O diretor de fotografia Virgílio Roveda, o Gaúcho (Vacaria, RS, 02/08/1945-) é o entrevistado da primeira edição do programa Papo de Boqueiro. Ele trabalhou em mais de 60 longas-metragens nacionais nas mais variadas funções. Um autêntico coringa da Boca paulista.
segunda-feira, 30 de maio de 2016
sábado, 28 de maio de 2016
Superfêmeas IV: Nicole Puzzi
NICOLE
PUZZI
“Eu
amava aquele ambiente. Eu amava...”.
Por Bianca Bellucci,
Heros Macedo, Heverton Bruno, Larissa Palmer, Renata Rocha e Tamires Camargo.
- Coloca o som e o
microfone ali no meio das duas camas, porque capta o som da voz das duas. Vai
captar bem, mesmo quando elas pularem de uma cama para a outra. Se pegar o
barulho da cama a gente dubla, mas vai captar bem o som. Coloca o som aqui, bem
no meio das duas camas.
Algum tempo depois de
tudo ter sido preparado:
- Está tudo bom? Som?-
pergunta o diretor.
- Perfeito !
Começa a filmagem. Nicole
Puzzi de um lado. Monique Lafond de outro. As duas começam a pular de uma cama
para a outra apenas de babydolll. De repente, olham pra baixo e...
- O que é isso? Com esse
cara aqui embaixo eu não filmo!- esbraveja Nicole.
- Como? Cadê...Seu filho
da puta! Você acha que aqui é lugar de...
- Mas o senhor me mandou
colocar o som aqui.
- O som! Eu mandei colocar
você? Você quer desrespeitar as minhas atrizes?
Sem saber o que fazer, o
assistente sai debaixo da cama, onde tinha se escondido “estrategicamente” para
segurar o microfone, e pede desculpas. Mil desculpas. Em seguida pede
substituição. Nicole e Monique não deixam. A lição já tinha sido aprendida.
Nunca mais ele voltaria a cometer abuso desses.
Nicole lembra-se disso
com um sorriso no rosto. Mas nem toda confusão deixou boas lembranças. Certa
vez, entre 1978 e 1979, uma mulher deu um soco na atriz sem razão aparente.
- Ela me viu. Ela veio
com um ódio tão grande e me deu um soco. E eu não entendi. Ela sabia quem eu
era. Sabia o meu nome. Sabia tudo. Então, começou a me xingar. Eu era meio
foda...Eu ia matar aquela mulher porque eu era meio fodona mesmo. Mas aí me
seguraram e ela correu. Se eu pego ela, teria machucado muito e talvez fosse me
arrepender depois.
Nunca entendeu direito o
que aconteceu. Como a mulher sabia quem ela era e o motivo da bronca.
- Meus filmes eram
censurados. Não passava na TV e eu não era conhecida na TV. De que outro jeito
ela sabia quem eu era?
Nicole era cabeça quente,
desbocada e...Sincera. Apaixonadíssima pelo cinema produzido na Boca do Lixo.
Apaixonada pelo trabalho Antônio Polo Galante, Walter Hugo Khouri, Jean Garrett,
entre outros famosos diretores da pornochanchada. Era tão apaixonada que sua
carreira na rua do Triunfo começou antes que o tempo permitisse. Ainda não
havia completado 18 anos de idade quando a jovem Nicole começou no filme
“Possuídas pelo Pecado” (1975). A estreia só foi possível graças a um homem que
zanzava pela Praça da Sé prometendo a todos que “tirava documentos”. Esse ato
de ousadia lhe rende broncas até hoje de David Cardoso, ator conhecido como
“Rei da Pornochanchada”, e seu primeiro diretor.
A partir daí, foi um
filme atrás do outro. E poderiam ter sido muito mais, pois, segundo Nicole, ela
recusou mais produções do que fez. Embora tenha, como diz, “aptidão para papeis
dramáticos”, os diretores adoravam coloca-la como ninfeta, mesmo após seus 24
anos de idade. A atriz mexia com a imaginação dos homens mais velhos que
enxergavam nela uma doce sensualidade. De todas as personagens que fez, a que
mais marcou a sua carreira sem dúvida foi Ariella: uma jovem órfã, herdeira de
uma grande fortuna, mas que sofria nas mãos de seus pais adotivos, que
desejavam a sua herança.
Mas nem só de atuação
vivia Nicole Puzzi. Curiosa e cismada de que tinha que conhecer de tudo e mais
um pouco da vida, ela se interessou por Nietzsche, trabalhou como enfermeira,
cursou Direito e tinha um fascínio pelo comportamento do ser humano. Agora,
quer ver o lado de atriz de Nicole falar mais alto? Faça uma crítica sobre a
pornochanchada ou critique seus colegas de profissão.
- Essas coisas são
apontadas com o dedo do preconceito. Era o gênero do povinho, diziam da
pornochanchada na época. Coisas que as gentinhas, vamos dizer assim, faziam.
Todo mundo queria fazer sexo, mas empurravam a culpa para nós, como se fossemos
os culpados, os responsáveis.
Certa vez, estava em um
salão de beleza se preparando para gravar e, do nada, “uma mulher mal
resolvida”, como diz Nicole, sem mais nem menos começou a falar das atrizes da
pornochanchada:
- Por que toda atriz de
cinema é puta?
A mulher questionava a
todos do salão em voz alta, deixando o cabelereiro, que não sabia onde se
escondia, olhando para Nicole sem saber o que fazer. Depois de um tempo, sem
poder aguentar mais, Nicole respondeu em alto e bom som.
- Porque a gente faz
exatamente aquilo que você faria se estivesse no seu lugar.
Silêncio. Um pouco depois
o silêncio virou simpatia. Que virou camaradagem por parte da mulher. Até que
ela ousou mostrar umas fotos mais picantes que havia tirado para o namorado.
“Fotos ridículas e tiradas em um motelzinho de quinta”, de acordo com Nicole,
que fez questão de mostra-las ao salão todo, é claro.
Os diretores, atores e
outros personagens da Boca a amavam. O seu jeito esquentado e sincero
conquistou Walter Hugo Khouri. O diretor fazia questão de tê-la em quase todo
filme que dirigia, tornando-a uma de suas musas – talvez a principal. Khouri
praticamente criou uma personagem justamente para ela em “Eu” (1987). No longa,
Nicole vive Lila, uma das várias mulheres que não resistem aos encantos de
Marcelo, um milionário tarado interpretado por Tarcísio Meira. Nessa obra,
Nicole recebe mais espaço para mostrar o lado dramático – seu último trabalho
antes de ir para a televisão.
No entanto, antes de
atingir o status de musa da pornochanchada, Nicole largou a ideia de ir para um
colégio de freiras aos 14 anos de idade, simplesmente por que tinha na cabeça
que não queria casar. Viveu uma vida, que segundo ela, foi diferente do normal.
- Eu tinha uma família de
mentalidade mais tradicional, mas uma família espetacular. Aí eu me torno atriz
de pornochanchada. Por quê? Porque resolvi ser rebelde. Aí confronto uma porção
de coisa em mim mesma e nos outros. Tomo um caminho difícil. Eu sempre soube
que ser atriz de pornochanchada naquela época ia ser terrível.
E foi durante uma
conversa com sua família que Nicole escutou o que precisava para sair do
Paraná, tomar o seu rumo, conquistar a carreira nos cinemas e seguir para São
Paulo:
- Você vai quebrar a
cara, minha filha- disse Orlando Ferreira, pai de Nicole, quando descobriu o
que filha queria fazer – Você vai quebrar a cara; Você escolheu uma coisa que
vai ser muito dura pra você.
Nicole olhava, esperando
ser expulsa de casa.
- Você vai quebrar a cara
e tem uma coisa: quando você quebrar a cara...
“Fodeu!”, pensou Nicole,
assustada. Seu Orlando continuou:
- Quando você quebrar a
cara, você volta aqui para o pai, que o pai vai te ajudar a catar os cacos. Vai
viver a tua vida, mas eu estou aqui.
Os anos de ouro da
pornochanchada e da rua do Triunfo passaram. As idas ao boteco para comer pão com
mortadela junto ao elenco depois de cada gravação – ou melhor, Nicole,
vegetariana desde aquela época, pedia queijo ou comia pão puro – também
passaram, mas não impedem Nicole Puzzi de seguir sonhando com um merecido
reconhecimento da parte do público para com as obras que participou. Também
para com os diretores, atores e amigos que fez lá na Boca do Lixo.
- Olha, eu vivi bem por
que eu acho que amava aquele ambiente. Só viveu mal quem ia viver mal em
qualquer lugar. Eu amava aquele ambiente. Eu amava.
FICHA TÉCNICA
Nome completo: Tereza
Nicole Puzzi Ferreira
Nome artístico: Nicole
Puzzi
Data de nascimento: 17 de
maio de 1958
Naturalidade: Floraí,
Paraná.
Principais bilheterias da
pornochanchadas:
“Possuídas pelo pecado”
(1976), Jean Garrett
“Dezenove mulheres e um
homem” (1977), David Cardoso
“Escola penal de mulheres
violentadas” (1977), Antônio Meliande
“Pensionato das
vigaristas” (1977), Osvaldo de Oliveira
“Reformatório das
depravadas” (1978), Ody Fraga
Outros trabalhos
relevantes:
“Ariella” (1980), John
Herbert
”Gabriela” (1983), Bruno
Barreto
“Eu” (1987), Walter Hugo
Khouri
“Barriga de aluguel”
(1990/91), novela Rede Globo
“A Boca de São Paulo”
(2013), livro de sua autoria
“Pornolândia” (2014),
programa Canal Brasil.
Onde vive hoje: São Paulo,
capital
O que faz hoje: Ativista,
assistente social, apresentadora e atriz.
Publicado originalmente
no trabalho acadêmico Superfêmeas- as
mulheres que fizeram a história da pornochanchada de autoria de Bianca
Bellucci, Heros Macedo, Heverton Bruno, Larissa Palmer, Renata Rocha e Tamires
Camargo, publicado como trabalho de conclusão do bacharelado em jornalismo da
Universidade Metodista de São Paulo em 2014.
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Nicole Puzzi
sexta-feira, 27 de maio de 2016
Prefácio do livro Dossiê Boca
Por Fausto Salvadori Júnior
Matheus Trunk sabe que existe um mundo sem fim,
repleto de histórias e mistérios, para além dos quatro cantos das telas de
tablets, celulares e notebooks. Essa é uma das suas qualidades, nem sempre
encontrada entre os jornalistas da geração que começou a trabalhar após a
invenção do Google.
O Matheus é foda. Ele gosta de pesquisar metendo as
mãos na poeira dos sebos e remexendo em arquivos amarelados atrás de filmes
perdidos, edições esgotadas, revistas esquecidas e discos de vinil. Também é
daqueles que curte conversar com gente. Passa horas ouvindo pessoas de cabelo
branco contar histórias de tempos em que ele nem havia nascido. Entre os
antigos cineastas da Boca do Lixo, tema desse livro, Matheus virou conhecido de
todo mundo. Conversando com eles, volta e meia é capaz de surpreendê-los
mencionando fatos, datas e detalhes que os protagonistas dessas histórias já
tinham esquecido. Ao longo dos anos, foi reunindo um belo acervo de fragmentos
da história do cinema, da música, do esporte e do jornalismo em São Paulo.
Matheus se meteu nessa trilha de pesquisador sem
qualquer garantia de que o material reunido por ele algum dia viesse a ser
publicado em algum lugar, fosse como conteúdo jornalístico ou pesquisa
acadêmica. Faz isso simplesmente porque ama esses temas e quer conhecer mais e
mais sobre eles. Amor e sede de conhecimento: não são essas as bases de toda
busca que vale a pena?
Outra qualidade de Matheus é o olhar voltado para
todas as pessoas que fazem história, especialmente para aquelas que ficam nos
bastidores, fazendo tudo acontecer longe do aplauso público. Ele tem o olhar do
“operário que lê” do poema de Bertolt Brecht, aquele que se indignava lendo os
textos que retratavam os acontecimentos como uma sucessão de feitos praticados
por semideuses solitários. “O jovem
Alexandre conquistou as Índias. Sozinho? César venceu os gauleses. Nem sequer
tinha um cozinheiro ao seu serviço?”, perguntava o operário do poema. Este
operário provavelmente teria a mesma reação diante de muitos textos escritos
sobre história do cinema, que parecem enxergar apenas as figuras dos diretores
e dos atores principais. “Glauber Rocha
filmou ‘Terra em Transe’. Não precisou nem de um eletricista?”
Quando escreve sobre cinema, Matheus abre espaço
para as histórias de técnicos, atores coadjuvantes, roteiristas, diretores
esquecidos. Foi o que fez em seu primeiro livro, O Coringa do Cinema, sobre o técnico Virgílio Roveda, e é o que faz
neste livro. Aqui, a gente dos bastidores é quem sobe ao palco. Os
protagonistas de sempre, como José Mojica Marins e David Cardoso, passam a
entrar como coadjuvantes para falar da vida de figuras como Giorgio Attili e
Walter Wanny.
Com seu gosto pelas histórias dos anônimos e
esquecidos, faz todo sentido que Matheus goste tanto do cinema semiartesanal e
independente feito em São Paulo entre os anos 70 e 80, no quadrilátero
docemente batizado de Boca do Lixo, atual Cracolândia. Embora criticada de
todos os lados, especialmente pelos cineastas e críticos mais
intelectualizados, a Boca foi uma das mais fascinantes experiências de cinema
feito pelas classes populares.
Na Boca paulista, o sonho de fazer cinema virou
realidade para muita gente que não tinha dinheiro nem educação formal. Suas
histórias estão nesse livro. Histórias de um peão de boiadeiro que conseguiu
fazer seu próprio filme sobre os rodeios, de um faxineiro de cinema que se
tornou cineasta, de atores que eram contratados no mesmo bar onde comiam fiado
ou de um garçom que se tornou o maior montador de filmes da história do Brasil.
Histórias como essa só podiam ter acontecido na
Boca do Lixo, quando fazer cinema era barato – e assistir também. Trabalhando
com pouco dinheiro, sem financiamento estatal ou renúncia fiscal, toda essa
gente dependia do resultado das bilheterias para poder comer. E quem pagava
pelos filmes era um público de baixa renda que tinha o mesmo perfil dos que
faziam os filmes. Um cinema feito do povo para o povo.
É como se, em plena ditadura militar, muitos anos
antes da chegada dos governos democráticos que tiraram milhões de brasileiros
da miséria, o cinema da Boca já estivesse promovendo o seu projeto de ascensão
para um grupo de brasileiros originalmente destinados a coadjuvantes do quadro
social.
Uma ascensão que, para muitos, foi feita mais de
sonho do que de dinheiro. Ao longo das páginas do livro, é melancólico ver como
muitos personagens não conseguiram mais prosseguir em suas carreiras depois que
a Boca do Lixo fechou as portas e o cinema tornou-se uma indústria bem mais
elitizada. Os sobreviventes da Boca, contudo, não desistem. Em seus
depoimentos, estão sempre cheios de projetos: podem não ter dinheiro, mas têm
roteiros que um dia serão filmados, livros que um dia serão escritos, filmes
inéditos que um dia serão lançados.
Podem ser ilusões, mas são as suas ilusões. Cada um do seu jeito, os personagens da Boca parecem
ter seguido a sugestão dada a Orson Welles para Ed Wood, destinado a se tornar
o pior cineasta do mundo, no filme de Tim Burton: “Vale a pena lutar pelos seus
sonhos. Por que passar a vida realizando os sonhos dos outros?”.
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sábado, 21 de maio de 2016
Superfêmeas III: Débora Muniz
DÉBORA
MUNIZ
Luz,
câmera, ação, desmaios
Por Bianca Bellucci,
Heros Macedo, Heverton Bruno, Larissa Palmer, Renata Rocha e Tamires Camargo.
- Rápido! Chamem o
resgate!
- Mas o que aconteceu?
- A Débora desmaiou!
E assim, a emergência foi
chamada ao set de filmagem de “A b... profunda” (1983). As câmeras estavam
posicionadas, os técnicos prontos e a cena da vez era um momento íntimo da
personagem Helena transando com três homens em uma casa de praia. A atuação
impactante poderia ter permanecido para sempre na memória de Débora Muniz, a
intérprete da ninfeta. Mas não foi bem assim. A única coisa que ela lembra é
que a cena é linda, cheia de florezinhas que caem pelo corpo da personagem. De
resto só o breu. Estava desmaiada.
O diretor do longa,
Álvaro de Moya, teve um dia incomum com sua atriz desmaiada antes dele gritar:
“Corta!”. Mas, para a musa, aquele foi um dia como qualquer outro. Não porque
ela estava mais uma vez envolvida em um projeto e filmando uma cena, e sim
porque desmaiava toda vez que precisava ficar nua para interpretar uma personagem.
Mesmo com toda a sua
coragem, perseverança e amor pelo cinema, essa não foi uma cena tão fácil de
ser gravada, ainda mais se tratando do primeiro filme de sexo explícito da
carreira de Débora.
Fosse nesses longas ou nas pornochanchadas, apagar era o reflexo do nervoso extremo que sentia todas as vezes que precisava se despir para gravar uma cena. A cabeça entrava em parafuso e Maria das Neves de Lima, como foi batizada, lembrava-se de toda a sua trajetória desde a saída da cidade natal, Afogados da Ingazeira, interior de Pernambuco, até tudo o que tinha sofrido, feito e desfeito para se firmar como uma atriz séria.
Ainda criança, ela saiu
do Nordeste do Brasil com a família e foi para Tapejara do Oeste, interior do
Paraná, local onde, com sete anos de idade, descobriu o que queria fazer da
vida enquanto ia para a missa de domingo com o pai. A caminho da igreja, a
menina viu uma aglomeração próxima ao aparelho de televisão que era colocado
todos os dias no meio da praça. Curiosa como sempre, se aproximou e viu na tela
uma garota de saia colegial vermelha e blusa branca atravessando a rua. Uma
simples cena de um programa qualquer abriu os seus olhos para um novo mundo.
“Eu quero fazer isso aí”. Foram as palavras que saíram de sua boca diretamente
para os ouvidos do pai, que não deu bola aos delírios da criança. Eles mal
sabiam o que era aquilo, mas a garota colegial permaneceu sempre em suas
lembranças.
Três anos depois se mudou para São Paulo e, na adolescência, a diversão máxima era cabular aula para assistir os filmes no cinema Caboclo, na Vila Matilde, zona leste da cidade. O cinema ia cada vez mais fazendo a sua cabeça e, em 1975, o filme “Efigênia dá tudo o que tem” foi a gota d`água da paixão por esse mundo. O fato de ser apaixonada por Ricardo Petráglia, o galã do filme, ajudou muito no carinho por esse longa.
A entrada para a vida artística foi pelos palcos do teatro com a peça “Dr. John e Frank”, A menina tinha 14 anos de idade e encerrou a montagem com colegas por algumas escolas na cidade. Logo depois, decidiu entrar de vez para um grupo de atores. Buscou em anúncios de jornais e, em 1975, tornou-se aluna da escola de atores de Wilson Rodrigues, na rua Riachuelo, centro da cidade. Três meses depois, reuniu-se com outros alunos e mudou para a escola de atores de José Mojica Marins, o Zé do Caixão, onde aprendeu técnicas de intepretação e produção, além de ser apresentada à Boca do Lixo, em 1977.
Na Boca, encontrou um
verdadeiro lar. Passava grande parte do dia por lá e em pouco tempo estrelou “A
mulher que põe a pomba no ar” (1978) e “Perversão” (1979), ambos de Mojica.
Os desmaios começaram
logo no primeiro filme, mesmo não sendo tão comprometedor, já que aparecia sem
roupa, mas sentada em uma cadeira, contando uma história e sem mostrar muita
coisa. O bicho começaria a pegar quando filmou uma cena de estupro em “Mundo,
mercado do sexo” (1979). Messe, desmaiou de verdade.
Mas mesmo apagando nas
cenas de nu, era presença certa em vários filmes, fosse em papéis principais ou
coadjuvantes. Por passar muito tempo na Boca, era considerada filha de todo
mundo e gostava de estar com a equipe técnica em momentos de descontração e
mesmo durante as filmagens. Seu jeito de moleca não só rendia papéis em longas
por toda a rua do Triunfo, como o conhecimento do processo de produção dos
filmes, técnicas e direção.
Certa vez, no intervalo
de gravação de “Perversão”, ela conversava com outros colegas do elenco quando
o assunto se voltou aos ídolos de cada um. Imediatamente falou que era
apaixonada pelo galã de “Efigênia dá tudo o que tem” e, para a sua surpresa, o
rapaz do seu lado era ninguém menos que Ricardo Petráglia, a sua paixonite de
adolescência.
- Ciganinha, eu fui a
paixão da sua vida- disse ele, chamando-a pelo apelido que ganhou na Boca. Ela não
sabia onde enfiar a cara de vergonha e, se tivesse descoberto antes quem era
ele, provavelmente não conseguiria atuar ao seu lado. O motivo dos desmaios
seria muito maior do que simplesmente a nudez em cena.
Porém, nem tudo eram
flores e claquetes no início da carreira. O pai não aceitou que a filha fosse
atriz, e Débora perdeu a conta de quantas vezes apanhou em casa. O senhor José
dizia que ela era a vergonha da família.
Mas mesmo sem o apoio
familiar, Débora seguiu em frente e sua carreira estava pegando fogo. As
produções na Boca do Lixo também estavam em plena ebulição, mas a nova década
que surgia trouxe mudanças para o cinema nacional que afetaram diretamente a
rua do Triunfo. Os filmes produzidos nos Estados Unidos e Europa que estavam
chegando ao solo brasileiro apresentavam conteúdo de sexo mais picante e
completamente explícito, ao contrário do que era mostrado nas pornochanchadas.
O público, é claro, preferiu essa novidade.
Sem alternativas, os
produtores passaram a produzir esse tipo de filme e Débora foi convidada a
estrelar essa nova vertente do mercado cinematográfico. Outras atrizes
receberam o mesmo convite, mas, de todas, Débora foi a única que aceitou. Ela
chegou à conclusão que, se recusasse, teria que abandonar o cinema, coisa que nem
cogitava na época.
Não foi uma decisão
fácil, tampouco rápida. Ela resistiu muito tempo, ignorou testes e ligações de
produtores que a queriam num filme novo. Um dia a chamaram na produtora e
perguntaram se ela faria. Entre muitos sim e não, deu finalmente o sinal
positivo e os produtores imediatamente disseram: “Então assina o contrato”.
Foi desta maneira
repentina que Débora estrelou “A b...profunda”. A Haway, produtora do longa, já
sabia que ela estava balançada e providenciou tudo o que ela poderia precisar
para se hospedar no Guarujá, local onde o filme foi rodado. Se dissesse sim,
haveria uma mala e itens de higiene prontos, além de um cachê bastante gordo,
suficiente para comprar um carro na época.
Assinou o contrato, filmou e desmaiou. Tudo no mesmo dia. Enquanto transava para obter uma cena, uma mistura de questões, que envolviam o que ela estava fazendo ali e o que tinha que fazer em seguida, passava pela sua cabeça. A família logo aparecia em sua mente, mas ela não desistiu.
Depois do seu sim à
indústria pornô, a primeira vez que Débora encontrou na rua do Triunfo antigos
colegas, como os produtores Augusto de Cervantes, Jean Garrett e José Mojica
Marins, foi muito questionada. Com certa bronca na voz, eles perguntaram o
motivo de ela ter se submetido a essa nova linha do cinema. Débora sempre tinha
a resposta na ponta da língua e rebatia dizendo que fazia pornô porque nenhum
deles havia dado um emprego para ela. Neste momento em que assumiu que
realmente estava no pornô e que fazia coisas extremamente ousadas em frente às
câmeras, sentiu que os antigos colegas a estavam vendo como mulher pela
primeira vez. A menininha que havia aparecido no auge da adolescência e que
tinha crescido naquele meio tinha ido embora e no seu lugar havia uma mulher
forte, decidida e que faria de tudo para continuar no cinema. Fosse fazendo
sexo na telona ou não, tudo não passava de trabalho. APENAS trabalho. E um
tantinho de paixão também.
Mesmo desmaiando nas
cenas de nu, Débora destacou-se nos filmes pornôs brasileiros até o fim da
década de 80, quando deu um tempo na telona para dedicar-se à direção de filmes
e ao teatro.
Em 1992, deixou o país
para morar e trabalhar em uma casa de shows brasileira no Japão, onde
permaneceu até 2003. De volta ao Brasil, ajudou a fundar a “Rama Kriya”,
companhia teatral que se dedica à produção de peças na religião espírita.
FICHA TÉCNICA
Nome completo: Maria das
Neves de Lima
Nome artístico: Débora
Muniz
Data de nascimento: 26 de
agosto de 1959
Naturalidade: Afogados da
Ingazeira, Pernambuco.
Principais bilheterias da
pornochanchadas:
“A mulher que põe a pomba
no ar” (1978), José Mojica Marins
“Perversão” (1979), José
Mojica Marins
“Mundo, mercado do sexo”
(1979), José Mojica Marins
Outros trabalhos
relevantes:
“A b... profunda” (1983),
Álvaro de Moya
“Oh! Rebuceteio” (1984),
Cláudio Cunha
“Gozo alucinante” (1985),
Jean Garrett
Onde vive hoje: São Paulo
(SP)
Onde faz hoje: Atriz
integrante do grupo teatral “Ram Kriya”, especializado em peças espíritas.
Publicado originalmente
no trabalho acadêmico Superfêmeas- as
mulheres que fizeram a história da pornochanchada de autoria de Bianca
Bellucci, Heros Macedo, Heverton Bruno, Larissa Palmer, Renata Rocha e Tamires
Camargo, publicado como trabalho de conclusão do bacharelado em jornalismo da
Universidade Metodista de São Paulo em 2014.
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sábado, 14 de maio de 2016
Feliz aniversário Mário Vaz Filho
Natural de Santos,
Mário Vaz Filho construiu uma carreira de respeito dentro da Boca paulista.
Primeiro atuou como assistente de direção de nomes representativos do cinema
paulista como Jean Garrett e Antônio Meliande. Foi um dos sócios da produtora
Embrapi e prosseguiu como realizador. Atualmente, Marinho mora no centro de São
Paulo e possuí diversos projetos na área do audiovisual. O VSP deseja e ele
todas as felicidades nesta data especial.
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Mário Vaz Filho
Superfêmeas II: Vanessa Alves
VANESSA
ALVES
A
virgem da Boca
Por Bianca Bellucci,
Heros Macedo, Heverton Bruno, Larissa Palmer, Renata Rocha e Tamires Camargo.
Zilda Cristina Alves
Pinto, ou melhor, Vanessa Alves, conheceu o mundo artístico com apenas quatro
anos de idade. Bailarina e garota-propaganda de comerciais, chegou a fazer
figuração em programas infantis da extinta TV Tupi. Mas foi somente aos 16 anos
de idade que a menina tímida chamou a atenção dos olhares atentos do cinema
nacional. Até então, Zilda, de cabelos castanhos, estava esperando o ônibus de
volta para casa, na Vila Gumercindo, em São Paulo, quando foi abordada por um
homem, em frente à TV Tupi.
- Ei, menina! Você quer
fazer cinema?
Ela aceitou o cartão de
um produtor chamado Antônio Polo Galante, e disse que pensaria na proposta.
Continuou o caminho para casa, sem dar muita bola para o convite – afinal ela
não era atriz, apenas tinha feito alguns comerciais e campanhas publicitárias,
mas nunca havia atuado. Chegou em casa e contou para a mãe, dona Maria Irena, o
que tinha acontecido, mas não se preocupou em ver do que se tratava. Mal sabia
ela que só estava adiando um futuro inevitável.
Pouco tempo depois, a sua
agência entrou em contato. Havia surgido um teste para um filme e tinham se
interessado pelo seu perfil. “A Filha de Emanuelle” (1980) era o nome da
produção, Osvaldo de Oliveira era o diretor e Antônio Polo Galante era o
produtor – sim, o mesmo homem do cartão que ela esnobou: “Eu ir para a Boca do
Lixo, na rua do Triunfo? Fazer filme e ter que tirar a roupa? Eu não!
Imagina!”, pensava Vanessa. No final, ela acabou conquistando um papel pequeno,
de coadjuvante. Mas, por um acaso do destino, Vanessa acabou se tornando a
protagonista do filme. Infelizmente, a atriz que estava escalada para o papel
principal sofreu um acidente e não pôde participar das gravações. Assim, o
diretor convidou Vanessa para viver Linda, e foi deste jeito torto que ela
entrou para o cinema.
O filme foi um sucesso de
bilheteria e levou mais de 700 mil pessoas para o cinema. Já a moça, ainda
virgem, virou musa de um bando de marmanjões. Sua mãe, orgulhosa, exibia este e
outros pôsteres de pornochanchada espalhados pela casa, sem a menor vergonha de
mostrar a sua primogênita seminua estampada nos cartazes.
- Tinha uma tarja preta
nas partes íntimas ou eu aparecia de costas, mas, mesmo assim, quem entrava em
casa se impressionava: “Olha! A Vanessa” E eu lá, meio nua no meio da sala.
Já no seu segundo filme
“Paraíso Proibido” (1981), desta vez com Carlos Reichenbach, interpretou Paula,
uma menina de cidade do interior que se apaixonava pelo locutor de rádio
interpretado por Jonas Bloch. Foi a partir deste filme que Vanessa e Carlão,
como ela carinhosamente chama o cineasta, formaram uma parceria. Ao todo, foram
cinco filmes produzidos pela dupla.
O primeiro ou segundo
filme com Carlão, inclusive marcou um momento bem engraçado na vida de Vanessa.
Menstruada, ela precisava fazer uma cena de biquíni, mas não sabia como poderia
gravá-la. A solução foi correr e pedir ajuda para o maquiador Mário Lúcio.
- Ué, mulher! Bota OB!
- Eu não posso colocar o OB
– confessou Vanessa, tímida.
- Como não pode? – depois
de alguns minutos, o maquiador percebeu o que a garota queria dizer. – Meu
Deus, você é moça! E como é que faz esses filmes? Como é que você fez essas
cenas supersensuais? Você é virgem! Me explica como?
- Ah, não sei ! Eu
simplesmente faço. Eu observou como as outras pessoas fazem e copio – admitiu a
atriz.
Outra história que ela
tem orgulho em contar é a de seu Kikito. O prêmio de Atriz Coadjuvante recebido
pelo Festival de Gramado de 1987 foi consagrado pela sua atuação no filme
“Anjos do Arrabalde” (1987). A estatueta, também chamada de “deus do bom
humor”, fica exposta em sua casa até hoje. Claro que o diretor só podia ter
sido o seu amigo Carlão. O longa também faturou prêmio de melhor filme e Beth
Faria, a melhor atriz.
Mas a dupla não parou por
aí. Como o profissionalismo de Vanessa além de sua beleza, sempre chamaram a
atenção do diretor, ela atuou em mais outros três filmes do Carlão. São eles:
“Extremos do Prazer” (1984), “Filme demência” (1986) e “Garotas do ABC” (2003),
este último longa também foi seu último trabalho no cinema. Ela só aceitou por
convite e insistência do amigo.
Se todos esses fatos ela
conta com um sorriso no rosto, o dia em que brigou feio com o ator Wagner
Maciel na peça “Beijo na boca” (1978), de Ronaldo Boschi, não é uma de suas
recordações favoritas – embora talvez seja uma das mais engraçadas. Mesmo brigando
com o colega de cena e estando aos prantos, quando o terceiro sinal tocou, a
cortina abriu e o espetáculo começou, Vanessa se transformou em outra mulher.
Ela era aquela que tinha que lidar com a homossexualidade do marido. Porém,
bastava os dois voltarem para a coxia que o bate-boca e a choradeira
continuavam. A melhor parte disso foi o final da peça, quando uma convidada do
elenco que estava nos bastidores falou:
- Vanessa, estou
totalmente passada. Você merecia um Oscar. Como é que você consegue ficar
chorando e brigando com o ator e entrar em cena e fazer tudo parecer normal?
Esse fato é somente mais
uma confirmação do que Galante e Carlão viram na linda menina virgem e tímida,
que era capaz de esperar por horas sentada em um mesmo lugar aguardando uma
ordem. Vanessa era uma profissional que levava a sério tudo que fazia. Seguia à
risca as ordens e o roteiro, e possuía uma técnica de cinema invejável, como
poucas atrizes tinham.
- Eu nunca tive grandes
problemas, nem com diretor, nem com produtor. Não sei se é por causa do meu
jeito de ser, de estar sempre na minha, sempre quieta e muito tímida. Chegava
ao set hiperdecorada e com muita atenção para não errar nada. O que as pessoas
pediam para eu fazer, eu fazia. Se era pra tirar a roupa, vamos tirar.
Talvez devem ser por
esses motivos que a musa hoje, além do seu Kikito, mantém uma carreira estável
dublando e dirigindo dublagens junto ao seu marido, Paulo Celestino Filho, e a
sua amiga da época da Boca, Patrícia Scalvi. Vanessa não tem intenção de fazer
TV ou teatro de acordo com ela, essas coisas ocupam muito seu tempo e ela tem
paixão por dublar. Mas, fica a dica, caso apareça algum convite para o cinema
novamente: “Por que não?”.
FICHA TÉCNICA
Nome completo: Zilda
Cristina Alves Pinto
Nome artístico: Vanessa
Alves
Data de nascimento: 4 de
setembro de 1962
Naturalidade: São Paulo
(SP).
Principais bilheterias da
pornochanchadas:
“A filha de Emanuelle”
(1980), Osvaldo de Oliveira
“A menina e o estuprador”
(1982), Conrado Sanchez
“O motorista do fuscão
preto” (1983), José Adalto Cardoso
“Volúpia de mulher”
(1984), John Doo
Outros trabalhos
relevantes:
“Anjos do arrabalde”
(1987), Carlos Reichenbach
“Corruptores de la
frontera” (1988), Teo Kofman
“Garotas do ABC” (2003),
Carlos Reichenbach
Onde vive hoje: São Paulo
(SP)
Onde faz hoje: Diretora
de dublagem, dubladora e atriz.
Publicado originalmente
no trabalho acadêmico Superfêmeas- as
mulheres que fizeram a história da pornochanchada de autoria de Bianca
Bellucci, Heros Macedo, Heverton Bruno, Larissa Palmer, Renata Rocha e Tamires
Camargo, publicado como trabalho de conclusão do bacharelado em jornalismo da
Universidade Metodista de São Paulo em 2014.
Marcadores:
grandes musas,
Superfêmeas,
Vanessa Alves
sábado, 7 de maio de 2016
Superfêmeas I: Noelle Pine
NOELLE
PINE
A
militante da Boca
Por Bianca Bellucci,
Heros Macedo, Heverton Bruno, Larissa Palmer, Renata Rocha e Tamires Camargo
Era apenas mais uma tarde
de um sábado nublado no centro de São Paulo quando Noelle Pine, com mais duas
colegas de trabalho, Vanessa Alves e Débora Muniz, estouraram um chamapanhe
Salton na rua do Triunfo, ás 15 horas do dia 26 de junho de 2014 e afastaram os
fantasmas das calçadas que antigamente eram passarelas de estrelas do cinema
nacional e hoje são ocupadas somente por viciados à mercê do tempo.
Para chegar a esta cena
final de novela das 21 horas, a musa, conhecida por seu profissionalismo, teve
de atravessar o Atlântico para perceber a importância da Boca do Lixo e do
cinema nacional em sua vida. Noelle morou 18 anos na Espanha e, inclusive,
chegou a escrever uma peça de teatro chamada “Com los pelos de punta” (2003). A
comédia retrata um grupo de mulheres que se encontram em um salão de beleza e
conversam a respeito de suas vidas. Em determinado momento, elas descobrem que
a grama do vizinho não é tão verde quanto parece, e suas verdadeiras histórias
são reveladas.
A chance de Noelle se
tornar uma atriz conhecida mundialmente ocorreu durante uma estranha escolha de
teste. O papel disputado era para interpretar uma personagem um tanto
inesperada para uma mulher...um travesti. Mas o surpreendente mesmo é que o
filme não era de qualquer um. Era de ninguém menos que o cineasta espanhol
vencedor de dois Oscars, Pedro Almodóvar. Bom, não foi nenhuma surpresa quando
um verdadeiro travesti foi convidado a participar. Mesmo assim, ela conta a
experiência como uma vitória apenas por ser escalada para as audições.
Noelle voltou para o
Brasil em 2008. Já formada em fotografia, e tendo a área como profissão
principal, passou a dedicar os últimos esforços para revitalizar o único polo
que lhe abriu as portas sem pestanejar: a Boca do Lixo. Ainda enquanto estava na
Espanha, ela elaborava planos para recuperar as memórias daquela região. Sua
inspiração estava na forma como a cultura cinematográfica é valorizada em
países europeus, enquanto na Terra do Carnaval e Futebol o passado – e até
mesmo o presente – do cinema nacional é deixado de lado.
Além de ter um livro
lançado sobre os bastidores (“Luz, cama, ação! – Hollyboca”, 2013) e outro
engatilhado sobre a vida pós-pornochanchada de algumas atrizes, a musa se
juntou a dois produtores, Rafael Spaca e Paulo Faria, para dar início ao
projeto que quer proporcionar um novo fôlego ao gênero e reunir velhos amigos
de uma época de outro: o Museu do Cinema e tombamento histórico da Boca do
Luxo.
No Facebook, o movimento
intitulado “Triunfo, a volta” tem atraído cada vez mais adeptos. São atores,
atrizes, produtores, cinegrafistas, diretores, maquiadores e figurantes da
Boca, além de entusiastas das produções feitas por lá. O objetivo é trazer o
espírito artístico e cultural da rua que, para os que conhecem a sua história,
ainda emana vagamente pelas esquinas daquele lugar. Porém, a produção de
audaciosas 100 pornochanchadas por mês não tem volta.
Se os filmes sumiram pela
falta de interesse do público – “para que assistir algo cômico com pitadas
eróticas se eu posso ver sexo explícito em pornôs estrangeiros ?” -, a
militante aponta ainda a falta de profissionais reais. Há 59 aos carregando o
vírus da arte em seu corpo, Noelle foi uma das poucas atrizes de pornochanchada
a serem formada na área. As outras protagonistas e coadjuvantes eram convidadas
enquanto caminhavam pela região apenas por serem...gostosas.
A ideia concreta do
memorial surgiu em uma entrevista dada em março de 2014 para a TV FATO, no
tradicional café Girondino, point dos produtores e diretores da Boca. O trio
responsável pela empreitada decidiu que o objetivo não é trazer a
pornochanchada de volta, mas sim que a Boca não se cale. Que o seu legado não
seja esquecido no tempo, mesmo que exista quem negue o seu envolvimento com a
rua do Triunfo. Mas Noelle sempre se pergunta: como é possível negar um passado
de glória? Por acaso temos como apagar nosso passado? Nossos pais, nossos
filhos? Não.
O chute inicial para o
tombamento da Boca do Lixo como patrimônio histórico-cultural foi dado e o jogo
já começou. O time tem cada vez mais convocados dispostos a defender o ataque
dos antipornochanchadas. As musas, como Noelle, saíram dos seus postos de
líderes de torcida e foram para a linha de ataque, cada uma dando o melhor
toque na bola. Spaca e Faria já deram o grito de guerra, enviando a proposta
para o Ministério da Cultura. A partida vai ser difícil, mas todos os jogadores
já estão preparados para enfrentar os maiores adversários.
- Quando podemos viver do
que gostamos de fazer, tudo tem o gosto de satisfação e realização, tornando-se
um privilégio. A Boca pra mim foi isso, fazer o que eu amava, aprender com quem
eu sabia e atar nós em laços de amizades que perduram até hoje -, é o que
Noelle diz.
FICHA TÉCNICA
Nome completo: Áurea
Ramos César
Nome artístico: Noelle
Pine
Data de nascimento: 19 de
agosto de 1955
Naturalidade: Brasília de
Minas, Minas Gerais
Principais bilheterias de
pornochanchadas:
“Chapeuzinho Vermelho, a
gula do sexo” (1980), Marcelo Motta
“O rei da Boca” (1982),
Clery Cunha
“Anúncio de Jornal”
(1984), Luiz Gonzaga dos Santos
Outros trabalhos
relevantes:
“Hotel puramente
familiar” (1982), peça de teatro de Emanoel Rodrigez
“Vida roubada” (1983),
novela SBT
“CVV, boa noite” (1986),
peça de teatro de Roberto Nogueira
“Com los pelos de punta”
(2003), peça de teatro de sua autoria
“Luz, cama, ação! –
Hollyboca” (2013), livro de sua autoria
Onde vive hoje: Mogi das
Cruzes (SP)
O que faz hoje: fotógrafa
e atriz
Publicado originalmente
no trabalho acadêmico Superfêmeas- as
mulheres que fizeram a história da pornochanchada de autoria de Bianca
Bellucci, Heros Macedo, Heverton Bruno, Larissa Palmer, Renata Rocha e Tamires
Camargo, publicado como trabalho de conclusão do bacharelado em jornalismo da
Universidade Metodista de São Paulo em 2014.
Marcadores:
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Noelle Pine,
Superfêmeas
segunda-feira, 2 de maio de 2016
Feliz aniversário José Adalto Cardoso
Assistente de direção, cineasta,
roteirista. José Adalto Cardoso foi um profissional de destaque na rua do
Triunfo. Colaborador da revista Cinema em
Close Up, tornou-se um empenhado assistente de nomes importantes da
produção paulista como Fauzi Mansur. Tempos depois, tornou-se realizador de
diversos longas-metragens. Atualmente, Adalto reside em Batatais, interior de
São Paulo. O VSP deseja a ele todas as felicidades nesta data especial
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Cinema em Close Up,
Fauzi Mansur,
Feliz aniversário,
José Adalto Cardoso
domingo, 1 de maio de 2016
Superfêmeas em maio
Durante o mês de maio,
o VSP presta uma homenagem para as musas do cinema paulista. São perfis inéditos publicados em um
trabalho acadêmico que o blog teve acesso com exclusividade. Cada sábado de
maio uma atriz com passagem marcante pela rua do Triunfo será homenageada. Vale
a pena a leitura.
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