
PLAYBOY – Numa outra música,
você canta: “A mídia tá aí/ pra te entreter/ Eu vou aproveitar pra poder me
vender”. Não é uma contradição?
SUPLA – Contradição
é a minha adição. Foda-se, fuck off, esta é a melhor resposta que eu
tenho pra isso.
PLAYBOY – Então, não é pra
levar nada que o Supla faz a sério?
SUPLA – Pelo
contrário. O Supla é entretenimento total e é isso que é pra se levar. É muito
trabalho levado a sério. Sabe por quê? Porque tudo isso eu mesmo que armei, não
foi uma gravadora. Toda a mídia e o povo brasileiro comprou, com uma ajudinha
do Sílvio. Eu vim pra bagunçar o coreto.
PLAYBOY – Isso não faz de você
um pastiche eterno de você mesmo?
SUPLA – Olha,
eu pude mostrar na Casa dos Artistas que tem o Eduardo, uma pessoa que
antes ninguém entendia muito bem. Meu trabalho é muito sério, cara, a capa do
disco, tudo é muito sério. O que é legal é que quando a gente faz sucesso todo
mundo fica puto. É engraçado... Por exemplo, os jornalistas querem fazer
perguntas afiadas. Acho o maior barato isso. Mas eu não me vendi por dinheiro.
PLAYBOY – O que você ficou
fazendo 30 dias preso lá então?
SUPLA – Eu
divulguei o meu disco, é por isso que eu fui lá, vamos deixar claro.
PLAYBOY – Divulgou o disco
para ganhar o quê? Não foi por dinheiro?
SUPLA – O que
é dinheiro pra mim? É ótimo ter dinheiro. Pra trocar a moto, pra se tiver um
filho dar uma boa educação a ele. O que o dinheiro vai melhorar pra mim? Vou
poder montar um palco bom, dar um show bom, com um som bom e uma luz legal. Eu
ia ficar uma semana na Casa e depois ia embora. Mas aí comecei a lugar
quando o Sílvio apareceu com aquela mãozinha de esmalte segurando meu disc. É o
homem que segura o carnê do baú e estava segurando o meu disco! Falei: “Vai
vender, já vendeu 100 000, vai vender mais, eu vou ficar...”
PLAYBOY – “...muito rico!”
SUPLA – Ao
invés de você me cutucar, me por pra baixo numa coisa dessa, devia aplaudir,
porque é um golpe de mestre do Charada. Driblou aqui, driblou ali e fez gol. E
tá aí, agora tem que me engolir.
PLAYBOY – Não é perigoso se
assumir uma pessoa tão contraditória sendo filho de quem é?
SUPLA – Já é
uma contradição ser filho de quem eu sou. Nós todos temos contradições, é isso
que eu quero dizer.
PLAYBOY – Você pensa em sair
da casa onde você mora hoje, com seu pai e seu irmão João?
SUPLA – Meu
pai mora em Brasília praticamente. O João nem fica lá. Daqui a pouco vão vender
a casa, não sei. Eu tô com tanto trabalho que não tô nem pensando nisso. Está
uma casa vazia, ghost, uma casa de fantasminhas.
PLAYBOY – É estranho morar
naquela casa sem a sua mãe?
SUPLA – (Enfático.)
Não, não é. Eu sei que ela está ali do lado.
PLAYBOY – Quando você olha
para as coisas dentro da casa, para os móveis, não dá saudade dela?
SUPLA – Pra
gente encerrar esse assunto de mãe e pai, por tudo isso que aconteceu eu fico
muito chateado, como qualquer filho. Mas eu quero que a minha mãe seja feliz e
que o meu pai seja feliz. Primeiro a felicidade deles. Mas que ficou triste por
dentro, fico.
PLAYBOY – E a história que o
Luiz Favre (petista e atual companheiro de Marta) ter se hospedado na
casa de seus pais antes da separação?
SUPLA – Posso
te falar honestamente? Eu não estava no Brasil. E eu não sei te dizer se esse
cara ficou – esse Luís...Nem sei o nome dele direito pra falar a verdade -, se
ele estava lá ou não.
PLAYBOY – Mas você não chegou
a exigir que ele saísse?
SUPLA – Eu
nem conhecia o cara.
PLAYBOY – Você acha que já
estava rolando alguma coisa antes do romance vir a público?
SUPLA – (Evasivo.)
Isso eu não sei, não sei.
PLAYBOY – Era um casal tão
perfeito, o Brasil inteiro via assim...
SUPLA –
Acontece nas melhores famílias. Acontece. O que eu acho é o seguinte. Tanto eu
nessa entrevista, quanto meu pai publicamente achamos que a vida privada, nesse
caso, tem que ser tratada com sigilo, com respeito. Eu não me sinto no direito
de falar sobre a relação deles. Quem sou eu pra falar do meu pai ou da minha
mãe? Isso é um problema deles.
PLAYBOY – Mas você é filho dos
dois.
SUPLA – Eu
fico chateado só pela coisa da família. Foi difícil. Pra minha mãe não é fácil
de se separar de um cara com quem ela está há tanto tempo, não é fácil pra ela
também. Com três filhos, por mais que eles já estejam grandinhos e tudo, mas
não é fácil. É uma separação de sei lá quantos anos, 36 anos. Eu fico chateado.
É engraçado mesmo, um casal perfeito, legal e tudo, do bem total.
PLAYBOY – Você sabia como
estava o relacionamento dos seus pais lá de Nova York?
SUPLA –
Sabia, estava normal.
PLAYBOY – Você imagina por que
seus pais se separaram?
SUPLA – Posso
até imaginar alguma coisa. É do tipo... coisa que eu sei desde o começo.
Tipo... Mas também pode não ser, então eu prefiro não falar. De repente eu falo
uma bobeira, aí minha mãe vem e me fala: “Você está louco, não era isso nem
nada”.
PLAYBOY – Então teve um
motivo?
SUPLA – Não
saberia dizer. Deve ter sido uma série de coisas, fatores pra levar a uma
separação de tanto tempo. Não é nem “eu não posso falar, mas é que eu me sinto
desrespeitoso, que não estou respeitando a privacidade dos meus pais. (Pausa.)
Eu tenho um amor pelo meu pai e pela minha mãe muito grande, então eu tenho que
respeitar ao máximo, do fundo. Eu sou uma pessoa falante, né? Poderia te falar
mil motivos por que eu acho que houve a separação, mas seria a minha opinião. (Pausa.)
Meu pai deu uma entrevista para uma revista e eu vi umas fotos dele e da minha
mãe, antigas... Pô, me deu uma...Sabe? Engraçado, né. A vida vai, e de repente
acabou. A assessora do meu pai veio com as fotos antigas e me mostrou. (Com
os olhos úmidos.) Meu pai tinha pedido a ela pra mostrar pra mim antes de
deixar publicar, porque tinha a gente ali, todo mundo ali.
PLAYBOY – Você chorou quando
viu as fotos, como agora?
SUPLA – Pô,
deu uma baqueada. Me emocionei. É minha família. Se não fosse meu pai e minha
mãe eu não estava aqui, é onde eu saí, do esperma do meu pai com a coisa da
minha mãe lá. Saiu o Supla. Só podia sair uma coisa meio assim mesmo, né... (Rindo
e lacrimejando.) Pelo menos é do bem, pode ter certeza.
PLAYBOY – Como está o seu pai?
SUPLA – Ele
tá bem, viu, meu!
PLAYBOY – Está feliz com a
escritora Ana Miranda (namorada do senador, segundo especulações)?
SUPLA – Isso
vai ter que perguntar pra ele. Quero que ele seja feliz com quem for, não
importa.
PLAYBOY – Você a conhece?
SUPLA – Conheço.
PLAYBOY – Como ela é?
SUPLA – Simpática.
Uma pessoa simpática. Como o outro lá, o “Fravre”, Favre. Não o conheço bem,
conheci na campanha (de Marta Suplicy para a prefeitura de São Paulo, em 2
000). Não a conheço também. Conheço assim, “oi”. Não tenho nem tempo. Mas
minha mãe é sempre minha mãe e meu pai é sempre meu pai. Não tem essa de
padrasto, madrasta, sem essa. Esses são os meus pais e acabou, insubstituíveis.
PLAYBOY – Seu pai seria um bom
presidente?
SUPLA – Acho
que seria um fantástico presidente para o Brasil. Pela humildade dele, pela (empolgado)
luta dele. Que vem de um alto nível social e tudo, mas que poderia ser um outro
tipo de pessoa, mas não. Poderia nem ter entrado na política, ter ido trabalhar
num banco e ganhar dinheiro, que é mais ou menos como funciona a sociedade que
eu tiro sarro.
PLAYBOY – O que você acha do
Lula?
SUPLA – Eu
acho que ele poderia ser um pouco mais democrático. Meu pai respeita muito o
Lula, mas como eu sou filho tenho esse lado meio emocional, não vou mentir. E o
lado que eu vou falar pode até prejudicar o Lula, mas todo mundo sabe que ele
sempre começa bem e depois cai. Todo mundo sabe disso. E se o Lula falasse
“todo mundo que vota em mim, vota no Suplicy”, acho que o partido ia ter mais
chances.
PLAYBOY – Se o Lula for o
candidato, tem o seu voto?
SUPLA – Eu
gostaria de ver a prévia e ouvir as coisas que ele tem a dizer. Mas também
quero saber como vai o respeito perante ao meu pai, um cara que deu a vida dele
inteira pelo partido e pelo Brasil.
PLAYBOY – Você elogia muito o
seu pai publicamente. O que você mais admira na sua mãe?
SUPLA – (Pensativo.)
Já
admiro por ser mulher e estar entrando nisso de pontapé, ainda mais numa
sociedade machista como a nossa. Faz parte da luta dela, já entrando com o pé
na porta. Admiro as posições dela.
PLAYBOY – Você falou em
sociedade machista. Se fosse seu pai que tivesse arranjado uma namorada, ia ser
diferente?
SUPLA – Ia ser
triste...Só peço aos dois que se respeitem. Porque isso implica os filhos
também e eles são pessoas públicas. Quer separar, separa. Só não fica corneando
ou qualquer coisa. Tenho até uma música: “Tá namorando/ fica pensando/ que eu
tô te corneando/ eu vou continuar”. Aí até uma amiga minha perguntou: “Vai
continuar o que, corneando ou namorando, caralho?”. Mas, voltando, se fosse meu
pai eu ia falar para ele: “Ó, meu, respeita a minha mãe. Se quiser ficar com
essa menina aí que você tá não tem problema nenhum, mas avisa a minha mãe e não
faz ela de trouxa”.
PLAYBOY – E não teve isso por
parte da sua mãe?
SUPLA – Se
teve eu não sei. E se teve eu ia ficar muito puto. Em respeito a nós e a ela mesmo.
(Enfático.) O problema que todos nós sabemos é que quando você já está
meio assim com outra pessoa é porque você já fez a bobagem, deve ser.
PLAYBOY – O que você conversou
com sua mãe sobre isso?
SUPLA – Pedi a
mesma coisa: sem esse papo de cornear e desrespeitar. Respeitar a você própria
e ao seu marido que sempre te respeitou, só isso.
PLAYBOY – Imagine que seu pai
e sua mãe são candidatos à presidência. Em quem você vota?
SUPLA – É
difícil, não sei. Vou votar em branco, voto nos dois. Dá pra dividir o voto?
Como eu vou fazer?
PLAYBOY – É verdade que havia
gente querendo desvincular sua imagem do PT por causa de coisas que você fazia,
como andar sem capacete?
SUPLA – Olha,
saí numa revista americana chamada Outlaw Biker, que é contra a lei pra
motocicleta. Eu sou contra a lei do capacete. Em Connecticut, nos EUA, você não
é obrigado a andar de capacete. Eu ia pra lá só pra andar sem capacete. Gosto
de andar de moto por causa da liberdade da moto, daquele vento. Num puta
calorzão é um saco colocar capacete.
PLAYBOY – Você voltou a usar?
SUPLA – Eu
uso sempre capacete. Quer dizer, às vezes uso, ás vezes não uso. No dia que tá
muito quente, num domingo, aí eu não uso. Levo no braço. O que me dá tesão na
moto é a liberdade, andar sem capacete. Podia ser liberado no domingo, né? É só
mudar a lei.
PLAYBOY – Não pega mal ser
filhos da prefeita e contra a lei?
SUPLA – Mas é
meu ponto de vista. Quem vai perder a carta sou eu. Isso de ter que pegar bem é
como aqueles políticos que ficam pegando criança no colo na periferia.
Ridículo! Acho engraçado os caras segurando criancinha no colo. Ah, pára, meu!
Se toca... (Risos)
PLAYBOY – Sua mãe também faz
isso...
SUPLA – Não só
ela como o Fernando Henrique e todos os políticos. O Lula também daqui a pouco
vai estar beijando, com aquela barba pinicando, todas as criancinhas. (Risos).
PLAYBOY – Você acha que o Lula
é mal assessorado?
SUPLA – Eu
não gostaria de falar isso porque ia dar pano pra manga para os concorrentes.
Quem faz a campanha da Roseana (Sarney), por exemplo, é o (publicitário)
Nizan Guanaes? Sabe o que eu acho engraçado? Todos esses políticos precisam de
pessoas pra dizer a eles o que falar, o que vestir. Por que você não pode ser
você mesmo? Você tem que pagar uma pessoa pra fazer isso. Esses caras que estão
aí deveriam falar: “Pô, meu, eu tô aqui pra te ajudar porque eu quero fazer um
Brasil melhor. Eu já tenho muito dinheiro e acredito em você”. Mas não, é tudo
coisa muito profissional, é tudo dinheiro.
PLAYBOY – Mas você não está
sempre dizendo que é tudo business, Supla?
SUPLA – É
isso mesmo, esse é o mundo em que a gente vive. Bem-vindo ao nosso mundo.
Engraçados esses políticos, precisam todos de muita gente.
PLAYBOY – Você sempre teve a
preocupação de deixar claro que fez seu nome independente dos seus pais. Você
acha que as pessoas acreditam nisso?
SUPLA – É
muito importante deixar claro que cada um é responsável pelos seus atos. Meu
pai, meu pai; minha mãe, minha mãe.
PLAYBOY – As pessoas nunca
pensam assim, não é?
SUPLA – Mas é
assim que eu penso. Meu pai mesmo, ou minha mãe, que são políticos, podem fazer
uma besteira. Eu vou ser culpado por isso? Não.
PLAYBOY – Sua mãe completou um
ano de mandato na prefeitura de São Paulo. A cidade está diferente?
SUPLA – Acho
que ela tá indo melhor. Não posso responder isso porque não tive nem tempo pra
me coçar ainda. Fiquei 50 dias numa porra lá, saí, não tive tempo nem de ver
jornal direito, essas coisas.
PLAYBOY – E pelo que você vê
nas ruas, pelo que vê das pessoas?
SUPLA – Pra
mim continua a mesma coisa, não mudou. Mas não é porque não tá mudando, é
porque eu estou focado muito nas minhas coisas, não tenho tendo tempo de
acompanhar.
PLAYBOY – Desde a adolescência
havia muitos políticos dentro de casa. Que tipo de passagem interessante chegou
a presenciar?
SUPLA – Eu
não me envolvia muito, até me afastava. Tanto que até saí da minha casa quando
começou a ficar muito chato. Fui embora. (Pensativo.) Mas me lembro de
uma coisa há muito tempo. Na casa da (rua) Laerte Assunção, antes da
casa da rua Grécia, me lembro do (José) Serra tomando sopa. Ele fazia
assim, (simula uma colher na boca) “tsshhh, tsshhh”. Fazia aquele
barulho com sopa, eu olhava aquilo... (balança a cabeça negativamente).
Mas não tenho nada contra ele, foi sempre muito simpático comigo.
PLAYBOY – Falando em outra
casa, como foi passar tanto tempo dormindo, acordando, vendo a Bárbara Paz de
biquíni durante o dia e não transar?
SUPLA – (Batendo
o dedo indicador na testa.) É tantra, é tantra. (Risos.) É na
cabeça, é bem louco, meu. A gente tava curtindo: (cantando) “Deixem que
digam, que pensem, falem... Eu não tô fazendo nada, você também...”
PLAYBOY – Então não rolou sexo
lá dentro e nem depois?
SUPLA – O povo
vai querer ficar sabendo e não vai saber. Lá não rolou e aqui eu guardo a minha
privacidade.
PLAYBOY – Isso já é uma
resposta.
SUPLA – Mas
não é. Posso até te dar: não rolou, tudo bem. Mas eu não entre lá para comer
ninguém. Até falei pra Bárbara antes que, se a gente começasse a se beijar,
aquilo era um mundo irreal. Nos curtimos, em vez de ficar armando planos para
ver quem vai ganhar.
PLAYBOY – Aquelas brigas então
não existiam de verdade?
SUPLA – Aquilo
era discussão mesmo. Mas tudo relativo aquele momento. Ela é totalmente hippie,
é outro estilo. Me lembro que um dia começaram a cair uns trovões e todo mundo
foi tomar banho fora de casa. Eu dava uns berros hardcore, “huooo huooo”. E de
repente ela sai e grita “vida, vida...” Puta bicho-grilo do caramba! (Risos.)
PLAYBOY – Como era acordar
todo dia e dar de casa com o Alexandre Frota?
SUPLA – Podem
falar o que quiser, ele é um cara muito engraçado. (Sério.) E cara de
teatrinho aí, que tem preconceito com ele, pode ir à merda também. Ele me fez
rir muito. Quando ele imitou a Núbia levantando a sobrancelha eu não conseguia
me controlar.
PLAYBOY – Você tinha
pesadelos?
SUPLA – Não
me lembro. Mas teve um sonho que o Frota me contou. “Supla, Supla, acordei de
um puta sonho louco”. Perguntei o que foi, e ele: “Era um debate na TV, estava
o Maluf e sua mãe, e você entrou e deu um murro na cara do Maluf”.
PLAYBOY – Você já experimentou
drogas?
SUPLA –
Quando eu tinha 16 anos. Depois, pra me liberar, fui vice-campeão de boxe da (TV)
Gazeta.
PLAYBOY – O que você achou da atitude
da Soninha, que declarou publicamente que fuma maconha?
SUPLA – Ela é
uma menina bem culta, com a cabeça feita, sabe o que está falando. Não era a
melhor coisa para ela falar realmente, mas não deve ter falando por mal. Não a
recrimino de jeito nenhum. Achei uma judiação, ela tem filho pra sustentar. É o
tipo de coisa que a igreja precisa perdoar, tá ligado? Se é coisa de igreja,
cadê o perdão? Não tem perdão? Todo mundo é santo! Conheço uma pá de padres aí
que ficava pegando umas minas. Se você for ver assim, querido, vai ter que
tirar muita gente da televisão. Fora o que tem de político que fica bêbado por
aí e não perde o mandato.
PLAYBOY – Você teria coragem
de dar uma declaração daquele tipo?
SUPLA – Nesses
casos vale a pena dar uma pensada. E seguir o meu instinto é isso, é não dar
pano pra manga.
PLAYBOY – E em Nova York, você
usava drogas?
SUPLA – Não,
também não.
PLAYBOY – Por que você tatuou
um cavalo no braço?
SUPLA – Fiz
quando tinha 13 anos, escondido da minha mãe. Eu gostava muito de cavalo,
jogava pólo. Mas aí eu cobri porque achei que não tinha nada a ver com a
personalidade e fiz essa (simbolizando a morte), aos 18 anos, em Los
Angeles, com a Nina Hagen.
PLAYBOY – Esse é um outro
capítulo...
SUPLA – Vou te
contar como foi com a Nina Hagen. É que é tão velha essa história... “Você
comeu a Nina Hagen!” Grande bosta...Ela me comeu, não fui eu que comi. Daquele
jeito dela, fui comido... (Risos.)
PLAYBOY – Como você a
conheceu?
SUPLA – Conheci
quando ela voltou do Rock in Rio (janeiro de 1985). No Rock in Rio só vi
aquela figura, que eu achei meio esquisita e tudo, mas achei legal. Ela era da
mesma gravadora (da banda Tokyo), a CBS, hoje Sony Music, e veio fazer
uma turnê no Brasil. Aí o pessoal da gravadora mostrou a ela Garota de
Berlim, ela viu a foto da banda e aí topou gravar. Conheci a Nina Hagen no
estúdio da Transamérica, onde tem a rádio e onde eu gravava. Quem escreveu essa
música foi um rapaz chamado Rodrigo Andrade, que tocava guitarra na minha
primeira banda em que toquei bateria, a Metrópolis.
PLAYBOY – Por que ela topou
gravar?
SUPLA – Ela me
falou que só aceitou porque me achou bonito na foto, que tinha gostado do meu
estilo e da música. E logo quando ela chegou (ao estúdio), começou a dar
olhares. Aí eu já comecei a dar olhares. Ela tinha 25 anos, e eu 18. Gravamos,
fomos à Latitude (casa noturna paulistana já extinta) e depois a um
restaurante japonês. E depois do restaurante japonês foi ó... (batendo o dorso
da mão direita na palma da mão esquerda). Como diz nosso querido (ex-narrador
esportivo) Osmar Santos, ripa na xulipa! (Risos).
PLAYBOY – O que vocês
conversavam?
SUPLA – Eu
perguntava um monte de coisas e ela me convidou a ir para Los Angeles. Foi
demais. Me lembro que ela me buscou numa limusine e a gente foi para Larrebe
Street, em Hollywood, que era a rua da Tower Records, onde rolam todos os
lançamentos. Fiquei em Los Angeles uns 2 meses só curtindo, com praticamente
tudo pago, um sonho de criança. Parecia aquela música, “Garota eu vou pra
Califórnia, viver a vida sobre as ondas...”
PLAYBOY – Como eram as
amiguinhas da Nina Hagen?
SUPLA – Tinha
muitas amigas punks, muita molecada. Me lembro de que na primeira semana que eu
cheguei lá ela me levou a um japonês com uma mulher chamada Angeline. Tinha
pôsteres dela na cidade inteira. Era uma ruiva que tinha um Corvette rosa, uns
peitos gigantes e um telefone para as pessoas entrarem em contato... E morava
na frente da casa da Nina Hagen. Então eu passava umas tardes lá...
PLAYBOY – Ajudar na campanha
de sua mãe para a prefeitura de São Paulo foi a melhor desculpa que você podia
ter para voltar ao Brasil?
SUPLA – Tudo
foi perfeito. Quando meu pai e minha mãe me ligaram pra falar isso eu tomei um
baque em Nova York. O Psycho 69 tinha acabado e eu tinha montado a Bossa
Furiosa, uma banda fantástica que até tem um disco inteiro gravado que eu nunca
lancei. A banda estava começando a criar um hype em Nova York. Mas aí o DJ Moby
foi a um show e levou minha baixista e o meu baterista para a turnê mundial
dele. Aí eu falei: “Quer saber? Vou pegar essas músicas, levar para o Brasil e
cantar na periferia pra minha mãe”.
PLAYBOY – Como saíram as
letras em português?
SUPLA –
Comecei a dar rolê de carro com o senhor Fábio Boop (amigo e investigador de
polícia em São Paulo). Punha o som em inglês, com aquela batida, e a gente
fazia as letras, anotando num papel. Só dando rolê de carro, vendo as merdas e
compondo.
PLAYBOY – Seu parceiro musical
é um investigador de polícia?
SUPLA –
Conheço o Fábio desde moleque, de pegar onda. Estudei com ele no Colégio
Objetivo. Ele fez comigo a letra de Punk Funk, Bizness, São
Paulo, Interesseira. Ele sempre ia aos meus shows com uns espetos na
roupa. É um cara muito engraçado, meio fortão. Casou recentemente. Gostava de
uma loira...
PLAYBOY – O que os manos
achavam daquele cara de cabelo louro, filho da prefeita, cantando para eles?
SUPLA – Quando
você tá cantando na periferia, se os caras não gostam de você eles te mandam à
merda. Me lembro que eu toquei no Capão Redondo e estavam os caras do rap
olhando para mim e eu dando aqueles berros. E com umas batidas cabulosas de
Nova York, do underground de hip-hop verdadeiro, do Brooklin. Streets from
fuckig Brooklyn, man. E cantando na letra de um policial, numa linguagem de
rua. Não essas porras de intelectuais de merda. E é onde eu ando, na rua.
PLAYBOY – Você não é muito
mainstream para se achar punk, não?
SUPLA – O
punk é só mais uma coisa dentro do rock e eu amo rock and roll acima de tudo. O
que eu acho legal é justamente não ter que virar um soldadinho, todo mundo ter
que se vestir igual. O punk é você criar o seu próprio estilo, fazer sua
própria coisa.
PLAYBOY – Como você fez sua
turma em Nova York?
SUPLA – Tinha
um cara que foi casado com uma tia, a Tetê, irmã da minha mãe, que era diretor
de cinema e também morava lá. Conheci quando era moleque, numa das vezes que
fui para Nova York antes de me mudar. Cheguei lá, ficamos um pouco mais
próximos e ele me perguntou: “Você quer sair comigo? Eu conheço uma menina aqui
que é bem roqueira...” Eu disse: “É lógico que eu quero sair com a mina, não
quero sair é com você...” (Risos). Saí com essa me menina e ela me
apresentou ao Stag, o guitarrista do Psycho 69, e à Grace, mulher do Stag, que
era enfermeira e fazia roupas de couro sensacionais pra todo mundo na época,
até para o AXL Rose. Aí eu passei a manter contato com esse pessoal e andar
direto nas ruas de Nova York.
PLAYBOY – Como foram os
primeiros dias?
SUPLA – Eu
deveria até escrever um livro, tenho até uns diários... Depois de pouco tempo
que eu fiquei amigo do Stag eu já deu um show rápido com a banda, a Psycho 69.
Um show rápido, um pocket show junto com outras bandas, num lugar
chamado Aka, na Houston com West Broadway. Lembro que um dia o Stag e um amigo,
o Hell´s Angel, quebraram os traficantes que ficavam na rua dele. Porrada
mesmo. E aí no dia seguinte, depois desse show, os caras que apanharam
voltaram. Depois desse show, já tarde, estávamos lá eu, o Stag e o amigo dele –
que eu não conhecia bem...Chega um japonês e disse: “Vou te revistar porque eu
acho que você tem uma arma”. Mas aí o Stag já começou a dar porrada. De repente
começaram a chegar outros, uns caras da Indonésia, da máfia, que ficavam
vendendo umas coisas ali, todos com armas e facas. A mulher do Stag começou a
berrar, da janela, e ele vira para o lago: “Entra lá e pega a shotgun”.
Nessa, ele pegou o japonês e pôs uma faca na garganta desse e disse “quem vier
eu corto”.
PLAYBOY – E você no meio
disso?
SUPLA – Eu
falei comigo: “Peraí, não tô entendendo, será que eu tô num filme?” Não tinha
nada a ver com a história, tinha só ouvido falar que eles tinham tudo uma briga
no dia anterior... Mas aí, muito rápido, o amigo do Stag veio com a shotgun
e trocou com o Stag pela faca, que estava no pescoço do japonês. Só que o Stag
não soube armá-la direito, o negócio disparou no chão e cortou um dedão de um
dos caras. E alguns estilhaços pegaram no meu pé. Nessa hora a polícia chegou e
fechou a rua. Um policial me parou e perguntou onde eu estava indo. “I´m
just walking” (só estou andando) e o cara me liberou.
PLAYBOY – Você foi para onde?
SUPLA –
Peguei um táxi e fui direto pra casa do meu tio. Entrei lá todo sangrando, no
tapete branco dele, naquele apartamento maravilhoso. Disse que precisava ir a
um hospital. Isso tudo em 5 dias. “Welcome to New York”, pensei. Meu tio virou
para mim e disse: “Dudu, eu tô aqui sonhando, é sua primeira semana aqui e você
já toma um tiro”.
PLAYBOY – Qual foi a primeira
coisa que você fez lá para ganhar dinheiro?
SUPLA- A primeira
coisa foi jogar futebol. Os colombianos me viram jogar numa pracinha, a
Thompkins Square, e me chamaram. Era uma liga que os caras organizavam. E não
acreditavam que eu era brasileiro, com aquele cabelo, ainda mais jogando num
time de futebol de colombianos. Eu dizia que era só me pagar que eu jogava,
adoro futebol. Ganhava 200 ou 300 dólares por jogo.
PLAYBOY – Você trabalhou também
como demolidor?
SUPLA – Isso.
Era contratado para demolir paredes. Punha um som alto e mandava a marreta.
Ganhava 20 dólares por hora. Trabalhei como leão-de-chácara também, no melhor
lugar da noite, o Coney Island High. Lá vi todas as bandas: Korn, Lim Bizkit,
Iggy Pop, Ramones, bandas de hip-hop.
PLAYBOY – Rolava muita briga?
SUPLA – No meio de hardcore? Era sempre briga. Shows punk, sempre tinha uns shows mais violentos. O baterista que tocava comigo, Lui Gasparro, tinha uma família que parecia viver dentro de um filme, aquele do tipo Robert De Niro e Joe Pesci. Todo domingo eu ia comer na casa dele, em Astoria, com seus 6 irmãos, 3 irmãs e a mãe. Nossa...O pai tinha falecido no Segunda Guerra Mundial e a mãe sempre me perguntava: “So, you don´t like my food, Supla, ahn? (Então, você não gosta da minha comida?) E me dava uns socos no braço, era cabuloso. (Risos.)
PLAYBOY – Seus pais não
mandavam dinheiro pra você?
SUPLA – Não.
Só em treta. Por exemplo, quem pagou minha operação de joelho, que machuquei
jogando bola, foi minha mãe. Na verdade, ela pagou o seguro de viagem. Me
lembro que quando eu saí daqui ela me perguntou se eu não ia fazer um seguro.
Disse que não, mas ela fez assim mesmo, de uns 400 dólares. Foi uma coisa de
mãe, um presente. No dia da operação eles foram lá me ver.
PLAYBOY – Você os hospedou?
SUPLA – Até
pensei em fazer um filme...Eu na praça, com a Green Hair e mais uns caras, e de
repente chega uma puta limusine com a bandeirinha do Brasil. Aí a porta se abre
e eles falam: “O que você tá fazendo aí?” Tipo Eddie Murphy. (Risos.)
PLAYBOY – Como você conheceu a
Green Hair, a menina que deu o título da música que te fez voltar ao sucesso no
Brasil?
SUPLA – No
primeiro dia em que eu vi ela em Nova York, muito magra, com uns peitos
gigantes, bonita pra caramba, com aquele cabelo liso preto até a bunda e uma
parte inteira verde, parecendo uma vampira, falei “nossa”! Ela tava com uma
cerveja, ao lado de um bando de crusties, aqueles caras que moravam em
lugares abandonados. Convidei na hora para comer sushi. Fomos lá pra casa e
aí... já foi, né? (Risos.)
PLAYBOY – E as outras meninas
dessa música?
SUPLA – Na
verdade essa é uma música de amor. A Monica que eu chamei de Green Hair era
porto-riquenha com um pai irlandês. Uma mistura que sai fogo, né? Aí eu tava
falando com um amigo, chamado Vulcan, que fez a música junto comigo e ele disse
que aquela letra estava muito bunda-mole. Resolvemos por mais um monte de
meninas. Aí mudou a letra, que tava muito boba. Por isso é que a música é
profunda, é uma música de amor mesmo, que fala de todas as meninas. A gente
decidiu então que ia falar da Cabeça Raspada, da Cabelo Roxo, das meninas com
quem eu tinha tido uma experiência, alguma loucura.
PLAYBOY – Que tipo de loucura?
SUPLA – Da
menina de cabeça raspada, por exemplo. Quem me apresentou foi o Jimmy Gestapo,
de uma banda de hardcore novaiorquino chamada Murphy´s Law. Uma skinhead linda,
tipo uma Sinead O´Connor, com uns olhos azuis desse tamanho. Ela era de
Chicago, estava com o filhinho dela e pediu pra dormir uma noite lá em casa.
Perguntei ao Jimmy se podia confiar e ele disse que sim. Aí lá em casa eu coloquei
o filhinho dela, um mini-skinhead (risos), pra dormir. O pessoal da
banda tava vendo vídeo, e disse que ia dar um tempinho e fui dar uma dormida.
Fui pra minha casa e o filho tava do lado. De repente eu tô dormindo, acordo
com alguém chupando o meu pai. Falei: “Não é possível...” Vejo e era a mina, a
Cabeça Raspada. Depois disso nunca mais a vi.
PLAYBOY – Como você compõe?
SUPLA – Faço
as letras com o George, guitarrista do Holly Tree. A banda dele só canta em
inglês. Já fiz até um filme com ele. Eu, ele e o (João) Gordo. O Gordo é
um psiquiatra e eu faço o Adolf Hitler morto. Eu estou todo de cinza, na
banheira...Cabuloso.
PLAYBOY – Você acredita em
Deus?
SUPLA –
Claro.
PLAYBOY – Você se acha um bom
músico?
SUPLA – Acho.
Quem tem que dizer isso é o povo, mas eu acho. Eu gosto das minhas músicas.
Imagina ter que cantar coisas que eu não gosto? Tô fodido, né? Acho que eu
tenho um timbre de voz grave gostoso, bom de se ouvir e toco violão do meu
jeito.
PLAYBOY – Você sente falta de
uns punks no seu show?
SUPLA – Não.
Meu púbico é mais amplo. Não posso fazer música para uma meia dúzia de pessoas
só. Trato bem as pessoas que gostam de mim.
PLAYBOY – Como foi receber uma
cusparada durante o show de abertura do Ramones no Brasil, em 1996?
SUPLA – Olha,
era a última turnê da banda. Até entendo que os caras estavam lá para ver os
Ramones e não me ver. Mas os mesmo caras que me insultaram foram pedir
autógrafos depois.
PLAYBOY – Você ouve MPB?
SUPLA – Gosto
de muito de Vinícius de Morais. Canto de Ossanha, com o Baden Powell,
sempre achei uma das melhores músicas. Gosto do Tom Jobim, do começo do Caetano
Veloso, do Roberto Carlos. Ele e o Erasmo falam de coisas simples, de coisas
que a gente sente, de sentimentos simples, bonitos, sem frescura. Gosto do
Charlie Brown e do começo do Ira! também.
PLAYBOY – Você tem uma música
que fala de uma japa girl, sua banda se chamava Tokyo e vez ou outra tem sushi
nas suas letras. Que ligação é essa?
SUPLA – É
total coincidência, mas adoro a cultura japonesa. Nunca fui pra lá, mas já fiz
várias entrevistas para a TV japonesa depois da Casa dos Artistas. E
estou querendo ir para o Japão, na Copa do Mundo. Imagina que legal! (Risos.)
Vamos ver se rola, cantar Japa Girl na Copa, já imaginou.
PLAYBOY – Você era bom aluno?
SUPLA – Razoável,
decente. Não era fantástico, nem ruim, era normal. Só teve um ano que fiz dependência,
em Geometria. Mas eu acho que foi treta particular com o professor. Acho que
ele ficou sabendo que eu ia para o Havaí, que pra mim, aos 16 anos, seria a
coisa mais impressionante do mundo. Era um sonho. Se eu passasse direto eu ia
ter essa felicidade, mas por meio ponto ele me deixou. Aí falei: “Quer saber?
Pode me repetir, tudo bem. Ano que vem vou para o Objetivo, faço dependência de
Geometria e pau na sua bunda, tchau. Fica aí dando sua aulinha que eu vou pro
Havaí”.
PLAYBOY – Quando estudava no
colégio São Luís você foi expulso?
SUPLA – Teve
uma história meio mal contada, em que fui convidado a me retirar. Foi treta com
os padres que vinham com papo de aula de sexo. Sem condição, né, meu? O padre
falava que se você beijasse antes de casar ia para o inferno. Eu era moleque,
14 anos, ouvia aquilo e falava: “Peraí, então eu vou para o inferno, estou no
inferno!”. Engraçado é que meu pai até já fez propaganda para o São Luís...
PLAYBOY – E você já tinha até
transado naquela época, suponho.
SUPLA – É, já.
PLAYBOY – Como e quando foi?
SUPLA – Acho
que foi com 13 ou 14 anos, com uma namorada. Mas nem entrou direito, eu era
muito criança.
PLAYBOY – Não sabe se entrou
direito?
SUPLA – É, eu
era muito moleque.
PLAYBOY – E a primeira vez que
entrou, você lembra?
SUPLA – Infelizmente...Será
que eu digo “infelizmente” ? Nem sei. Não foi aquela coisa de amor. Foi com
puta.
PLAYBOY – Como era o papo em
casa?
SUPLA – As
pessoas imaginam que por ter uma mãe sexóloga, ela vai falar mais coisas. Não falou
nada a mais do que qualquer outro pai ou mãe. A única coisa que eu me lembro
pegando nos livros dela era que tinha uns negócios de doenças venéreas. E tinha
uma que ia abrindo o cu assim (une as mãos e separa em seguida),
rasgando o cu. Eu falei: “Nossa, essa aí eu não quero pegar de jeito nenhum”.
PLAYBOY – Depois de Casa
dos Artistas, comercial em TV e tudo, como é que fica a história de ser
punk?
SUPLA – Eu não
me considero isso, não. Eu me considero acima de tudo rock and roll, bem antes
de punk.
PLAYBOY – O João Gordo também
está lançando um disco independente, mas fez uma declaração do tipo “por favor,
não me comparem ao Supla”. E aí?
SUPLA – Acho
engraçado o Gordo me criticar depois de ele ter feito propaganda aqui, ali. Não
tem moral nenhuma para falar isso. Ele é outro rei da mídia que tá aí rebolando
pra fazer as coisas.
PLAYBOY – Qual é o seu maior
sonho?
SUPLA – (Pensativo.) Ter
saúde. E quem sabe ver a música Green Hair estourar no mundo inteiro.
PLAYBOY – Você se veste com
essas jaquetas cheias de espetos e dorme de pijama azul-bebê. Quem é o Supla?
SUPLA – É ele
mesmo, eu não sigo as regras das coisas normais da vida. Sigo o meu estilo. (Cantando.) “I don´t
wanna live a real life, it´s boring / I just wanna be in a comic book
with you”. (Não quero viver uma vida real, isso
é chato/ Só quero estar num livro de histórias em quadrinho com você).
É muito chata a vida real. Eu sou eu, as pessoas que cuidem da vida delas.
Publicado originalmente na
revista “Playboy” em fevereiro de 2002
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