Por Matheus Trunk
Hoje, dia 2 de agosto, o
diretor de fotografia Virgílio Roveda, o Gaúcho (1945-) completa 78 anos de
vida. Para celebrar essa data irei colocar um episódio que ele testemunhou na
sua vida em mais de 57 anos de vida profissional, iniciada no longa-metragem “O
Diabo de Vila Velha” (1966) de José Mojica Marins, o Zé do Caixão, onde
trabalhou como figurante. Seu último longa-metragem como técnico foi “Sete
Cidades e Uma Vida Inglesa” (2022), no episódio dirigido por Diomédio
Piskator, no qual fez a direção de fotografia. São mais de 70 longas-metragens
no currículo nas mais diferentes funções: diretor de fotografia, foquista,
operador de câmera, diretor de produção, fotógrafo de cena (still),
assistente de câmera, operador de segunda unidade, produtor, eletricista,
assistente de direção, maquinista, figurante, entrevistado em documentários...
Em 1969, o cineasta
Anselmo Duarte ficou interessado em assistir ao filme “Meu Nome É Tonho”,
de Ozualdo Candeias. Roveda trabalhou na produção do longa-metragem e também
atuava no escritório do produtor Augusto Cervantes. A sessão foi feita num dia
de semana no Cine Santa Inês, cinema de bairro localizado na zona norte de São
Paulo. Candeias, Anselmo, Gaúcho e alguns colegas assistiram ao longa-metragem.
Anselmo gostou bastante o filme. Depois da exibição, todos concordaram que o
melhor era tomar uma cerveja numa padaria próxima. Menos Gaúcho. Ele queria ir
embora o quanto antes. O técnico tinha que levar a cópia até o filme do
escritório de Cervantes na Boca. De lá, iria seguir para seu apartamento
localizado na Baixada do Glicério, zona central de São Paulo. Mas os papos se
prolongaram durante muito tempo. Galã de produtoras como a Atlântida e a Vera
Cruz, Anselmo desembestou a contar todas as suas proezas na Europa, onde morou
durante anos e havia recebido a Palma de Ouro em Cannes, pelo filme “O
Pagador de Promessas” (1962). Chegou um horário em que os ônibus pararam de
passar. Gaúcho teve que esperar o dia clarear para prosseguir seu caminho. “O
Anselmo sabia muito de cinema. Não pelo lado teórico, mas pela prática que ele
tinha desde os anos 1950”, resume Roveda. Depois do papo noturno, Virgílio
Roveda voltou para a Boca no jipe DKW Candango, dirigido pelo amigo Candeias,
que estava um tanto alto. “Nossa sorte foi que todos os anjos da guarda
trabalharam bastante naquele dia. Impediram qualquer coisa de errado
acontecesse com a gente”. A cópia foi entregue de manhã para Cervantes, produtor
do filme que depois se tornaria um dos mais renomados produtores do cinema
paulista do período. Sua produtora, a Masp Filme, tornou-se referência dentro
cinema da Boca em produções com orçamentos mais enxutos e que muitas vezes
chegavam a ganhar a atenção dos críticos. “Augusto de Cervantes começou com o
Mojica e foi se tornando um grande produtor com o tempo. Foi aos poucos”,
confessa Gaúcho. “Mas ele era espanhol e quando ficava nervoso começava a
arrancar os pelos dos bigodes com os dedos”. Foi isso que aconteceu naquela
manhã de 1969 quando Roveda chegou no escritório de Cervantes com a cópia de “Meu
Nome É Tonho” debaixo do braço um tanto atrasado. Culpa das fantásticas
histórias de Anselmo Duarte, o único diretor que trouxe a Palma de Ouro para o
cinema brasileiro. “O Anselmo e o Candeias se davam muito bem. Aliás, todo
mundo gostava do Anselmo, ele era excelente profissional, muito engraçado e
cheio das histórias”. “O Pagador de Promessas” foi produzido pelo
produtor Oswaldo Massaini (1919-1994), cujo escritório ficava (e ainda fica em
2023) na rua do Triunfo, na Boca paulista. “Pode parecer bobagem. Mas até hoje,
o único cinema que deu a Palma de Ouro para o cinema brasileiro foi uma
produção da Boca. Foi o Anselmo. Não foi o cinema da Embrafilme, que era tido
como o oficial. Nem de outras áreas do Brasil. Isso ainda causa muita inveja no
meio. O Anselmo ficou muito marcado com isso”, sintetiza Gaúcho, lembrando do
antigo colega com afeto e respeito.
Mais histórias de Gaúcho,
Candeias, Anselmo, Mojica, Mazzaropi e outros personagens do cinema paulista no
meu livro “O Coringa do Cinema” (2013) publicado na
editora Giostri e no documentário de longa-metragem “O Coringa do Cinema”
(2019), dirigido por Sérgio Kieling, produzido pela IMG Content e Aruanda
Filmes.
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