sábado, 5 de outubro de 2013

Memórias de um Cafajeste- parte IX: Reflexões sobre cinema



Por Jece Valadão

CINEMA NOVO

No mesmo ano em que nós filmamos Os Cafajestes, o Glauber estava dirigindo Deus e o Diabo na Terra do Sol, o Roberto Farias estava fazendo O Assalto Ao Trem Pagador e, em São Paulo, o Massaini estava produzindo, com direção do Anselmo Duarte, O Pagador de Promessas.

Quer dizer, num mesmo ano foram feitos quatro filmes importantes, que deram início a uma deslanchada do cinema nacional e ao aparecimento do Cinema Novo.

Exclusão

Surgiram diretores como Bruno Barreto, o Cacá Diegues, o Jabor, o Domingos de Oliveira, entre vários outros.

Eles fizeram uma panelinha e eu simplesmente fui excluído por não concordar com o tipo de filme que eles faziam: um cinema político, de prostesto, de contstação.

Eu sempre quis fazer cinema-arte, cinema-cultura; ou então, um cinema para ganhar dinheiro.

Cu de touro

Depois dos Cafajestes, enquanto eu produzia filmes como Boca de Ouro, Navalha na Carne e Dois Perdidos Numa Noite Suja, o pessoal do Cinema Novo fazia um cinema que mais parecia o Cu do Touro.

Mais sério que cu de touro não existe.

Atuação

A minha exclusão da panelinha do Cinema Novo tinha um lado engraçado, porque eu atuava, ao lado deles, no meio político cinematográfico, mas não era aceito no meio cultural. E cultural, aqui, eu coloco entre aspas...

Discriminação

Fui discriminado por toda a panelinha do Cinema Novo durante muito tempo, apesar de ter feito filmes como, com o Nelson Pereira dos Santos; um filme respeitado pelos intelectuais até hoje.

Reconciliação com o Cinema Novo

Recentemente fiz as pazes com o Cacá Diegues. Ele me chamou para fazer Tieta do Agreste e eu fui.

Foi ótimo reencontrá-lo. Ele é maravilhoso.

O que havia realmente era uma desinformação, pontos de vista políticos diferentes; mas puramente políticos.

Eles não entendiam a minha postura de não querer fazer política e eu não entendia a postura deles de fazer política através do cinema.

Mas com o tempo isso foi esclarecido.

Técnicos e atores

Já os técnicos e atores gostavam muito de mim, porque eu era o diretor que mais produzia filmes e que, consequentemente, oferecia mais trabalho para eles.

Ator

Acho que essa discriminação não tinha nada a ver com a minha qualidade como ator. O Glauber me achava um ótimo ator. O Nelson Pereira dos Santos também.

Mas em virtude da discriminação política, houve um afatamento por parte de muitos diretores. Uma elite de meia dúzia de pessoas.

Chama acesa

Eu não tiro o mérito que o Cinema Novo tem. O mérito de manter a chama do cinema brasileiro acesa.

Poder na mídia

O pessoal do Cinema Novo tinha um poder muito grande na mídia.

Todos eles eram ligados ao pessoal da imprensa e acabavam exercendo um certo domínio, execrando os outros cineastas do país.

CHANCHADA

A chanchada, que teve um valor fundamental no cinema brasileiro, foi execrada pelo Cinema Novo e pela crítica. Eles achavam a chanchada uma bosta.

Só que através da chanchada foram criados os técnicos, os autores, os artistas, cenógrafos, figurinistas...Os mesmos técnicos que foram usados pelo Cinema Novo.

Revisão crítica

Hoje está sendo feita uma revisão crítica da chanchada.

Acho que ela foi fundamental para o cinema brasileiro. Os filmes tinham um público de dobrar o quarteirão.

Eram filmes ingênuos, superengraçados.

Originalmente publicado em: VALADÃO, Jece. Memórias de Um Cafajeste. São Paulo: Geração Editorial, 1996.

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