Namorei uma menina que
tinha família no interior. Sempre que ia pra cidade dela eu passava por
Catanduva (“cidade feitiço”). Sempre que passava por lá lembrava: “Poxa, ainda
não entrevistei o Eder Mazzini”.
Eder
Mazzini (1950-2016) nasceu em Catanduva e nunca quis me dar entrevistas.
Chegamos a conversar várias vezes. Era montador de prestígio na Boca paulista.
Grande companheiro do Carlão Reichenbach. Lembro que encontrei Eder no velório
do Carlão no MIS. Acho que ele deve ter ficado o tempo inteiro do velório junto com a família
do Reichenbach. Mazzini era branco, magricela e usava óculos. Sempre muito
educado. Mas naquele dia estava devastado. Estava mais branco que o normal e
fumava um cigarro atrás do outro. “Agora quem sabe eu possa te dar a tal
entrevista. Eu falava com o Carlão todo dia”, admitiu. Os dois tinham sido
sócios da produtora Embrapi, uma tentativa de profissionais da Boca tornarem-se
produtores independentes. Eder ficou inclusive dono das produções da empresa.
Tentei diversas vezes fazer que ele vendesse os filmes pro Canal Brasil: “Eram
dez sócios, vai dar o maior rolo isso. Deixa pra outra hora”.
Eder veio do
interior para estudar engenharia. Parece que não saiu-se muito bem nessa parte.
Acabou caindo na rua do Triunfo. Ali trabalhou como assistente de montagem de
algumas pessoas, inclusive do Walter Wanny. Quando começou a montar não parou
mais. Montou filmes de praticamente todos os grandes diretores da Boca como Ody
Fraga (O Sexo Mora ao Lado), Cláudio Cunha (O Gosto do Pecado, Oh Rebuceteio!)
Jean Garrett (A Força dos Sentidos, Karina, A Mulher que Inventou o Amor, A
Noite do Amor Eterno), Fauzi Mansur (O Inseto do Amor), Walter Hugo Khouri
(Paixão Perdida, Amor Estranho Amor, Forever, Amor Voraz) e Luiz Castellini
(Tara-Prazeres Proibidos e A Reencarnação do Sexo). Mas parecia ter um carinho
todo especial para os filmes que montou de Reichenbach. Talvez sejam os
trabalhos mais representativos de Carlão como diretor: Amor, Palavra Prostituta
(1982), Extremos do Prazer (1984), Filme Demência (1986) e Anjos do Arrabalde
(1987).
Convidei
Eder pra dar seu depoimento para a série Papo de Boqueiro. Ele nem me
respondeu. Encontrei-o pela última vez na segunda-feira da semana passada numa
sessão de 30 anos do filme Um Pistoleiro Chamado Papaco de Mário Vaz Filho. Mais
uma vez me disse: “Estou aposentado, sossegado. Não vou te dar entrevista”,
disse meio rindo.
Eder foi um dos grandes técnicos da Boca. Um amigo me confidenciou: “Muita gente não gostava de montar com o Eder porque ele não fazia simplesmente o que o diretor queria. Tentava botar um traço autoral no seu trabalho”. Talvez por isso Eder não tenha sido tão chamado para trabalhar em seu ofício após o fim da Boca. Ele merecia ser mais lembrado. Mas vivemos no Brasil e vai ser difícil algum veículo da grande mídia lembrar dele. Triste.
Eder foi um dos grandes técnicos da Boca. Um amigo me confidenciou: “Muita gente não gostava de montar com o Eder porque ele não fazia simplesmente o que o diretor queria. Tentava botar um traço autoral no seu trabalho”. Talvez por isso Eder não tenha sido tão chamado para trabalhar em seu ofício após o fim da Boca. Ele merecia ser mais lembrado. Mas vivemos no Brasil e vai ser difícil algum veículo da grande mídia lembrar dele. Triste.
2 comentários:
Descobri esse texto hoje, tava lembrando do Eder e resolvi pesquisar por ele na internet. São poucos os registros, infelizmente. O seu é um dos melhores.
Nos últimos anos de vida ele trabalhava como diretor do Escritório de Fomento ao Cinema da Prefeitura de São Paulo, onde fui estagiário de setembro de 2015 a junho de 2017. Não lembro ao certo se era mesmo esse cargo, mas mantive contato com ele por alguns meses até ser injustamente demitido por superiores, em janeiro de 2016, poucos meses antes de morrer (no seu último dia ele fumou alguns cigarros, ali mesmo no escritório, com a janela toda aberta, já que sua mesa ficava perto dela - por algum motivo esse momento ficou marcado na minha cabeça e de certa forma acho graça). Lembro bem de quando soubemos do seu falecimento. Breu total. Era muito querido por todos naquela salinha pequena.
Poucas semanas depois fui assistir Filme Demência na Cinemateca de SP, em película, pela primeira vez. O primeiro nome que apareceu na tela foi o dele. De certa forma me senti homenageando ele, prestigiando seu trabalho como produtor e montador do Carlão.
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