segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

Memórias do setorista da Boca XII: Éder Mazini






Lembro que encontrei com ele no velório do Carlão Reichenbach no MIS. O Éder parecia uma criança: chorava copiosamente: “Eu falava com ele toda semana”. Não aceitava a morte do amigo e parceiro de tantos trabalhos. Éder nasceu numa família tradicional do interior e veio para Capital estudar engenharia. Mas nem começou o curso. Terminou na Boca paulista como montador. Magricela, óculos fundo de garrafa, branco, risonho. Éder nasceu em Catanduva, a chamada “cidade feitiço”. O município ganhou esse título por causa dos seus carnavais. Os Mazini são uma família tradicionalíssima na região. Mas Éder foi para a sétima arte.



Era um homem inteligente. Não era um simples técnico em seu ofício, não era um colador de filme. Entendia de cinema e tinha uma formação intelectual. Questionava os colegas principalmente o Carlão. Foi um dos responsáveis pela ascendência de Reichenbach. Não sou eu que estou dizendo. A história fala por si mesma. Do Carlão, Éder montou “Extremos do Prazer”, “Amor, Palavra Prostituta”, “Filme Demência” e “Anjos do Arrabalde”. Também teve uma importante parceria com o genial Walter Hugo Khouri. Éder sempre foi o montador dos diretores série A da Boca: Antônio Meliande, Cláudio Cunha, Jean Garrett e Ody Fraga. Produções com bons orçamentos e bem realizadas. Mazini também foi sócio da Embrapi. Eu sempre quis reunir os sócios da mitológica produtora independente da Boca. “O problema é que todas as produções lá deram prejuízo”, dizia rindo. Os papéis e contratos da Embrapi devem ter ido para o lixo. Se fosse nos Estados Unidos poderiam ter um museu da empresa. Mas aqui ninguém liga pra nada.



Éder teve uma carreira em órgãos culturais depois do fim da Boca. Parece que não podia dar entrevistas dizendo que tinha trabalhado ali. Por isso me evitava mas sempre de maneira elegante e educada. Dizem que ele foi traído e isso deixou ele bem chateado. Mas ele estava bem feliz na última vez que nos encontramos. Estava aposentado, ia pegar a Beth (esposa da vida toda, com quem teve duas filhas) e viajar. Ou descansar pelo menos. Nos vimos numa segunda-feira num cineclube que o Marcelo Coialacovo e o Nilson Primitivo mantinham. Éder morreu subitamente na quarta-feira da semana posterior do nosso encontro. Não conseguiu curtir a aposentadoria.

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