segunda-feira, 26 de julho de 2021

Entrevistas Históricas da Sexy: Carlos Brickmann (agosto de 1998)

Carlinhos Malvadeza

 


Carlos Brickmann entende tanto de marketing político que conseguiu transformar Paulo Maluf num produto vendável. Tudo isso sem abrir mão do sarcasmo e da ironia, duas de suas raras características. No meio do fogo-cruzado eleitoral, SEXY foi conversar com quem realmente compreende essa bagunça

 

Se a campanha eleitoral fosse uma guerra (e não deixar de ser), Carlos Brickmann seria um general, e dos bons. Seu papel não se limita apenas ao de assessor de imprensa. Ele foi responsável, por exemplo, pela reformulação da imagem de Paulo Maluf, quando este vinha de duas derrotas seguidas nas urnas. A clareza de visão de Brickmann foi forjada nas redações de veículos como “Jornal da Tarde”, do qual foi um dos fundadores, e “Folha da Tarde”, em que era responsável pela implacável coluna do personagem Toninho Malvadeza. Brickmann, aliás, é conhecido por seu humor rápido e tiradas sarcásticas. Neste bate-papo com SEXY, ele fala de política, imagem, verdades e mentiras – além de contar alguns dos mais saborosos casos da imprensa. Na nossa mesa, a presença do jornalista Ruy Nogueira Netto, peça fundamental para a realização desta entrevista, com seu humor não menos sardônico. O charme fica por conta de Marli Gonçalves, uma espécie de braço direito de Brickmann (só que mais bonita do que o braço direito do jornalista em si) e da bela atriz Cátia Fontinelli. A seguir, entenda por que Carlinhos é considerado realmente um jornalista de peso.

 


Palmério Dória: Qual a diferença fundamental desta campanha, em termos de propaganda eleitoral?

Brickmann: É a propaganda do medo. “Se me tirarem daqui, vi virar um inferno, a moeda vai cair”. Essa é a propaganda do Fernando Henrique. E a do Lula também: “Se não me deixarem subir, vai ter um puta desemprego, vai chegar tua vez”.

Palmério: Como você prevê o andamento disso?

Brickmann: Acho que o Fernando Henrique ganha. Pode até ganhar no primeiro turno. A oposição não é mais só o Lula. Tem o Ciro Gomes. O Ciro é um cara capaz de criar muito problema.

Jeferson de Sousa: Você acha que o Ciro ainda sobe nas pesquisas?

Brickmann: Não, não. Ele vai subir, mas o problema não é ele agora. O problema vai ser depois, no segundo mandato do Fernando Henrique. Era isso que o Ruy Nogueira tava falando há pouco. Se olhar o Menen, você vai ter um retrato do Fernando Henrique.

Ruy Nogueira: O “Efeito Orloff”: a Argentina é o Brasil amanhã. Você acredita que se o candidato da oposição em vez do “sapo barbudo” do Lula fosse um candidato mais palatável para a classe média, o Fernando Henrique poderia perder a eleição?

Brickmann: Acho que sim. O problema é o seguinte: Quem? Você dá uma rodeada aí e não encontra ninguém. Esse é o problema. Vai ser quem? O Maluf? Antônio Carlos? Antônio Carlos podia até ser, mas não vai porque é aliado do Fernando Henrique.


Cátia Fontinelli: O Itamar não poderia ter sido?

Brickmann: Olha, o Itamar eu acho um grande mistério. O Itamar fez um governo em que só fez bobagem, e todas deram certo.

Palmério: Até o caso Lilian Ramos deu certo.

Brickmann: Exatamente. Só fez besteira e deu tudo certo. Então, o Itamar é um negócio que não se sabe bem o que é. De repente, ele ganha uma eleição. Agora, o Lula é aquela coisa que o Alex Periscinoto conta, né. Você chega ao aeroporto, o voo atrasado. Você vai na companhia aérea, no balcão, te atendem mal pra burro. Você chega ao avião, te tratam mal, não te dão comida, não te dão bebida, o avião tá sujo, poltrona balançando, o serviço de bordo é péssimo. Aí, levanta um passageiro e diz: “Essa companhia é uma merda!”. Todo mundo aplaude: “Esse voo é muito ruim!”. Mais aplausos. Aí o cara diz: “Quer saber de uma coisa? Vou lá na cabine pilotar essa merda!”. Aí todo mundo para, porque é outra coisa. Acho que nossos candidatos de oposição estão mais ou menos assim.

Ruy: Isso me faz lembrar uma história em Goiás, nos anos duros da ditadura. Um guri estava sendo torturado no Dops, que tinha uma janela que dava para uma calçada. E tava o menino lá, no pau-de-arara, levando uma surra terrível. Passa uma velhinha, põe a cabeça pra dentro e vê aquilo. Ele olha para o sargento que tava torturando e diz: “Era melhor matar do que fazer o pobrezinho sofrer tanto”. E o rapaz diz: “Velhinha filha da puta, deixa como está, que assim está ótimo”. (Risos).

Ruy: Agora, que os debates presidenciais estão se avizinhando, qual seria a pergunta cruel que você faria aos candidatos Enéas, Lula e Ciro?

Brickmann: Enéas também não, né? A única pergunta que eu faria para pro Enéas é quando ele vai cortar a barba. Não dá para falar sério com ele.

Ruy: Mas qual é a pergunta cruel?

Brickmann: Pro Enéas? Qual é o seu nome. Pro Fernando Henrique acho que o Boris Casoy já fez a pergunta cruel. Agora, tem uma que é o seguinte: ele quer ser reeleito pra quê?

Ruy: Ele vai responder que é para concluir a reforma.

Brickmann: Tudo bem. Mas não tem outro no partido que pudesse concluir a reforma? É tudo incompetente? E pro Lula, a pergunta é: o que ele faz no intervalo das campanhas.

Palmério: Vive do quê?

Brickmann: Bom, isso a gente sabe.

Palmério: Eu não sei, gostaria que você me dissesse.

Brickmann: Ele é aposentado, tem duas aposentadorias. Mora na casa do compadre. Mas a pergunta principal pro Lula é a seguinte: qual a atividade política que ele faz pro partido dele se fortalecer e pra ele se transformar num candidato viável?

Edson Aran: Pessoalmente também?

Brickmann: E pessoalmente quando é que ele vai parar de falar “menas”, por exemplo? É um negócio que ele já poderia ter feito, né? Deu tempo.

Ruy: Você acha que ele não é estudioso, não se prepara, não procura crescer intelectualmente?

Brickmann: Eu nunca vi o Lula com um livro na mão. Talvez por não ser íntimo dele.

Palmério: Acho que o Brizola lê muito mais do que ele, né?

Brickmann: O Brizola se preocupa muito com a educação. O Brizola, até por ter sido um autodidata, ele acha importante estudar. Esse é o detalhe da coisa.

Ruy: E para o Ciro, qual seria a pergunta cruel?

Brickmann: Quando o Fernando Henrique ficou ruim? Na hora em que não deixou ele ser candidato ou em outro momento? Até então ele achava o FHC maravilhoso.

Palmério: E ele se descobriu alguma coisa em Harvard.

Brickmann: Olha, existe uma velha frase do Barão de Itararé: “Diploma não encurta a orelha de ninguém”.

Ruy: Agora, uma coisa, Brickmann: a gente sabe que a grana o gato comeu na atual campanha. Então, como é que fica? A gente também sabe que o Duda Mendonça tem, digamos, um monopólio das campanhas...

Brickmann: São onze, né?

Palmério: É, onze.

Brickmann: Mais que a do Corinthians.

Palmério: Mais que a do Corinthians.

Brickmann: Mais a da Fiesp.

Palmério: Isso. Agora, o chamado mercado da democracia, como ficou agora?

Brickmann: O mercado da democracia é muito ruim. O pessoal tá sem dinheiro. E por que tá sem dinheiro? É um negócio engraçado. Os bancos brasileiros davam dinheiro para a campanha. Os bancos estrangeiros que compraram os bancos brasileiros não têm motivo nenhum, por enquanto, para dar dinheiro para a campanha. Você quer que a Arapuã dê dinheiro para a campanha? A Casa Centro? Não, não dão. Então, aí acabou o dinheiro da campanha. As empreiteiras não têm obra, não recebem, e se elas recebem, também não dão.

Ruy: O dinheiro do precatório foi para financiar campanha?

Brickmann: Não sei. Saber, não sei. Agora, o fato é que sem o dinheiro do precatório as campanhas estão pobres.

Aran: Você acha que o próprio escândalo do precatório não tirou da praça também?

Brickmann: Acho.

Ruy: Mas o tutu está saindo de algum lugar. De onde está saindo?

Brickmann: Está saindo do lugar de sempre.

Ruy: Por exemplo?

Brickmann: Dos que sobraram. Só que o rio é muito menor.

Ruy: Se amanhã você fosse candidato, você ia escolher Duda Mendonça ou Nizan Guanaes para fazer sua campanha?

Brickmann: Se amanhã eu fosse candidato, eu escolheria o Instituto de Psiquiatria da USP, pra me prender com uma camisa-de-força.


Ruy: Mas, hipoteticamente?

Brickmann: Olha, o Duda tem algumas campanhas vitoriosas muito complicadas e também perdeu muita campanha. O Nizan, pelo que ele disse, essa é a primeira campanha que ele vai fazer, que as outras quem fazia era o Geraldo Walter. Então, agora é uma chance de a gente verificar como é que ele é em campanha.

Ruy: E o Duda?

Brickmann: Também é brilhante.

Ruy: Ser tivesse que bater um papo e convidar um dos dois para tomar um chopinho, qual dos dois você convidava?

Brickmann: O Nizan. Veja bem: pra você conversar com o Duda precisa conhecer algumas coisas.

Ruy: Briga de galo?

Brickmann: Briga de galo é uma delas. Ele é o rei da briga de galo. Ele tem uma manada de galos...Como é que chama conjunto de galos? Sei lá (Risos).

Ruy: O Duda jamais faria campanha para o Jânio Quadros, o homem que proibiu a briga de galos no Brasil.

Brickmann: O Duda paga caríssimo por galos de boa qualidade. Ele tem um fantástico galinheiro.

Ruy: Plantel.

Brickmann: Não, não. Galinheiro. Veja bem: não é o conteúdo, é o contingente. Ele tem uma rinha.

Jeferson: Ele é uma espécie de Don King dos galos. (Risos)

Brickmann: Ele é muito bom de galo.

Palmério: Você acha que o galo mais fraco que ele treinou pra luta foi o Celso Pitta?

Brickmann: O Celso Pitta é um galo excelente. Só não é excelente prefeito, coitadinho...

Ruy: O Duda se declarou decepcionado com a administração dele e perdeu a conta da prefeitura. O Duda foi sincero e foi castigado.

Brickmann: Mas publicitário é sincero? Você veja: publicitário que tem conta da Pepsi-Cola não pode beber Coca, por mais que ele goste. Então, você tem que separar as coisas, né?

Ruy: Você, quando fez campanha, agiu com sinceridade ou foi pago?

Brickmann: Eu não era publicitário. Eu era assessor de imprensa e agi com toda a sinceridade possível. Agora, você tem a sinceridade possível ao jornalista, que não é absoluta. Outro dia eu estava participando de um debate com um rapaz da Globo que veio com essa conversa de que assessor de imprensa não busca a verdade e o jornalista de redação busca. Aí, perguntei pra ele: nos dez anos de “Globo, quantas vezes você falou mal do dr. Roberto Marinho?

Ruy: Nenhuma.

Brickmann: Nenhuma. Quantas vezes ele falou mal do Roberto Irineu? Nenhuma. E quantas vezes você falou mal da geleia de mocotó Embasa?

Ruy: Para quem sabe, a Embasa é do Roberto Marinho.

Brickmann: É. Assim eu também sei ser sincero! Aí, ele disse: “Um jornalista de assessoria de imprensa cria fatos que não são os que estão sendo discutidos, enquanto o jornalista de redação só trata dos fatos que estão sendo discutidos”. Aí lembrei pra ele aquele maravilhoso exemplo da Miss Globo. Ninguém jamais viu turfe no “Jornal Nacional”, a não ser quando o Dr. Roberto comprou uma égua chamada Miss Globo. Lá em Belém do Pará ninguém sabia quem era Miss Globo e passou a saber. E lembrei aquele caso maravilhoso do Estadão, na época em que o Palmério trabalhava lá. Era no tempo em que futebol ainda era chamado de “esporte bretão”. (Risos)

Ruy: E o ídolo era aquele jogador que morreu louco: Heleno de Freitas, o “Gilda”. (Risos)

Brickmann: O Carlão Mesquita, que era um aficionado por cavalos, tinha o Haras Nogueira. Uma vez ele botou um cavalo chamado Maroto, e todo dia toca matéria do Maroto no jornal. Eu não entendo nada. Aliás, pra mim, o sujeito que consegue distinguir um cavalo do outro é um gênio. Aí eu cheguei lá e disse o seguinte: esse cavalo é bom mesmo ou é cavalo do patrão? E ele disse: “o cavalo é bom mesmo”. Aí, bota lá matéria do Maroto. Na época eram oito colunas. Aí veio o Grande Prêmio Brasil, em São Paulo. E o título era o seguinte: “House of Hills chega em primeiro e Maroto em décimo segundo”. (Risos) O título já era engraçado por si só, mas, como eu não entendo nada de cavalos, fui lá a perguntei: “Quantos cavalos correm?”. E me disseram: “Treze”. Então, você veja o seguinte: a sinceridade de um jornalista tem limite. A sinceridade do nosso pessoal de lá tinha o limite de não dizer que o Maroto era pangaré.

Palmério: Mas, apesar de você dizer que desconhece turf, você descreveu o ex-presidente Costa e Silva em uma narração no hipódromo e quase foi em cana.

Brickmann: Deu um trabalho, rapaz! Quase fui em cana. O Costa e Silva fez a gentileza de descer de helicóptero no meio do Hipódromo. Aí me deu a ideia de fazer uma narrativa da chegada dele em linguagem turfística. Mas tem um segredo esse negócio: eu anotei, fui marcando, como se fosse uma corrida de cavalo. Fui lá para o jornal e levantei a linguagem turfística, aprendi os nomes e tal, e narrei a chegada nessa linguagem. O Costa e Silva tinha fama de burro. Fama, aliás, extremamente merecida. Depois, o Luiz Ernesto Kawall, que era assessor de imprensa do Sodré, ficou percorrendo os quarteis para não me levarem pra cadeia. Parece que ele argumentou que ia sair muito caro me alimentar. (Risos)

Palmério: Mais três meses e você pegava o AI-5 e aí estava frito e esfarinhado.

Brickmann: Mais três meses e eu estaria que nem a história do menino de Goiás: deixa como está que está bom.

Ruy: A gente sabe que o Carlinhos é um assessor que sempre acaba fazendo a cabeça dos candidatos. Vou dar um exemplo: a campanha de 89, quando o Maluf saiu candidato tendo perdido a Presidência em 85 e a prefeitura para a Erundina em 88. Em 89 pintou uma campanha para limpar a barra. Foi uma campanha vistosa em que ele apresentou uma figura simpática. Se mostrou piadista. E o Carlinhos fez três coisas que marcaram: Primeiro, inventou uma viagem do Maluf para a Bolívia para conhecer um programa de combate à inflação. Depois, inventou uma visita ao presidente Ronald Reagan que tinha acabado de deixar o poder. A sua parte foi ótima, a do Reagan foi péssima porque ele não se deixou fotografar. E a terceira coisa foi quando em um debate, o Carlinhos fez um comentário jocoso mas carinhoso sobre o Maluf. O deputado Aloísio Mercadante saiu do estúdio dizendo que o Carlos Brickmann tinha dito que o Maluf era competente porque competia, competia, competia sempre. Você é marqueteiro, cara! Você não pode negar isso.

Brickmann: Não, não é verdade. O que fiz foi comunicação, só isso. Quer dizer: como é que você faz uma notícia chegar à opinião pública?

Ruy: Carlinhos, agora eu quero saber como é que você com esses 150 quilos...

Brickmann: Eu emagreci, é?

Ruy:...Como você desembarcando em La Paz, onde até Urubu tem dor de cabeça, com o Maluf para mostrar que é se acaba com a inflação. Como é que surgem essas ideias?

Brickmann: Vou te dizer uma coisa: essa viagem para La Paz foi excelente.


Ruy: É, na Bolívia o Maluf acerta. O problema é no Brasil...

Brickmann: Olha, no Brasil o negócio do Pitta é que foi um azar desgraçado. O Maluf tava com a eleição garantida para governador.

Palmério: Você acha que enterrara caveira de burro na grande área?

Brickmann: Enterraram sapo. Sapo costurado.

Ruy: O Pitta foi azar mesmo foi algo mal planejado, um sujeito sem preparo para assumir um cargo importante?

Brickmann: Como assim? Ele não tem preparo mesmo. Isso é visível.

Ruy: Porque o Pitta sempre foi um brilhante executivo. Por onde passou deixou uma imagem de competência e trabalho, na Eternit, como secretário de finanças...

Brickmann: Porque mandavam nele.

Ruy: Você não acha que ele é administrador da massa falida do Maluf e está levando a culpa?

Brickmann: Acho que não.

Ruy: Mas é o caso de um homem negro, que, em um país sabidamente racista, fez uma carreira acadêmica brilhante, conseguiu chegar à prefeitura como razoável candidato, razoável pra bom.

Brickmann: É, mas você falou a coisa correta: ele fez uma carreira acadêmica brilhante. E a gente vê várias carreiras brilhantes que não deram em nada.

Palmério: Inclusive em Brasília. (Risos)

Brickmann: É. Mas veja: antes de lançar o Pitta, o Maluf tentou ser reeleito. É isso que o pessoal esquece. O Maluf fez campanha pra ser reeleito. O Fernando Henrique tinha prometido a ele, fez toda uma negociação...Se ele queria ser reeleito é porque a situação não estava tão ruim assim, concorda? E eu acredito que a cidade de São Paulo, dois anos depois que estivesse quebrada, já estaria erguida de novo.

Ruy: Você tem um livro fabuloso intitulado “A Vida É um Palanque”. Quero saber quem faz feio e quem faz bonito neste palanque. Vou dizer os nomes para você: Fernando Henrique.

Brickmann: Faz bonito, rapaz.

Ruy: Paulo Maluf.

Brickmann: Também.

Ruy: Orestes Quércia.

Brickmann: Fez muito bonito e agora está sem fôlego para subir no palanque.

Ruy: Lula faz bonito ou faz feio?

Brickmann: Acho que faz feio.

Ruy: Engenheiro Leonel Brizola.

Brickmann: Faz bonito.

Ruy: Sr. Mário Covas.

Brickmann: No palanque legislativo ele fez bonito. No executivo estou esperando ele subir pra ver o que ele faz.

Ruy: Francisco Rossi.

Brickmann: Ainda não fez.

Ruy: Itamar Franco.

Brickmann: O Itamar não se elegeu. Ele não foi ao palanque, ele foi vice.

Ruy: Você acha que em Minas, agora, ele vai fazer feio ou vai fazer bonito?

Brickmann: Olha, sobre o Itamar eu nunca respondo. Ele é aquela coisa maluca. Ele é o nosso Forrest Gump, aquele cara que só faz bobagem e dá certo.

Ruy: José Sarney faz feio ou bonito?

Brickmann: Feio, né?

Ruy: Roberto Requião.

Brickmann: Feio.

Ruy: Fernando Collor.

Brickmann: Fez feio. Começou bonito e depois afundou. Também, cada nome que esse sujeito me arruma, heim!

Ruy: Você quer que eu cite quem? A Mãe Dinah? (Risos)

Palmério: Você trabalha de graça?

Brickmann: Eu acho que o trabalho é uma maldição bíblica. Quando Deus expulsou Adão e Eva do Jardim do Éden, uma das coisas que ele determinou foi: “Ganharás o pão com o suor do seu rosto”. Então, acho que você gastar o suor do rosto sem ganhar o opção é pecado.

Palmério: Você ficou rico?

Brickmann: Rico?

Palmério: Sim.

Brickmann: Lá fora está parada uma perua 96, nós estamos em 98. E eu gosto de carro bom.

Ruy: Tem uma história que você gosta muito na vida mundana. Você ganha muito, mas gasta muito também. É verdade?

Brickmann: Vida mundana?

Ruy: É. Não vou ser mais explícito porque dona Berta vai ler esta entrevista. (Risos).

Brickmann: Eu não tenho chance de gastar, não dá tempo de gastar com essas coisas. Mulher boa é mulher de graça – na verdade, é caríssimo. Você sabe que a trepada gratuita é a mais cara que existe no mundo? Se paga sempre.

Palmério: Você trabalhou com uma grande geração de jornalistas no “Jornal da Tarde”. Como era a convivência com a censura? O “JT” era um projeto ambicioso em plena ditadura, em pleno sufoco de liberdade de imprensa. Como era o censor dentro da redação? Ficou amigo de algum...

Brickmann: Não. Não era tolerável. A gente não tolerava o censor, ele estava lá dentro. O que não seria tolerável era alguém fazer amizade com ele.

Aran: Eram sempre os mesmos?

Brickmann: Sempre os mesmos.

Aran: Você se lembra deles?

Brickmann: Olha, eu lembro que tinha um maluco chamado Leonardo e puseram na cabeça dele que ele precisava tomar muito cuidado, porque o pessoal do “JT” era muito hábil, então poderiam contrabandear coisas e ele não perceber. Então, o que ele fazia? Ele proibiu o nome “Leonardo”. Você falava o nome “Leonardo” e ele cortava.

Aran: O Leonardo DiCaprio estava fodido!

Palmério: E o Leandro e Leonardo.

Cátia Fontinelli: O Leonardo da Seleção.

Brickmann: Ele cortava todos. Era um negócio maluco, um negócio realmente de louco! Era muito chato trabalhar. A gente aprendeu uma coisa: teu padrão aguenta algum tempo te mandar fazer uma reportagem e gastar uma nota, a reportagem chegar e ser vetada. Daqui a algum tempo, ele olha e pensa, “por que eu vou gastar se não vai sair mesmo?”

Palmério: Qual foi a matéria que firmou o “JT” como um grande jornal?

Brickmann: O primeiro número.

Palmério: Começou com o sucesso?

Brickmann: Começou. Aliás, foi bem um jornal brasileiro. Descobrimos que o Pelé ia casar no Carnaval e demos em primeira mão, com foto de capa. Acontece que a foto da noiva era errada.

Marli: Quem era a coitada?

Brickmann: A irmã da noiva. (Risos). É bem o “JT” até hoje.

Palmério: Tem sempre uma cunhada na história.

Brickmann: Não! O Pedro Collor vem mais tarde. (Risos)

Ruy: Você foi para a “Folha da Tarde” em 84 como editor. Era diferente do “JT”, onde você ia para a rua.

Brickmann: Era muito mais gostoso ficar na rua, né? Na “FT” eu ficava plantado dentro da redação.

Ruy: Pensando maldades.

Brickmann: Não havia possibilidade de fazer matérias, nem pelo jornal. A sua chance era receber matéria pronta da “Folha de S. Paulo” e aí tentar trabalhar isso. Não tem graça.

Ruy: Você comprou a briga do jornal com o Jânio?

Brickmann: Fui eu.

Ruy: Você deu um jantar pro Jânio na sua casa e seu filho bateu nele...

Brickmann: Almoço.

Ruy: E o Jânio se apaixonou por ele. (Risos)

Brickmann: É. O Jânio chegou muito cedo em casa e não tinha ninguém, só meu filho de 3 anos, absolutamente bruto. Se ele te mostrasse uma coisa e você não olhasse, ele te dava uns tapas na cara para te colocar no lugar. E ele tava lá, dando uns tapinhas no Jânio. Os dois cercados de medo.

Ruy: O Jânio estava sentado no chão?

Brickmann: Não, no sofá. Mas ele disse uma coisa interessante. Ele não teve tempo de brincar com a filha dele. Então, ele gostava de criança, gostava muito e tinha pouca chance pra brincar.

Ruy: Você pegou umas boas brigas com o Jânio, né?

Brickmann: Mas essas brigas com o Jânio eram brigas que na verdade interessavam para os dois lados. A gente se firmava como jornal. A “FT” teve uma fase de jornal da polícia. Então, quando eu e o Adilson Laranjeira fomos pra lá, o pessoal dizia brincando que íamos para diminuir a tiragem. Ou seja, mandar os tiras embora. (Risos)

Jeferson: E em 84 ainda tinha esses tipos?

Brickmann: Tinha gente lá que sentava para escrever e punha o revólver em cima da mesa como você põe o cigarro. Mas, naquela altura, o jornal tinha desempenhado sua função útil para a empresa durante a época de ditadura mais brava. O jornal ficou desposicionado. Ele não falava mais pra ninguém.

Ruy: Mas ele poderia ter sido o jornal da cidade.

Brickmann: Pois é. Foi colocado um esquadrão para fazer um jornal de cidade, o que acabou não sendo possível. Ele tinha suas fumaças de jornal da cidade. Como eu disse, a história do Jânio servia para os dois: o Jânio tinha um jornal identificado pra malhar, ele não precisava malhar a imprensa. E a gente tascava o cacete nele pra ser o jornal da cidade.

Palmério: Foi para fugir do tédio que nasceu o Toninho Malvadeza na “FT”?

Brickmann: Toninho Malvadeza era uma sátira a todos os colunistas. Era para comentar coisas que não dá pra você deixar passar. Por exemplo, o Walter Feldman deu uma declaração dizendo que o Covas deixou o governo para concorrer à reeleição porque ele não consegue fazer duas coisas ao mesmo tempo. (Risos) Meu Deus, gente! O Lindon Johnson falou isso de um adversário e eu achei maldade demais. Aqui é um aliado falando isso como se fosse elogio! Então, o Toninho Malvadeza nasceu para comentar coisas desse tipo.

Ruy: E pra presidente, você vai votar em quem?

Brickmann: No Fernando Henrique.

Ruy: Fazendo um exercício de futurologia, se o Fernando Henrique for reeleito, quem deverão ser os candidatos pós-sucessão?

Brickmann: Fernando Henrique! Acho que ele inventa um parlamentarismo, alguma coisa. Ele gostou de lá, ele gosta daquela casa, ele gosta daquele jardim, daqueles guardas...Além do que, ele adora viajar, adora Paris.

Palmério: Ele é um novo presidente bossa nova?

Ruy: Sem o charme do Juscelino.

Brickmann: Acho até que ele tem um certo charme também. Mas não é o do Juscelino.

Palmério: Quem é o melhor colunista do Brasil, Joyce Pascowitch ou César Giobbi?

Brickmann: Ricardo Boechat.

Palmério: Cartunista.

Brickmann: Millôr.

Ruy: Você curte o personagem Carlos Brickmann como o Jânio curtia o personagem Jânio Quadros?

Brickmann: Eu não sou personagem. Eu sou eu. Gosto de ser eu. Talvez uns 90 ou 100 quilos mais magro.

Ruy: Você fez troca-troca no colégio?

Brickmann: Não. Eu era excessivamente tímido.

Marli: Sempre digo que os problemas dele são decorrência disso.

Ruy: Vem daí o fato de você proteger coleguinhas gays?

Brickmann: Nunca protegi coleguinhas gays, é que eu não reconheço sexualidade em competência. Você tem que escolher o jornalista pela cabeça dele, não pela bunda. O grande problema é que muita gente escolhe pela bunda mesmo.

Ruy: Nisso você leva vantagem: tem uma bunda imensa (gargalhadas). Profissionalmente não é um bundão, mas fisicamente...Aliás, o dr. Roberto Marinho dizia que não existe balé sem viado nem redação sem comunista. É verdade?

Brickmann: É verdade. Só que hoje não é comunista, é petista. O que é uma queda de qualidade. Os comunistas eram obrigados a estudar. O petista basta falar mais ou menos assim (imita alguém na língua presa) que você já sabe que ele fez aquele curso de fonoaudiologia com a Marta Suplicy e o Vicentinho.

Ruy: O que você achou da presença da Marta Suplicy e do Vicentinho no alto de um trio elétrico durante a parada do orgulho gay?

Brickmann: A Marta tudo bem, ela é candidata, fez uma lei sobre isso e tal. Agora, o Vicentinho, eu não sei o que os metalúrgicos acharam. Se você fizer uma pesquisa no Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, o que vão dizer do Vicentinho?


Ruy: Mas vamos terminar à la Marília Gabriela: Carlos Brickmann por Carlos Brickmann.

Brickmann: Em primeiro lugar, eu não posso me olhar no espelho por falta de espelho. Como eu disse uma vez na “Folha”, eu não posso usar roupa maior do que meu número porque não tem. Embora eu sempre diga que não sou gordo, sou baixo. Estou com o peso exato para 2,40 m de altura.

Publicado originalmente na revista “Sexy” em agosto de 1998




Chamada de capa da revista "Sexy" de agosto de 1998 


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