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quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

DE OLHO NA BOCA: Jean Garrett

DE OLHO NA BOCA

A história de uma carreira


Por Jotta Santana

Em tempos em que o Cine República ainda era uma realidade e não apenas uma lembrança na saudade da gente, um título de filme em cartaz nos chamou a atenção com força suficiente para que o assistíssemos. Talvez até pelo mesmo motivo de conservação crítica que leva cada brasileiro a ver os filmes nacionais e depois comentar que “desse jeito a coisa não vai mesmo”. O filme era “Amadas e Violentadas” e nos causou uma reação absolutamente inusitada saímos do cinema com uma leve sensação de haver cometido uma injustiça no julgamento precipitado e preconceituoso. O filme, apesar de tudo, tinha muito bons momentos, tinha méritos inegáveis, tinha a marca de uma direção segura e inventiva. E nós começamos a marcar o nome do diretor e seguir a sua carreira. A primeira e boa impressão que Jean Garrett nos causou só foi reforçada desde então. Mas a história desse diretor e seu envolvimento com a arte cinematográfica, começaram muito antes. Começaram, por exemplo, na sua atividade como fotógrafo profissional lá na Ilha das Flores, no Arquipélago dos Açores, terra que o viu nascer. Condição que, chegando ao Brasil, levou-o à montagem de um estúdio fotográfico onde fez moda, publicidade, fotos industriais e novelas. Daí chegou à editoria e na revista Melodias produziu, fotografou e dirigiu fotonovelas durante dois anos, tendo como objetivo a cinematografia. Em seguida na Editora Saber, coordenou e dirigiu a revista Jovem-Sex, uma das primeiras especializadas em cinema e que foi retirada de circulação pela Censura. Nessa época Jean Garrett já havia ingressado definitivamente no cinema e com o fechamento da revista passou a se dedicar integralmente ao meio que o atraia. Como intérprete trabalhou com José Mojica Marins fazendo filmes e gravou tapes especiais para a TV Bandeirantes e para a TV Tupi. Depois criou um grupo de teatro fazendo uma turnée pelo interior paulista com a peça “Os Mortos Também Se Vingam”, exercendo as funções de intérprete e maquiador. De volta a São Paulo, o cinema passou a ocupar todo o seu tempo. Trabalhou como fotógrafo de still, cenógrafo, contra-regra e assistente de direção para profissionais como Ody Fraga, Ozualdo Candeias, Fauzi Mansur e Rubens da Silva Prado, além de José Mojica Marins. Foi trabalhando em “Sedução”, em 1974, que David Cardoso, ator principal e produtor recebeu suas qualidades de diretor. E o filme “A Ilha do Desejo” iniciou sua carreira como diretor. A filmografia de Jean Garrett incluí trabalhos muito importantes dentro do cenário cinematográfico brasileiro: 1968- “Trilogia do Terror”- episódio “Pesadelo Macabro”, direção de José Mojica Marins- função de Jean: cenógrafo e intérprete: 1969- “O Estanho Mundo do Zé do Caixão”- direção de José Mojica Marins – funções de Jean: intérprete e contrarregra: nesse mesmo ano faz também “Meu Nome é Tonho”, direção de Ozualdo Candeias, na função de intérprete; 1970- “Sangue em Santa Maria” – dirigido pelo Rubens da Silva Prado, na função de intérprete; 1971- “Gringo, o Matador Erótico” dirigido por Tony Vieira, na função de intérprete; ainda esse ano – “Sinal Vermelho: As Fêmeas” – dirigido por Fauzi Mansur, nas funções de fotógrafo still e intérprete; 1973- “A Noite do Desejo” – dirigido por Fauzi Mansur, nas funções de fotógrafo, still e assistente de direção; 1974- “Sedução” – dirigido por Fauzi Mansur, nas funções de fotógrafo still e assistente de direção: ainda nesse ano – “Adultério, As Regras do Jogo” – dirigido por Ody Fraga, nas funções de fotógrafo still e assistente de direção; ainda esse ano – “A Ilha do Desejo” – como responsável pelo argumento, roteiro e direção; 1975- “Amadas e Violentadas”– argumento, roteiro e direção; 1976- “Possuídas Pelo Pecado” – argumento e direção; ainda nesse ano – Excitação – argumento e direção; 1978- “Noite em Chamas” – argumento, roteiro e direção; ainda nesse ano – “Mulher, Mulher” – argumento, roteiro e direção; 1979- “A Força dos Sentidos” – argumento, roteiro e direção.



Publicado originalmente no jornal "Notícias Populares" em 13 de setembro de 1979

segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Papo de Boqueiro com Rubens da Silva Prado

O cineasta, ator e produtor Rubens da Silva Prado (São Paulo, SP, 20/12/1945-) recorda seus faroestes mais representativos como "Gregório 38" (1968), "Sangue em Santa Maria" (1972) e "A Vingança de Chico Mineiro" (1978). Ele fala das dificuldades de fazer cinema e de sua suposta rivalidade com Tony Vieira.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Entrevista com Afonso Brazza publicada em 2002


Afonso Brazza
José Afonso Filho
(São João do Piauí, PI, 17/04/1955-  29/07/2003, Gama, DF)
Gringo não perdoa, mata, 1994
No eixo da morte, 1995

Por Caio Plessman de Castro

Nasci em São João do Piauí e vim para Brasília garotinho. Meu pai ajudou a construir esta cidade. Foi candango. Somos o sangue de Brasília. Tenho um respeito muito grande por essa capital. Eu a vi crescer.

O início da minha carreira foi sofrido. Arrumei minha malinha em 1970 e fui-me embora para São Paulo, onde conheci muitos artistas, Zé do Caixão (José Mojica Marins), David Cardoso, Tarcísio Meira, Tony Vieira, Alex Prado e Ozualdo Candeias. Nesse período, entre 1970 e 1980, aprendi muita coisa sobre cinema, trabalhei como ator, figurante e técnico, fazia cenário, montagem. Tudo que aprendi em São Paulo trouxe para Brasília, e é isso que estou fazendo até hoje.

O que me fez sair de Brasília e ir a São Paulo foi um filme que vi em 1969, chamado Gringo, o último matador, com Tony Vieira, Claudete Joubert e outros, um faroeste muito bom. Assisti a esse filme mais de 20 vezes. Esse faroeste me impressionou tanto, que me fez arrumar as malas e ir embora para São Paulo. Fiquei também atraído pela atriz do filme, Claudete Joubert, atualmente minha esposa. Em São Paulo, a minha escola de arte dramática foi José Mojica Marins. Devo um grande favor a ele, foi a primeira pessoa que me recebeu e me deu oportunidade de conhecer outros artistas.

Meu começo foi muito bom, o cinema me trouxe muita alegria. Essa dor de cabeça que hoje a gente tem com cinema, antigamente não existia. Eu fazia de tudo, e naquela época cinema gerava emprego. Foi muito importante. Comecei minha carreira cinematográfica aqui em Brasília em 1980, ano que prestei concurso para o Corpo de Bombeiros.

Já realizei oito longas-metragens. Nasci com vontade de fazer cinema, tenho essa vocação. Pena que a gente more num país pobre, onde ninguém apoia a cultura. Hoje eu vejo o cinema brasileiro totalmente derrotado. As pessoas não têm a garra de antigamente.

Meus personagens são maldosos. Mas o herói é aquele que faz tudo para combater o mal. Meu cinema é totalmente diferente do cinema brasileiro mais famoso, mas, com certeza, Brasília está começando a me aceitar como diretor de cinema, cineasta e como bombeiro. O meu prestígio vem também da minha corporação. A comunidade admira o Corpo de Bombeiros. Estou aqui pronto para salvar as pessoas. Acho que isto tem me ajudado muito.

Foi depois que entrei no Corpo de Bombeiros que comecei a fazer cinema, a comprar equipamentos, uma série de coisas. Entre 1982 e 1990, fiz três filmes, Procurador Jeferson: matador de escravos, Os Navarros e Sancho Nunca Morre. Em 1993, fiz uma superprodução chamada Inferno no Gama. Daí produzi um por ano: Gringo não perdoa, mata (1994) e No eixo da morte (1995). O filme que estou fazendo atualmente é uma superprodução, vai custar mais ou menos R$ 850 mil, enquanto minha produção normal varia entre R$ 50 mil e R$ 144 mil. Tem um elenco brilhante, um guarda-roupa caríssimo. Carros, cenários bonitos. Se eu tivesse dinheiro, dentro de 30 ou 40 dias meu filme estaria pronto, mas não tenho esse capital.

O meu público é estudantil, justamente porque são filmes trash, de que os estudantes gostam. Este último também vai ser aceito. Tem um elenco grande, com participação de estudantes, e isto influí na universidade, eles me ajudam a divulgar o meu trabalho. Montei um grupo para trabalhar, para que no dia de estreia lotássemos o cinema com um retorno imediato. O meu lucro não é com o lançamento do filme, mas com a venda das fitas de vídeo. Vendo fita para o Brasil inteiro. Isso me dá retorno, porque o cinema em si não dá dinheiro para cineasta nenhum. Não é a bilheteria que traz lucro.

Quanto a Inferno no Gama, fiz o lançamento dele lá no Gama, na universidade, e foi muito bem aceito. Em seguida, estreei no Cine Brasília também como boa aceitação e foi daí para frente que Afonso Brazza passou a ser conhecido. Não tenho contatos para a distribuição.

GRINGO NÃO PERDOA, MATA E NO EIXO DA MORTE

As portas começaram a se abrir mesmo no último filme, No eixo da morte, feito em 1995, mas lançado entre 1997 e 1998; consegui ser lançado num cinema bom. Com apoio da rede Karin, o filme fez 8 mil e poucos espectadores. E passou duas vezes. Ficou 23 dias em cartaz, depois retornou para o Festival Afonso Brazza. Foi uma beleza.

Foi nesse momento que as portas se abriram totalmente, porque as vendas das fitas dispararam, puxando também meus outros filmes. Como só faço uma cópia de cada filme, só posso lança-lo em um cinema; se eu lançasse três, quatro cinemas teria um retorno imediato. Eu fico dez dias em um cinema, e quando passo para outro, a mídia já acabou. Agora não, neste último, tenho casas para isso. Aqui em Brasília, tenho três cinemas para o lançamento. Todos do grupo Karim. E em vídeo, vendi cerca de 2,5 mil cópias de No eixo da morte. Inferno no Gama, 4,8 mil, e o Gringo não perdoa, mata, 3,5 mil cópias. Isso é um recorde para mim, porque eu faço de tudo, de produção e direção á venda.

A LEI DO AUDIOVISUAL

Olha, essa lei...Eu queria descobrir – falo de peito aberto -, queria descobrir qual foi o cineasta, qual foi o crítico de cinema, sei lá, qual foi...de qualquer coisa que aprovou esta lei. Isso não existe em lugar nenhum do mundo. O empresário não tem interesse num negócio desses. Nenhum deles. Eles não são obrigados. Pois, para o empresário é o seguinte: digamos que você pague R$ 100 mil de imposto, desses R$ 100 mil, você vai passar para mim R$ 2,5 mil. Dá 4%. Dá para eu perder o meu tempo com você por esse valor? Se o cara pagasse R$ 100 mil e desse R$ 50 mil na tua mão, ainda era vantagem. Aí dá para dizer que está patrocinando cultura. Mas com 4% só? Desse jeito é para uma minoria!

FILMES DIRIGIDOS POR AFONSO BRAZZA

1982- Procurador Jeferson, o matador de escravos, 16 mm, longa-metragem
1985- Os Navarros, em trevas de pistoleiros entre sexo e violência, 16 mm, longa-metragem
1990- Sancho nunca morre, 16 mm, longa-metragem
1993- Inferno no Gama, 35 mm, longa-metragem
1994- Gringo não perdoa, mata, 35 mm, longa-metragem
1995- No eixo da morte, 35 mm, longa-metragem
2001- Tortura selvagem, a “grade”, 35 mm, longa-metragem
2002- Fuga sem destino, 35 mm, longa-metragem


Publicado originalmente em NAGIB, Lúcia. O cinema da retomada: depoimentos de 90 cineastas dos anos 90. Lúcia Nagib; prefácio de Ismail Xavier- São Paulo: editora 34, 2002.

sábado, 8 de junho de 2013

Filmes perdidos da Boca: A Pistola Que Elas Gostam (1983)




Um dos primeiros filmes brasileiros de sexo explícito, A Pistola que Elas Gostam é um dos trabalhos menos lembrados do realizador Rubens da Silva Prado, o Alex Prado. Verdadeira lenda do cinema brasileiro B, o diretor ganhou fama ao realizar faroestes baratos com atores iniciantes na Boca paulistana.

Fitas como Gregório 38 e A Vingança de Chico Mineiro fizeram sucesso em rincões distantes do Brasil. Longe dos intelectuais e da imprensa especializada, Alex construiu uma obra ousada e criativa. Mesmo assim, muitos de seus trabalhos continuam inacessíveis e perdidos. Durante o período do cinema XXX, Prado pegava filmes antigos e colocava enxertos com sexo explícito. Muitos filmes foram montados, remontados e lançados com outros títulos. Sempre com cartazes que prometiam lindas mulheres em cenas hardcore

Alex Prado não está entre os diretores mais queridos entre seus contemporâneos da rua do Triunfo. Mesmo assim, Rubão é um homem destemido, criador e que merece maior reconhecimento. Rei dos faroestes, personagem único da nossa cinematografia. 

terça-feira, 11 de setembro de 2012

O cinema popular de Clery Cunha



Homem de irrestrita versatilidade, Clery Cunha tornou-se um dos mais célebres personagens do Cinema da Boca. O rádio e a televisão foram os órgãos formadores deste empenhado realizador. Os dois veículos estão presentes em diversos de seus longas-metragens, especialmente nas fitas policiais. O jornalismo policial transmitido para as classes baixas foram fundamentais na formação do diretor. Isso fica evidente quando Clery convidou o radialista Gil Gomes, então um astro do veículo para ser o narrador de O Outro Lado do Crime. Com produção do jornalista Moracy do Val, o longa contou com a presença do ator José Lewgoy, nome conhecido das chanchadas e novelas brasileiras.

Clery iniciou-se na sétima arte como coadjuvante. Fez filmes com Carlos Coimbra, Ary Fernandes, Edward Freund. Mas foi o austríaco Konstantin Tkachenko foi a primeira pessoa a dar chance ao jovem goiano na área de direção. Neurótico de guerra e um tanto turrão, o europeu não fazia ideia que estava iniciando a carreira de um dos mais audaciosos diretores paulistas de todos os tempos. Em 1972, Cunha conseguiu concluir seu primeiro longa-metragem: Os Desclassificados. A fita tratava de um tema polêmico para a época: um jovem que se apaixona pela própria madrasta. O elenco foi encabeçado por atores de renome como Hélio Souto e Joana Fomm ajudaram no bom desempenho da produção nos cinemas. Lançado em duas das principais salas do centro de São Paulo como o Art Palácio e Rio Branco, Desclassificados conseguiu encontrar um público próprio. As publicidades da época exploraram moças em trajes sumários. A Censura deixou o filme liberado somente para maiores de 18 anos. A propaganda era interessante: “Nas bocas, cortiços e vielas...nas mansões luxuosas...nas boates, restaurantes e “inferninhos”...ou no meio da multidão”.

O cinema policial de Clery é diferente das produções do mesmo gênero do Cinema Novo como Assalto ao Trem Pagador (1962) de Roberto Farias. Com influência do cinema internacional, os personagens de Farias são vítimas da sociedade. Moram em favelas e querem a ascendência social. O crime acontece como algo justificável. Os personagens de produções de Clery Cunha, Francisco Cavalcanti e Tony Vieira não. Os bandidos são maus por sua própria natureza. Não são nunca vítimas da sociedade. A influência dos diretores cinema-novistas são filmes esquerdistas de diretores internacionais.

Os cineastas da Boca paulista são inspirados pela rua. São pessoas sem nenhuma formação acadêmica ou formal. Dessa maneira, os programas populares de rádio e televisão exerceram decisiva importância nessas pessoas. Sem contar os jornais popularescos como o Notícias Populares.

No ano seguinte, Cunha dirigiria uma fita livre inspirada numa novela de sucesso da TV Excelsior paulista (A Pequena Orfã). O ator Dionísio Azevedo e o cantor Noite Ilustrada fazem participações importantes. Apesar da boa produção, percebe-se que Clery nasceu mesmo para fazer filmes policiais. 
 
Em 1974, o realizador goiano desenvolve um de seus melhores trabalhos: Pensionato de Mulheres. O filme trata de uma pensão para jovens que chegam para morar na cidade grande. Seus dramas e suas vivências. O corajoso filme trata de aborto, machismo e solidão urbana em plena Ditadura Militar. Se esse trabalho fosse dirigido por qualquer realizador estrangeiro, teria recebido prêmios em diversos festivais. A veterana Silvana Lopes interpreta a dona da pensão feminina com maestria. No ano seguinte, Clery dirige uma comédia (Eu Faço...Elas Sentem) e em seguida um faroeste com a dupla sertaneja Léo Canhoto e Robertinho (Chumbo Quente). Apesar dos bons resultados de bilheteria, não são trabalhos tão autorais de Cunha. No final da década de 1970, Clery retorna para o gênero que havia adotado no início de sua carreira cinematográfica: o policial. O Outro Lado do Crime é um longa-metragem inventivo e bem dirigido.

O caprichado roteiro é assinado pelo próprio diretor e pelo ator Jesse James Costa, colaborador do cineasta goiano em inúmeros trabalhos. Narrado por Gil Gomes, o filme conta a história de um marido (José Lewgoy) que planeja a morte da própria esposa para ganhar rios de dinheiro. Feito sem grande orçamento e com inventividade, O Outro Lado é um dos mais instigantes exemplares do filme policial nacional. Embora explore certo erotismo das jovens atrizes em suas películas, Clery é um realizador do cinema de gênero. Em 1980, o realizador lança seu filme mais conhecido: Joelma 23º Andar. Trata-se de um dos primeiros longas-metragens nacionais baseado numa obra literária espírita. A fita conta a história real de um incêndio que aconteceu no edifício Joelma, no centro de São Paulo. O acidente resultou na morte de 174 pessoas. A obra cinematográfica obteve sucesso de público e elogio dos críticos.

O filme posterior de Clery Cunha é mais um policial: O Rei da Boca. Protagonizado pelo ator Roberto Bonfim, o longa-metragem conta a trajetória do personagem ficcional Pedro Cipriano da Silva. De homem simples a um dos líderes da bandidagem paulista. Prostituição de menores e tráfico de drogas são alguns dos crimes em que o protagonista se envolve. O elenco feminino é encabeçado por Claudete Joubert e Zilda Mayo. O interessante da obra é que O Rei da Boca mostra a prostituição sem romantismo. As moças atendem os clientes de maneira rápida, sem nenhum prazer. Apenas por motivos econômicos.

A década de 1980 é considerada o período final das utopias. A segunda metade do período também foi meio cruel para o cinema brasileiro. O cinema de gênero feito por artesãos como Alex Prado, Clery Cunha, Francisco Cavalcanti e Tony Vieira perdeu espaço. As salas que passavam este tipo de película fecharam. Em 1987, Clery codirigiu com o amigo Francisco Cavalcanti seu último filme para o cinema: Horas Fatais- Troca de Cabeças. Desde então, Clery vem tentando terminar mais um longa-metragem. Um dos seus projetos atuais é inspirado nas histórias policiais da Cidade Tiradentes, bairro periférico da Zona Leste de São Paulo.

O cinema brasileiro perde quando não produz filmes de gênero. Perde também por não ter realizadores autodidatas. Uma cinematografia rica é construída por pessoas com diferentes formações. Clery Cunha é um realizador brasileiro por excelência. Ele e seus filmes merecem a nossa atenção.

domingo, 21 de junho de 2009

Mais sobre o diploma de jornalismo


João Antônio (1937-1996) escrevia muito. De origem humilde, chegou a se formar em jornalismo. Mas admirava mesmo os autodidatas como Lima Barreto, Nelson Cavaquinho e o mestre Carne Frita.

Eu não sou hipócrita. Não vou dizer que acho absurdo o fim da obrigatoriedade do diploma de jornalismo. Pra falar a verdade, não tenho simpatia por qualquer curso universitário ou qualquer coisa acadêmica. Minha avaliação sobre as universidades públicas também não é das melhores.

(Tem gente que se acha melhor que os outros por ter uma casa maior ou um carro do ano. E tem muito, muito universitário que se acham os tais, os mais intelectuais e mais evoluídos (??) por estarem estudando em faculdades públicas. A pergunta que fica: mais evoluído no que cara-pálida??)

E olha, se sou formado em algo, no sentido amplo da palavra, é em outras coisas. Sou formado em sebo, programa esportivo de rádio AM e cinema da Boca do Lixo. Então, nem sei se devo ficar falando muito sobre esse tema.

A maioria das pessoas que eu admiro e tenho como espelho são autodidatas. Na minha opinião, Rubens da Silva Prado é o maior cineasta vivo do Brasil. Rubão é um cara de origem muito humilde, de São Miguel Paulista, zona leste de São Paulo. Quando criança, RSP fazia faxina em um antigo cinema do bairro somente para poder assistir algum filme. (Hoje, esse cinema é uma loja das Casas Bahia. Sim, eu estive lá somente pra saber o que aconteceu com a sala).

Outro exemplo: o escritor João Antônio Ferreira Filho. Chegou a se formar em jornalismo, mas sempre foi um autodidata. Quando o João Antônio ganhou seu primeiro concurso literário, ele recebeu a visita de alguns escritores consagrados. Nessa época, o autor de Malagueta, Perus e Bacanaço morava com a família.

O pai de João tinha um bar na rua Botocudos, na Vila Anastácio. Quando os visitantes chegaram, o pai pensou que eles eram fiscais federais ou investigadores de polícia por “estarem bem vestidos”.

Na minha opinião, falar que o diploma de tem que ser obrigatório é uma atitude um pouco elitista. Só porque a pessoa cursou quatro anos fantásticos e interessantíssimos (??) de jornalismo, muito foca pensa que é o novo Ricardo Kotscho do pedaço.

Teve gente formada que mandava coisas medíocres pra Zingu (falo sobre o passado, porque sou ex-editor. Hoje sou uma espécie de presidente de honra, tipo o Zagallo da Zingu). E tinha gente que nunca tinha entrado numa universidade que mandavam coisas interessantíssimas, brilhantes, acima da média.

Concordo com o grande Adilson Marcelino. Ele matou a charada. Na realidade, a tal proibição não vai mudar muita coisa na área. Somente em veículos de menor envergadura e de cidades distantes.

E não. Não sou fã do Gilmar Mendes como alguns podem imaginar.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009




Amigos, estou retomando este endereço. Uma vez um jornalista de Minas me pediu um depoimento sobre o Rubens da Silva Prado. Já falei a diversos amigos que considero Alex Prado o maior cineasta vivo do Brasil. Mandei o depoimento, mas outros problemas fizeram o colega não publicar a matéria. Reproduzo aqui o depoimento que mandei para ele:

O ÚLTIMO PISTOLEIRO


Rubens da Silva Prado é uma das maiores lendas do cinema nacional de todos os tempos. Parece mentira, mas ainda hoje, passadas várias décadas, Tony Vieira e Alex Prado ainda são tema de conversas em periferias e cidades do interior do Brasil. Vários exibidores fizeram verdadeiras fortunas em cima das fitas desses homens.

Posso definí-lo como um cara injustiçado, infelizmente excluído do meio cinematográfico atual.
Pra mim, Rubão é e sempre será um marginal entre os marginais, um outsider. Trata-se de um autodidata de enorme talento, que aprendeu a fazer cinema sem qualquer escola ou universidade. A faculdade de RSP é a rua e a vida. Sua grande transformação acontece quando ele tem uma câmera por perto. A proximidade com este instrumento tranforma um homem simples e pacato em um leão, em um gigante.

Sua ligação com o cinema começou no bairro onde nasceu e cresceu, São Miguel Paulista, zona leste de São Paulo. Rubão gostava tanto de ir nas matinês, que o dono do cinema propôs que ele se tornasse faxineiro da sala para poder assistir aos filmes de graça. Ele topou.

Sem dinheiro nenhum, dedicou seus finais de semana a produção de um filme que todos achavam que ia ser um retumbante fracasso. Este filme seria "Gregório 38", um dos maiores sucessos de seu currículo.
Sua obra se destaca frente a seus demais colegas da Boca, por ser o único realizador realmente dedicado ao faroeste. Tony Vieira fez alguns, mas depois dedicou-se mais aos filmes policiais. Com toda justiça, Rubão é o rei do gênero. Pra mim, três de seus filmes são obras-primas absolutas do cinema nacional: Gregório 38, A Vingança de Chico Mineiro e A Febre do Sexo (o nome nada tem haver com o conteúdo, trata-se de um western). Todos realizados sem ajuda estatal, sem apoio das universidades, dos centros acadêmicos e da crítica especializada.

Infelizmente, Alex teve que fazer filmes de sexo explícito para sobreviver e pagar suas contas. Porém, nos anos 90 voltou ao estilo de suas fitas normais, e inclusive tendo terminado "O Maníaco do Parque", ainda inédito.

Este é o legado deste guerrilheiro cinematográfico para a história do cinema paulista e brasileiro. Se norte-americano, Alex Prado teria tornado nome de documentários, biografias caprichadas, seus filmes teriam sido relançados em box de DVDs. Mas como nasceu no em solo brasileiro, hoje ele tenta sobreviver e fazer mais filmes, sempre com orgulho, humildade, caráter e dignidade. Na minha opinião, trata-se do maior cineasta independente do Brasil.