terça-feira, 7 de março de 2017

A Ilha do Desejo no Jornal da Tarde

NÃO EXISTE CONTEÚDO, MAS A FORMA É PERFEITA

Por Luciano Ramos

A Ilha do Desejo (Marabá e circuito) – Antes mesmo que se pudesse comentá-lo, o filme já batia recordes de renda. Como um produto bem lançado, com eficiente embalagem, a fita está suplantando
“O Golpe de Mestre” e “O Poderoso Chefão”. Sem ambicionar constituir-se em “obra de arte”, alcança entretanto a condição de mercadoria altamente vendável e mercadologicamente perfeita.

David Cardoso é protagonista e produtor principal. Deve ter utilizado a experiência de seus 33 filmes – como ator ou assistente de direção – para concluir que não adiante tentar o sucesso sem respeitar o público. Por isso, além dos apelos fáceis do erotismo e violência, o filme é confeccionado cuidadosamente. A música, por exemplo, é original – requinte atualmente muito raro, nas produções nacionais. A dublagem perfeita e o som claríssimo permitem entender-se o que dizem os atores (outro requinte).

O diretor Jean Garrett – pseudônimo de Jean Silva -, teve boa escola, como assistente de Ozualdo Candeias. Cuida da imagem com carinho de artesão, enfeitando-a com preciosismos de montagem e rebuscados movimentos de câmara. Quando Márcia Real se embebeda e dialoga mentalmente com as estátuas do seu quarto, por exemplo, a direção torna-se intrigante e sentimental.

Todos esses cuidados, porém, constituem-se em mera maquiagem. De nada vale duas ou três sequencias criativas, enxertadas num argumento simplório. A pobreza dos diálogos também não é compensada pela precisão do som. Como na novela de televisão, onde imensos recursos técnicos são colocados a serviço de folhetins redundantes, a forma está aqui muito acima do conteúdo.

A história é, de certa maneira, semelhante ao recente “O Signo do Escorpião”: assassinatos em série sucedidos numa ilha. O local funciona como bordel sofisticado. Tão rico que dá-se ao luxo de possuir guardas especialistas em kungfu. David Cardoso interpreta um rapaz que trabalha como intermediário, recrutando profissionais nas boites de São Paulo e levando-as para a ilha. Mostra-se preocupado em evitar o exibicionismo que marcou algumas de suas antigas fitas. Modestamente, apanha nas brigas e só conquista uma, das sete moças que se encontram na ilha. Como ator, age cheio de moderação, contratando com os gastos que, como produtor dispensou à realização e promoção do filme. De maneira semelhante ao personagem que ele interpreta, David sabe que o sucesso comercial depende de se conduzir aos diferentes mercados as mercadorias mais adequadas.


Publicado originalmente no “Jornal da Tarde”, São Paulo, 13 de junho de 1975.

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Assim como é muito comum os jornalistas trocarem a expressão tachar por taxar,também se vê sempre a confusão entre câmara e câmera.