quarta-feira, 2 de agosto de 2023

GAÚCHO: 78 ANOS DE VIDA E QUASE 78 LONGAS-METRAGENS NO CURRÍCULO

 





Por Matheus Trunk

 

Hoje, dia 2 de agosto, o diretor de fotografia Virgílio Roveda, o Gaúcho (1945-) completa 78 anos de vida. Para celebrar essa data irei colocar um episódio que ele testemunhou na sua vida em mais de 57 anos de vida profissional, iniciada no longa-metragem “O Diabo de Vila Velha” (1966) de José Mojica Marins, o Zé do Caixão, onde trabalhou como figurante. Seu último longa-metragem como técnico foi “Sete Cidades e Uma Vida Inglesa” (2022), no episódio dirigido por Diomédio Piskator, no qual fez a direção de fotografia. São mais de 70 longas-metragens no currículo nas mais diferentes funções: diretor de fotografia, foquista, operador de câmera, diretor de produção, fotógrafo de cena (still), assistente de câmera, operador de segunda unidade, produtor, eletricista, assistente de direção, maquinista, figurante, entrevistado em documentários...

 

Em 1969, o cineasta Anselmo Duarte ficou interessado em assistir ao filme “Meu Nome É Tonho”, de Ozualdo Candeias. Roveda trabalhou na produção do longa-metragem e também atuava no escritório do produtor Augusto Cervantes. A sessão foi feita num dia de semana no Cine Santa Inês, cinema de bairro localizado na zona norte de São Paulo. Candeias, Anselmo, Gaúcho e alguns colegas assistiram ao longa-metragem. Anselmo gostou bastante o filme. Depois da exibição, todos concordaram que o melhor era tomar uma cerveja numa padaria próxima. Menos Gaúcho. Ele queria ir embora o quanto antes. O técnico tinha que levar a cópia até o filme do escritório de Cervantes na Boca. De lá, iria seguir para seu apartamento localizado na Baixada do Glicério, zona central de São Paulo. Mas os papos se prolongaram durante muito tempo. Galã de produtoras como a Atlântida e a Vera Cruz, Anselmo desembestou a contar todas as suas proezas na Europa, onde morou durante anos e havia recebido a Palma de Ouro em Cannes, pelo filme “O Pagador de Promessas” (1962). Chegou um horário em que os ônibus pararam de passar. Gaúcho teve que esperar o dia clarear para prosseguir seu caminho. “O Anselmo sabia muito de cinema. Não pelo lado teórico, mas pela prática que ele tinha desde os anos 1950”, resume Roveda. Depois do papo noturno, Virgílio Roveda voltou para a Boca no jipe DKW Candango, dirigido pelo amigo Candeias, que estava um tanto alto. “Nossa sorte foi que todos os anjos da guarda trabalharam bastante naquele dia. Impediram qualquer coisa de errado acontecesse com a gente”. A cópia foi entregue de manhã para Cervantes, produtor do filme que depois se tornaria um dos mais renomados produtores do cinema paulista do período. Sua produtora, a Masp Filme, tornou-se referência dentro cinema da Boca em produções com orçamentos mais enxutos e que muitas vezes chegavam a ganhar a atenção dos críticos. “Augusto de Cervantes começou com o Mojica e foi se tornando um grande produtor com o tempo. Foi aos poucos”, confessa Gaúcho. “Mas ele era espanhol e quando ficava nervoso começava a arrancar os pelos dos bigodes com os dedos”. Foi isso que aconteceu naquela manhã de 1969 quando Roveda chegou no escritório de Cervantes com a cópia de “Meu Nome É Tonho” debaixo do braço um tanto atrasado. Culpa das fantásticas histórias de Anselmo Duarte, o único diretor que trouxe a Palma de Ouro para o cinema brasileiro. “O Anselmo e o Candeias se davam muito bem. Aliás, todo mundo gostava do Anselmo, ele era excelente profissional, muito engraçado e cheio das histórias”. “O Pagador de Promessas” foi produzido pelo produtor Oswaldo Massaini (1919-1994), cujo escritório ficava (e ainda fica em 2023) na rua do Triunfo, na Boca paulista. “Pode parecer bobagem. Mas até hoje, o único cinema que deu a Palma de Ouro para o cinema brasileiro foi uma produção da Boca. Foi o Anselmo. Não foi o cinema da Embrafilme, que era tido como o oficial. Nem de outras áreas do Brasil. Isso ainda causa muita inveja no meio. O Anselmo ficou muito marcado com isso”, sintetiza Gaúcho, lembrando do antigo colega com afeto e respeito.

 

Mais histórias de Gaúcho, Candeias, Anselmo, Mojica, Mazzaropi e outros personagens do cinema paulista no meu livro “O Coringa do Cinema” (2013) publicado na editora Giostri e no documentário de longa-metragem “O Coringa do Cinema” (2019), dirigido por Sérgio Kieling, produzido pela IMG Content e Aruanda Filmes.


Nenhum comentário: