terça-feira, 6 de dezembro de 2022

CINCO histórias minhas com o cineasta e produtor DIOMÉDIO PISKATOR (1958-2022)


Às vezes, penso em fazer um “Dossiê Boca” parte dois. Mas não valorizam essas coisas e quando lancei o primeiro não vendi muitos exemplares. Mas enfim, seguem alguns momentos que convivi com o cáustico Diomédio:

I- Lançamento do “Mulher Barata” do Mário Vaz Filho com a Débora Muniz. Teve a sessão no Cine Faroeste na própria rua do Triunfo onde tinha um pessoal do teatro. Na época, foi bacana eles montaram um meio um espaço cultural ali e estavam próximos ao Diomédio. Depois o Diomédio se afastou porque ele brigava e se afastava de todo mundo. Era natural dele. Mas enfim, teve a sessão e juntou um pessoalzinho. Deve ter sido em 2012. Lembro que foi numa noite muito fria. Lembro que eu tentava dar uma de intelectual para uma fulana bonita que apareceu lá. Quem diria! Uma moça jovem e bonita num evento do povo da Boca. Depois chegou o namorado da fulana e aí quase apanhei. Mas fiquei com os veteranos mesmo. Mas a ideia era ter a sessão e depois íamos comer pizza num lugar perto da praça Roosevelt que o Diomédio conhecia. Lógico que tomamos um porre homérico. Chegamos todos embriagados na pizzaria. Lembro que estava um pessoal da Boca nesse lugar da pizza: Mário, Índio, mais alguns. E que não teve como cortar a pizza, ninguém pegou uma faca. Cada um foi arrancando um pedaço, um negócio meio feio. O politicamente correto nunca foi uma das proezas do pessoal da Boca. Lembro que o Diomédio na hora de pagar falou que tinha algo e simplesmente sumiu. Bem aquelas coisas de produtor de cinema pobre: na hora de sair o dinheiro da conta o produtor sumiu!

II- Velório de um amigo da Boca. Melhor não falar o nome do falecido dessa história. Cheguei atrasado porque trabalho em Alphaville: peguei ônibus, metrô e outro ônibus. Lembro que passei no Habibs e já enchi a lata pra doer menos. Era no Cemitério da Vila Alpina, zona leste. Quando cheguei estava o Diomédio, Mário Vaz, Waltinho, Índio e mais alguns no bar vagabundo do lado do cemitério bebendo e cantando. “Pô, Diomédio, o que é isso?”. “É que ele queria ver a gente feliz”. Lembro que o Índio estava conversando com alguém do velório do lado. E aí o Diomédio falou com aquele humor cáustico dele: “Tá vendo? Até que a coisa não está tão ruim. O Índio até arrumou um namorado novo!”.

III- Pro Diomédio, o Ozualdo Candeias era a referência, o maior cineasta do mundo. Dizia que o Candeias tinha incumbido ele de reunir o pessoal da Boca. Diomédio tentava ser uma espécie de sub-Candeias, ou algo assim. Mas um amigo da Boca que trabalhava muito com ele dizia: “Mas entre o Candeias e ele tem uma diferença abissal”. Outro dizia: “O grande problema do Diomédio é que ele acha que é o Candeias do Piauí”. Isso porque o Diomédio nasceu em Teresina, capital deste estado.

IV- Não é que o Diomédio, o Marinho e o povo da Boca gostavam de bar vagabundo. Bar vagabundo gosto eu, você e as pessoas normais. Eles gostavam daqueles que tem ovo roxo, que os banheiros são o fim da feira. Normalmente, a gente começava na galeria Boulevard onde tinha um restaurante gaúcho que era de um japonês (vejam vocês!). A galeria continua lá, em frente ao Cine Dom José. Lá fechava acho que 22h. Aí o Mário gostava de um que ficava na avenida São João meio que expulsavam a gente. Não é que expulsavam, mas passavam o rodo para limpar e a gente saía reclamando. Lembro da minha mochila molhada com água da limpeza desse bar. O Mário também gostava de um que fica na rua Timbiras chamado Bar do Peixe. Eles botavam DVD do Milionário e José Rico. Nesse, chamavam o Índio de “chapéu”. Não me pergunte o motivo. Quando eu levava gravador o meu medo não era dos nóias me roubarem. Era de roubarem o gravadorzinho que eu levava para gravar as histórias do povo da Boca. Lembro de estar completamente bêbado olhando pros lados pra não pegarem o gravador. Tinha um na São João que era 24 horas. Pelo menos esse tinha salgadinho tipo Doritos e você comia para não ficar com a barriga vazia a madrugada toda. Esse continua lá. Diomédio frequentava determinado bar por um certo tempo. Depois, ele brigava e mudava de lugar. Teve um que o Diomédio ia que colocavam rádio e TV ligados juntos que era de um chinês. Ficava perto do Copan, acho que na Epitácio Pessoa. Lembro do Diomédio falando pro dono sem nenhuma cerimônia: “Oh, seu Ching Ling da casa do c..., que p... é essa!?”. É sério. Ele xingava o cara e chamava de Ching Ling sem a menor preocupação.

V- Diomédio organizava uns eventos de final de ano do pessoal da Boca. Ele já estava com câncer avançado. Num desses ele saiu do Cine Olido e começou a fumar. Eu falei: “Diomédio, desculpa me meter na sua vida, mas você pode fumar mesmo tendo câncer?”. “Cuida da sua p... da sua vida seu b..., v... O médico me proibiu de beber”. “Mas e de fumar?”. “Eu não falei pro médico que fumo!”, me respondeu rindo. Quero guardar essa imagem dele rindo. É isso.