domingo, 4 de abril de 2021

Agnaldo Timóteo (1936-2021)

 


Cantor que tinha voz. Se entregava totalmente no que fazia. Corajoso, combativo, polêmico até o último fio do cabelo. Negro, interiorano, católico fervoroso, pobre, torneiro mecânico, motorista da Ângela Maria, homossexual, apoiou políticos da direita e da esquerda. Nos anos 1970, ele carregava a gravadora EMI Odeon nas costas. Devia ser o cantor que mais vendia discos do selo conseguindo assim eles manterem vários artistas de prestígio. Muita gente foi bancada graças as vendas do Agnaldo Timóteo. A verdade dói. Usava roupas escalafobéticas, suas capas de disco vinham com leões, andava com carrões, ia na Galeria Alaska. Ele tirava a maior onda.

Tenho pilhas e pilhas de seus LPs. Aprendi a gostar dele com a Nivalda que cuidou da minha avó durante muitos anos. Nivalda ama o Timóteo, a Cláudia Barroso, Waldik Soriano, Nelson Ned, Benito di Paula e sobretudo Roberto Carlos. Ajudou diversos colegas financeiramente e os que tinham depressão. Timóteo sabia tudo como cantor: tinha timbre, carisma, voz, timming, era um profissional dedicadíssimo. Tinha um público que o amava, fiel num mundo a parte das grandes emissoras e dos críticos. Ele nunca deve ter ganhando muitas estrelinhas nos cadernos de cultura.

Pensei em várias canções dele. Mas selecionei que talvez seja seu maior sucesso. "Meu Grito" foi feita pela dupla Roberto e Erasmo Carlos especialmente para Timóteo. Trata da história verdadeira que Roberto vivia na época: apaixonado por Nice e não podia assumir seu romance em público. Os empresários diziam que isso podia prejudicar o "menino de ouro" da Jovem Guarda, o rei da juventude. Nice era desquitada e tinha uma filha do primeiro relacionamento. Isso era algo muito pesado para o Brasil da década de 1960. O divórcio só chegou aqui em 1977. Então, Roberto resolveu assumir sua paixão por Nice e entregou a música para outro cantor, para não causar tanta polêmica. Os versos dizem:

 "Ai que vontade de gritar seu nome, bem alto no infinito

Dizer que meu amor e grande, bem maior do que o meu próprio grito

Mas só falo bem baixinho e não conto pra ninguém

Pra ninguém saber seu nome eu grito só meu bem"

Pra ninguém saber que Roberto amava Nice e exorcizar seus demônios e fantasmas ele entregou a canção a Agnaldo Timóteo. Deu certo: foi um tremendo sucesso. Descanse em paz mestre e ídolo. Amém