A morte de Manoel de Nóbrega deixou todo mundo
triste. O público perdeu um grande artista; os artistas perderam um verdadeiro
pai
A morte de Manoel de
Nóbrega, mais do que um acontecimento que levou cerca de vinte mil pessoas ao
cemitério da Vila Alpina, dia 18, representou uma perda pessoal para muitos
artistas. Homem de rádio e televisão durante 45 anos, ele foi responsável pelo
lançamento ou consagração de grandes nomes no meio artístico, como Sílvio
Santos, Moacir Franco, Canarinho e muitos outros, entre eles seu filho único,
Carlos Alberto de Nóbrega.
Quando souberam de sua
morte – ocorrida ás 22h55 min do dia 17 depois de uma terceira intervenção
cirúrgica em um câncer de pâncreas -, dezenas de artistas compareceram ao saguão
da Assembleia Legislativa de São Paulo (Nóbrega foi deputado estadual em 1948),
onde o corpo foi velado das duas da madrugada ás 13 horas do dia 18. Tristes,
abatidos, alguns chorando mesmo, todos lamentavam a morte do amigo Manoel de
Nóbrega.
De todos, o que mais
sofria, sem dúvida, era Carlos Alberto de Nóbrega, que além de filho único
tinha em seu pai seu grande amigo. “Ele me criou, me incentivou e fez de mim um
homem. Foi meu grande, maior amigo. Com que saudade já começo a sentir sua
falta, seus conselhos e sua orientação”.
Durante os preparativos
para a cremação do corpo, na Vila Alpina, Ronald Golias esteve à frente de
tudo, com a fisionomia triste que nunca mostrou na TV. “Vivo as emoções de uma
perda inconsolável. Afinal de contas, tinha em Manoel de Nóbrega mais do que um
amigo, um pai”.
Moacir Franco também se
mostrava tenso, inconsolável. “Para dizer alguma coisa sobre Manoel de Nóbrega
gostaria que fosse para poder desejar-lhe saúde e felicidade. Mas já que não
posso, desejo que ele descanse em paz e que as bondades que espalhou por onde
andou lhe sirvam de subsídios para a luz na vida eterna”.
Airton e Lolita
Rodrigues também lamentavam a perda de “um grande amigo, uma pessoa divinamente
alegre, sempre pronta a ajudar os outros”.
Na
televisão a alegria, na vida, o apoio de todos
Manoel de Nóbrega não
foi apenas o ator que a televisão projetou como criador da Praça da Alegria.
Nascido em Niterói no dia 18 de fevereiro de 1913, filho de português, ele
começou a trabalhar como taquígrafo, em inglês e português, do poeta e prosador
Olegário Mariano. Depois foi trabalhar no rádio, atividade que começou em 1931.
Foi ator e redator da Rádio Mayrink Veiga e da Jornal do Brasil, responsável
pelo remodelação e lançamento de vários programas da Rádio Ipanema, da Tupi do
Rio e de São Paulo, da Cultura e da Nacional de São Paulo. Em São Paulo,
trabalhou também nas rádios Record, Piratininga, Atlântica de Campinas, e
Difusora.
Poliglota – falava
inglês, alemão e francês -, Nóbrega trabalhou ainda nas cadeias americanas CBS
e NBC, produzindo programas de rádio em 1944 e 45.
Em 1948, foi o deputado
estadual mais votado de São Paulo (cerca de 40 mil votos entre três milhões de
eleitores).
Na televisão, além de
ter lançado grandes nomes como Sílvio Santos, Golias, Moacir Franco e outros e
programas como Praça da Alegria, escreveu para artistas como Derci Gonçalves,
Procópio e Bibi Ferreira. Com seu trabalho de criador, redator, produtor e
intérprete, passou pela TV Rio, TV Continental, TV Excelsior, no Rio e TV
Paulista e TV Record, em São Paulo, onde ultimamente atuava como jurado do
Programa Sílvio Santos.
Ele
foi amigo de todos. Mais de Sílvio
Sílvio Santos fala de
seu grande amigo Manoel de Nóbrega, o homem que o lançou no rádio, na televisão
e que lhe deu o Baú da Felicidade, com muita sorte
Sílvio Santos conheceu
Manoel de Nóbrega quando resolveu candidatar-se a locutor da Rádio Nacional de São
Paulo, numa época em que já tinha sido locutor em três rádios do Rio, figurante
de televisão e dono de um serviço de alto-falantes nas barcas da Cantareira.
Ele mesmo conta como viu Nóbrega pela primeira vez:
“O Nóbrega tinha um
programa de grande audiência em matéria de rádio. Quando eu resolvi ir para São
Paulo, pedi uma carta de apresentação ao seu irmão, Antônio Nóbrega, que morava
em Niterói. Chegando à Nacional, antes de falar com o Nóbrega fiz primeiro o
teste para locutor e passei em primeiro lugar. Depois fui esperar o Nóbrega na
rádio e quando ele terminou o programa eu lhe falei pela primeira vez: “Olha
seu Manoel, eu tenho aqui uma careta de seu irmão lá de Niterói”. O Nóbrega,
que nunca tinha me visto, me atendeu prontamente e ficou espantado quando eu
lhe disse que, antes de apresentar a carta, já havia feito o teste. A partir
daí ficou meu amigo”.
Sílvio passou a
trabalhar na Rádio Nacional. Seus laços de amizade com Nóbrega fortificaram-se
mais ainda quando Nóbrega, iludido por um alemão de quem era sócio no Baú da
Felicidade, foi socorrido por Sílvio. “O alemão – conta Sílvio – havia sumido
com o dinheiro e o Nóbrega, que nunca tinha ido à loja – que ficava num porão
-, me pediu que fosse para lá atender os clientes, pedindo-lhes que não fossem
fazer escândalos nos jornais e dizendo-lhes que o dinheiro deles seria
devolvido. Depois de quatro ou cinco dias trabalhando numa loja, vi que aquilo,
bem administrado, poderia tornar-se uma boa firma. Falei com o Nóbrega e nos
tornamos sócios, eu investindo o dinheiro que ganhavam com os shows em circos e
ele pagando a publicidade na Rádio Nacional. Comecei a fazer grandes negócios e
o Nóbrega, meio apavorado, com medo de que a coisa não desse certo novamente e
fosse manchar sua reputação em São Paulo, disse-me que não queria mais nada com
o Baú. Paguei-lhe cinco mil cruzeiros que ele havia perdido no negócio e fiquei
sozinho”.
A entrada de Sílvio
para a televisão também foi um empurrão de Manoel de Nóbrega. “Em 1964, - conta
Sílvio -, quando o Baú já era bastante conhecido, eu tinha um programa noturno
na Rádio Nacional de São Paulo e resolvi fazer na televisão um programa de
prêmios, com base no Baú. Naquela época, a TV Globo, canal 5, ficava fechada
aos domingos, só operando para futebol, depois das 15h30min. Fui ao Vítor
Costa, diretor do canal 5, e pedi que me desse o horário de meio-dia às duas da
tarde, para eu fazer um programa. Mas o Nóbrega também já havia pedido o
horário: no entanto, quando soube que eu queria meu programa de meio-dia às
duas, mais uma vez foi meu amigo e me socorreu. Ele disse: ‘Não, Sílvio, não
faz mal: eu queria fazer esse horário, mas cedo-o para você’. Mas uma vez ele
me deu a mão, mostrando ser o grande amigo que sempre foi, um Homem com H
maiúsculo”.
Na
alegria da praça, o respeito também era fundamental
Antes de escrever
qualquer piada, Manoel de Nóbrega costumava perguntar-se: “Poderei contar essa
piada a minha mãe? Se posso, também poderei conta-la à mãe dos outros na
televisão”.
Era assim que ele agia
na Praça da Alegria, a mais famosa de todas as suas criações, um banco de praça
que já sentaram grandes nomes, alguns pela primeira vez na TV, e que tiveram ao
lado de Nóbrega momentos de consagração. O programa foi lançado em 1957, na TV Paulista
(hoje Globo), e ficou mais de 10 anos no ar, em várias emissoras. Ronald
Golias, Moacir Franco e Carlos Alberto de Nóbrega começaram suas carreiras
naquele banco, por onde passaram também Consuelo Leandro, Simplício e José
Vasconcelos. Este, em certa época, foi roubado por Manoel de Nóbrega de um
programa de calouros de Ari Barroso.
A Praça chegou a ser
relançada no Programa Sílvio Santos, com a participação do próprio Sílvio.
Publicado originalmente
na revista Amiga em 7 de abril de 1976
Um comentário:
Postar um comentário